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Julho 28, 2011

Cultura pra DAR – Filme “Vejo você no próximo verão” mostra a importância dos contextos nos quais drogas são usadas

COLETIVO DAR

Vejo você no próximo verão é mais uma dessas traduções ótimas que os tiozões das distribuidoras nos trazem para Jack goes boating, algo como Jack sai de barco, primeiro filme dirigido pelo ator Phillip Seymour Hoffman, que era o Capote em Capote e um dos Lebowski em o Grande Lebowski, esse um filme muito grande.

O DAR de vez em quando fala de cinema, e temos inclusive uma seção semanal chamada DDD na qual indicamos coisas, poderíamos indicar esse filme, mas talvez seja o caso de aproveitá-lo para ir além da recomendação que está implícita neste post. Ou melhor, antes, de forma explícita: vejam esse filme.

Hoffman (hmmmm) é Jack, um motorista de limusines solitário e tal, que tem como característica marcante curtir um reggaezinho sempre que pode. O filme é a história dele construindo uma história de amor com uma garota que um casal amigo lhe apresenta. Enquanto esse relacionamento nasce, o outro definha por conta de ciúmes e outras dificuldades típicas da monogamia.

Se fosse só isso já faria pensar, e o humor sutil presente no resto da película também já compensaria. Sem falar na trilha sonora bacana. MAS, talvez possamos achar algumas camadas mais para reflexão neste produto hollywoodiano.

Em primeiro lugar, não só Jack mas outros personagens são trabalhadores em serviços de luxo. Trafegam em meio à produção de necessidades desnecessárias do capitalismo atual sem pertencerem a este mundo, mas também sem demonstrarem raiva, rancor. Estão acomodados, e o filme até os apresenta em casas bonitas, onde não parece faltar o necessário. Então se por um lado o filme não tem intenção nenhuma de problematizar o trabalho imaterial ou o trabalho improdutivo no capitalismo tardio, por outro ele acaba fazendo pensar sobre o lugar de certos tipos de trabalhadores nesta cordial exploração produzida nestes meios. Provavelmente é mais confortável ser motorista de limusine do que de busão, mas certamente alguém está ganhando em cima do trabalho alheio nestes dois casos.

Além disso, outra faceta interessante, neste caso explicitada pelo filme, são as agressões feitas às mulheres. O assédio é constante, seja por parte dos patrões seja na rua, e nem sempre é algo contornável. Violência, dor, medo, invariavelmente são aspectos constantes na vida de uma mulher em uma grande cidade simplesmente pelo fato de ser mulher, de viver em uma sociedade na qual a necessidade de submissão feminina vem sempre acompanhada do estímulo à opressão.

E drogas? Sim, vamos falar disso. E não precisa forçar a barra, porque o filme mostra bastante do nosso objeto de atenção principal. A maconha está lá o tempo todo, lubrifica amizades, potencializa o reggae. O haxixe pinta, e aflige, a cocaína detona, estraga tudo. A uma primeira vista poderíamos estar diante de uma visão preconceituosa, de um filme com um certo toque de uma posição supostamente antiproibiocinista que infelizmente é comum nos tempos atuais: liberal em relação a maconha, preconceituosa e retrógrada quando se trata de outras substâncias.

Mas talvez não seja o caso. Talvez possamos olhar com mais calma e pensarmos num aspecto absolutamente fundamental da questão. A redução de danos como mentalidade nos ensina que não há uso danoso de drogas a priori, mas também não retira este pressuposto do horizonte. “Maconha não faz bem, maconha não faz mal, depende do maconheiro, da qualidade da erva e do clima do local”, sintetizou o poeta anônimo que fez o Rap da descriminalização. Assim, mais do que buscarmos os efeitos e implicações de cada droga presente neste filme, nos seria mais proveitoso entender o ambiente – como tanto ressaltava Timohty Leary – o setting, como frisam diversos autores, onde é feito este consumo, para daí desenrolarem-se as conclusões. O que está em volta da viagem é parte fundamental dela.

A cocaína surge num momento importante do filme, e causa uma puta duma confusão. Mas fica claro também que as pessoas envolvidas já estavam em estado de grande tensão há tempos, por motivos muito mais complexos, sendo aquele momento de mistura de drogas o estopim de anos de divergências e problemas mal resolvidos. Além disso, os atores procedem como usuários experimentados, ou seja, já cheiraram a branquinha muitas vezes, e não eram nem dependentes nem traumatizados nem abstêmios insuportáveis. Tiveram suas experiências em seu tempo, e num determinado momento recorrer a esta substância foi explosivo pelo contexto onde este uso estava inserido.

Do mesmo jeito que se você é médico um baseadinho antes da cirurgia não é o mais indicado, nem para prestar vestibular vale a pena tomar um docinho. Não é por isso que tais substâncias sejam diabólicas, caros fundamentalistas, assim como a Bíblia de vocês pode muito bem ser um grande romance com algumas mensagens de amor, e não só um manual prático de ódio e intolerância.

Baudelaire sintetizou bem, em seu Poema do Haxixe: “Suponho que você teve a preocupação de escolher bem o seu momento para esta expedição aventurosa. Toda orgia perfeita necessita de um perfeito repouso. Você sabe, além disso, que o haxixe cria o exagero não apenas do indivíduo, mas também da circunstância e do meio; você não tem deveres a cumprir que exijam a pontualidade e a exatidão; nenhuma tristeza de família; nenhuma dor de amor. É preciso ter cuidado. Esta infelicidade, esta inquietude, esta lembrança de um dever que reclama a sua vontade, sua atenção a um momento determinado soarão como um dobre de fundos em meio à sua embriaguez e envenenarão seu prazer. A inquietação será transformada em angústia; a tristeza, em tortura”.

Não é difícil expandir isto para o uso de qualquer substância. Depende da qualidade, do clima local, do usuário, de seu momento e história. Não é difícil também relacionar este aspecto com o debate tosco realizado em torno da triste morte da cantora Amy Whinehouse: neste caso, a suposta dependência (de álcool inclusive) é causa ou sintoma? Foram AS DROGAS que mataram a cantora? Ou o uso destrutivo que provavelmente ela fazia não seria sintoma de questões mais complexas?

Complexidade jamais respondida por aqueles que nos lembram de que este é mais um caso de “um talento levado pelas drogas”. Sem falar na obtusidade daqueles que gostam de culpar substâncias por conta de problemas mas esquecem delas nas horas positivas – ou Amy, Kurt, Jimi, Janis e tantos outros que morreram de uso abusivo também não produziram obras eternas sob efeito daquilo que “os levou à ruína”? – seria bom perguntar aos arautos do moralismo se eles não se perguntam por que uma pessoa que “deu certo” no mundo capitalista, que tem seu talento reconhecido e um monte de dinheiro, ainda assim não acha lugar para si neste mundo. Foram simplesmente estas terríveis substâncias demoníacas que produziram todos os problemas? Basta que criemos guerras contra elas para que eles sejam resolvidos?

Em As Portas da percepção, Huxley aponta que “a maioria dos homens e mulheres leva uma vida tão sofredora em seus pontos baixos e tão monótona em suas eminências, tão pobre e limitada, que os desejos de fuga, os anseios para superar-se, ainda por uns breves momentos, estão e têm estado sempre entre os principais apetites da alma. A arte e a religião, os carnavais e as saturnais, a dança e a apreciação da oratória, tudo isso tem servido, na frase de H.G. Wells, de Portas na Muralha”. Parece mais profícuo entender a muralha e os porquês de determinadas opções por determinadas portas do que tentar simplesmente cimenta-las.

Assim, além de ser divertido e contar com boas atuações e uma bonita direção, Jack goes boating nos levanta questões interessantes sobre os diferentes usos das diferentes substâncias convencional e toscamente rotuladas como drogas, e sobre a necessidade de entendermos estes contextos e motivações para, aí sim, querermos falar das substâncias e das melhores formas de lidarmos socialmente com elas. Quem sabe não caminhamos para isto no próximo verão…

 

 

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