Senad tem R$ 130 milhões para financiar essas entidades, grande maioria ligadas a igrejas
Vinicius Sassine
BRASÃLIA – O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, defendeu em entrevista ao GLOBO o repasse de recursos públicos a comunidades terapêuticas, entidades de cunho religioso que abrigam dependentes de drogas. Segundo o ministro, as comunidades são responsáveis por 80% do atendimento a dependentes e não podem ser ignoradas na rede de atendimento. A Secretaria Nacional de PolÃticas sobre Drogas (Senad), vinculada ao ministério, tem R$ 130 milhões para financiar essas entidades, a grande maioria ligada à Igreja Católica e a igrejas evangélicas.
Cardozo diz ter ligado ontem para a ex-secretária nacional de PolÃticas sobre Drogas Paulina Duarte, que passou a ocupar um cargo na Organização dos Estados Americanos (OEA), em Washington. Conforme o ministro, a saÃda dela do cargo – a exoneração é retroativa ao dia 1º – não tem nada a ver com a pressão feita pelo Palácio do Planalto para que a Senad libere o dinheiro à s comunidades terapêuticas. Paulina era defensora do trabalho do trabalho das entidades e não se opôs ao financiamento, segundo ele. O ministro confirmou que os primeiros convênios serão assinados na próxima semana.
– Não podemos fechar os olhos para as comunidades terapêuticas. Eu sei que há polêmicas, controvérsias com certos segmentos da sociedade, mas queremos criar condições para que essas entidades façam um trabalho melhor. Queremos que os serviços sejam prestados, o mais rápido possÃvel. Quanto mais leitos, melhor – disse Cardozo.
O ministro reforçou que a pasta é contrária ao projeto de lei nº 7.663/2010, que prevê um cadastro nacional de usuários de drogas, internações compulsórias e um financiamento próprio a comunidades terapêuticas, paralelo ao Sistema Único de Saúde (SUS). A proposta está prestes a ser votada pelo plenário da Câmara. Depois, segue para o Senado.
– Discuti eventuais mudanças com o autor do projeto, há dez dias. Caso o projeto seja aprovado, quem define o que é sancionado é a presidente Dilma. Isso ainda não foi discutido com ela – disse Cardozo.
O ministro escolheu o novo secretário nacional de PolÃticas sobre Drogas e o nomeará ao cargo no inÃcio da próxima semana, como O GLOBO publicou na edição de hoje. O cargo será ocupado pelo defensor público em São Paulo Vitore André Maximiano. O anúncio da escolha foi feito no mesmo dia que reportagem do GLOBO revelou a pressão do Palácio do Planalto para que a Senad libere R$ 130 milhões a comunidades terapêuticas.
Em meio à pressão, Paulina Duarte e dois diretores subordinados a ela decidiram deixar a secretaria, que vem sendo comandada por um interino. Para evitar a continuidade do esvaziamento da Senad, Cardozo escolheu o novo titular, que tem “concordância total†com o financiamento às comunidades terapêuticas e que se comprometeu em atender a recomendação de agilizar os repasses de dinheiro público, segundo o ministro.
BRASÃLIA — O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, escolheu o novo secretário nacional de polÃticas sobre drogas e o nomeará ao cargo no inÃcio da próxima semana. Em entrevista ao GLOBO, o ministro revelou que o defensor público em São Paulo Vitore André Maximiano será o novo titular da secretaria, vinculada ao Ministério da Justiça. O anúncio da escolha foi feito no mesmo dia que reportagem do GLOBO revelou a pressão do Palácio do Planalto para que a Secretaria Nacional de PolÃticas sobre Drogas (Senad) libere R$ 130 milhões a comunidades terapêuticas, entidades vinculadas à Igreja Católica e a igrejas evangélicas que acolhem dependentes quÃmicos.
Votação de projeto é novamente adiada
Cardozo reiterou que o Ministério da Justiça é contrário à aprovação do projeto de lei 7.663, de autoria do deputado Osmar Terra (PMDB-RS), prestes a ser votado no plenário da Câmara. Segundo o ministro, a posição da pasta é a que está contida em nota técnica assinada por Paulina quando era secretária de PolÃticas sobre Drogas. Na nota, a então secretária critica a internação compulsória “indiscriminada†de dependentes.
O ministro da Justiça diz ter discutido alterações no texto com o autor do projeto de lei e faz referência à possibilidade de veto pela presidente Dilma Rousseff. A votação do projeto de lei estava prevista para ontem, mas a pressão de lÃderes partidários levou o presidente da Câmara, deputado Henrique Eduardo Alves (PMDB-RN), a não incluir a proposta na pauta. Henrique Alves diz ter conversado com a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, que o informou sobre uma reunião amanhã com e o relator do projeto, deputado Givaldo Carimbão (PSB-AL).
Manifesto pela descriminalização do consumo
Na segunda-feira, a assessoria da ministra afirmou que cabe à Secretaria de Relações Institucionais a discussão sobre o projeto de lei. Ontem, a assessoria disse que a ministra é convidada muitas vezes para essas discussões e que o assunto é de interesse da Casa Civil, que coordena o programa “Crack, é possÃvel vencerâ€. Até o inÃcio da noite, segundo a assessoria, a reunião com Terra e Carimbão não constava da agenda da ministra.
Ontem, o ex-ministro da Justiça José Gregori entregou ao ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), manifesto pela descriminalização do consumo de drogas. O texto é assinado por seis ex-ministros da Justiça dos governo Lula e Fernando Henrique, entre eles o próprio Gregori. O documento deverá ser incluÃdo no processo em que o STF deverá decidir sobre essa questão. Gilmar não fez comentários sobre o conteúdo do texto, mas disse que examinará as ponderações com a devida atenção.
“Considerando que o Brasil é um Estado constitucional fundado na dignidade humana e na pluralidade polÃtica, e que cada cidadão tem liberdade para construir seu próprio modo de vida desde que respeite o mesmo espaço dos demais, não é legÃtima a criminalização de comportamentos praticados dentro da esfera de intimidade do indivÃduo, que não prejudique terceirosâ€, diz o texto assinado pelos ex-ministros Márcio Thomaz Bastos, José Carlos Dias, Miguel Reale Júnior, Aloysio Nunes Ferreira, Tarso Genro e Gregori.
Os ex-ministros argumentam que experiências em Portugal, Espanha, Colômbia, Argentina, Itália e Alemanha “demonstram que a descriminalização do uso de entorpecentes foi um importante passo para racionalizar uma polÃtica de combate ao narcotráficoâ€. (Colaborou: Isabel Braga)