Fábio Brandt
Do UOL NotÃcias
Em BrasÃlia
A maioria do Supremo Tribunal Federal (STF) seguiu o voto do relator Celso de Mello e deu pareceu favorável à liberação da Marcha da Maconha em julgamento realizado nesta quarta-feira (15) na Corte. Para Mello, a manifestação pública pela legalização das drogas não pode ser confundida com crime previsto no Código Penal. “Marcha da Maconha é expressão concreta do exercÃcio legÃtimo da liberdade de reuniãoâ€, afirmou o ministro.
Está em debate uma ação em que a Procuradoria-Geral da República (PGR) pede a liberação das manifestações a favor da legalização das drogas. Na prática, o julgamento dirá se a Marcha da Maconha é apologia ao crime (como argumentam juÃzes que as proÃbem) ou exercÃcio da liberdade de expressão (como defende a PGR).
Em seu voto, Fux observou que a organização deve avisar as autoridades públicas da data e hora de realização da marcha com antecedência. Além disso, Fux disse que, para estar dentro da lei, o ato deve ser pacÃfico e sem armas, não pode incentivar o uso de entorpecentes e, de modo algum, deve ter participantes consumindo drogas durante sua realização.
Ao defender seu voto, Cármem Lúcia disse que “a democracia é generosa exatamente porque há liberdade de pensamentos”. O ministro Ricardo Lewandowiski, que também seguiu o relator, afirmou: “Entendo que não é lÃcito coibir qualquer manifestação a respeito de uma droga lÃcita ou ilÃcita”.
Para se definir a favor da Marcha da Maconha, o ministro Celso de Mello considerou que a Constituição “assegura a todos o direito de livremente externar suas posições, ainda que em franca oposição à vontade de grupos majoritáriosâ€. Mello também classificou como “insuprimÃvel†o direito dos cidadãos de protestarem, de se reunirem e de emitirem opinião em público, desde que pacificamente.
Ele culpou decisões desencontradas adotadas pela Justiça em diferentes cidades do paÃs pela violência usada pela polÃcia contra manifestantes. “O Estado deve proteger os participantes [de reuniões garantidas pela Constituição] de tentativas de agressão por parte oficial ou não.â€
Segundo o relator, é livre a todos a associação e a manifestação de pensamento sem uso de armas, seja qual for o assunto. Ele citou o caso do grupo musical Planet Hemp, que chegou a ser preso por causa de letras de músicas que citavam a maconha. “[A atuação policial neste caso] é uma intromissão brutal na produção intelectual e artÃsticaâ€, declarou o ministro.
A discussão sobre a Marcha da Maconha, o mais conhecido movimento pela legalização de drogas, chegou ao STF em junho de 2009, quando a vice-procuradora-geral da República Deborah Duprat ajuizou a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 187. Na ação, a procuradora indica que a proibição judicial das marchas a favor da maconha e de outros entorpecentes têm sido baseada em interpretação errada do Código Penal. Segundo ela é “equivocado†dizer que a realização das manifestações constitui “apologia ao crimeâ€.
A Marcha da Maconha já foi proibida pela Justiça em diversas capitais com este argumento. Somente no mês passado, a marcha foi vetada em BrasÃlia (DF), São Paulo (SP), Belo Horizonte (MG) e Curitiba (PR), além da cidade de Campinas (SP).
Em algumas localidades, após a proibição, a marcha foi transformada em ato pela liberdade de expressão. Em São Paulo, o ato terminou em confronto de manifestantes com a polÃcia.
Duprat defendeu sua tese, presencialmente, no inÃcio do julgamento do STF desta quarta-feira (15). Ela citou o ex-presidente Fernando Henrique (PSDB) para defender a liberação da Marcha da Maconha pelo STF.
“O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso esteve em um programa de ampla divulgação defendendo a liberação das drogas leves. Além disso, fez e atuou num filme com esse objeto. Esse ex-presidente está fazendo apologia ao crime?â€, questionou a procuradora.
Tribunais têm vetado os atos a favor das drogas com base no artigo 287 do Código Penal, que estabelece pena de três a seis meses de prisão, ou multa, a quem fizer, publicamente, “apologia de fato criminoso ou de autor de crimeâ€.
Dos 11 ministros do STF, dois faltaram à sessão: Joaquim Barbosa e Gilmar Mendes. A assessoria do STF afirma não saber o motivo da falta de Joaquim Barbosa. Já Gilmar Mendes faltou porque está em missão oficial.
O ministro Dias Toffolli não acompanha o julgamento no plenário e deve se declarar impedido de votar –quando a ação foi ajuizada, em 2009, ele era Advogado-Geral da União, cargo que representa a Presidência da República, e se manifestou pela improcedência do pedido da PGR na ação.
A Associação Brasileira de Estudos Sociais do Uso de Psicoativos (Abesup) tentou incluir no julgamento a permissão do plantio doméstico da maconha e uso com fins médicos e religiosos. O relator do caso, ministro Celso de Mello, descartou a inclusão do tema na discussão. Mas deixou claro que a discussão pode ser feita pelo tribunal em outras situações.
Para o advogado da Abesusp, Mauro Machado, o posicionamento do ministro Celso de Mello é positivo para quem defende o uso medicinal dos entorpecentes. Segundo ele, o ministro “sinalizou a tendência de que, se o tribunal for suscitado sobre este tema, pode se manifestar favoravelmenteâ€.
O ministro Ricardo Lewandowiski, em seu voto, retomou o tema, dizendo que o debate sobre o uso medicinal das drogas é necessário. “O que é droga? Aquilo que é considerado droga hoje, poderá não mais vir a sê-lo no futuroâ€, disse. Ele citou como exemplo as drogas moderadoras de apetite, que “hoje [são] objeto de intensÃssimo debate nos meios médicosâ€.