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Dezembro 08, 2015

A indústria do vício digital

Luis Radfahrer

Chega a ser óbvio dizer que a internet distrai, ou mesmo definir a vida digital em termos de dependência ou vício. Desde o tempo em que se apelidavam os velhos Blackberries de “crackberries” que se diz que a rede vicia. Hoje é cada vez mais comum se referir a ferramentas, serviços e aplicativos de mídias sociais, como YouTube, WhatsApp, Facebook, Twitter ou até mesmo Netflix em termos que até há pouco eram reservados para os usuários de metanfetaminas e cassinos.

As redes sociais exploram com maestria a característica gregária do ser humano. Seus produtos trazem informações imediatas e validam os comentários e posições de cada um com relação a seu grupo de interesse ou apoio. É natural que desenvolvam, em muitos de seus membros, uma espécie de tique compulsivo.

Gente que passa mais tempo em aplicativos de troca de mensagens de textos do que em reuniões presenciais; que passa mais tempo a interagir com telas do que com gente real; que verifica as atualizações sociais no primeiro instante livre (mesmo que seja no banheiro); e que se entristece quando sua vida editada para as redes sociais não aparenta ser tão fascinante quanto a vida editada de outros que mal se conhecem é tão comum que mal chama a atenção.

Psicólogos, antropólogos e estudiosos do comportamento vem discutindo a possibilidade de um “vício em internet” desde o princípio da web, lá por 1996, mas até agora não se chegou a consenso. Não há nem mesmo formas definitivas de se identificar se ele chega a ser real. Ao contrário de jogo compulsivo, drogas ilícitas, tabaco e, até certo ponto, álcool, ele é socialmente aceito e, em muitos grupos sociais, até encorajado. Seu uso se integrou de tal forma ao comportamento social que chega a ser uma espécie de hábito inconsciente. A internet, a não ser nos raros casos em que seu usuário pilota um automóvel enquanto acompanha o Facebook, não mata. E até ter utilidade, nem que seja para reforçar os vínculos sociais no estressante mundo urbano contemporâneo.

Além disso é difícil dissociar o meio digital de certos comportamentos que geram dependência. A internet pode ser um veículo cômodo para a disseminação e consumo de pornografia ou para determinadas práticas daninhas, mas ela não as criou e, salvo em raros casos, não atinge grandes parcelas da população.

Alguns críticos mais zangados gostam de culpar a rede mãe por determinados comportamentos, acreditando seriamente que uma vida analógica seja melhor; outros põem a culpa nos usuários, que, desprovidos de força de vontade, são preguiçosos e incapazes de sair dela. Nenhuma das críticas faz muito sentido. A internet é só um ambiente de interação, e não pode ser responsabilizada pelas experiências –boas ou más– que seus usuários tem por ali. Nada em sua estrutura demanda ou estimula comportamentos de dependência.

Tampouco se pode culpar a vítima quando a maioria dos serviços digitais baseia seu modelo de faturamento no tempo em que seus usuários passam a visitar suas páginas. Alguns dos melhores designers, engenheiros, estatísticos e programadores do mundo desenvolvem, testam e estruturam serviços digitais com o claro objetivo de capturar a atenção e manter seu usuário entretido pelo maior tempo possível, nem que para isso precisem desvirtuar as últimas descobertas da neurociência para criar drogas digitais de grande sofisticação e poder de retenção.

Pixel por pixel, empresas de tecnologia planejam uma experiência “perfeita” para seus usuários, apelando para os centros de prazer inconsciente de seus cérebros e associando-os à manutenção de sua reputação social.

A estrutura, criada à imagem e semelhança dos experimentos behavioristas, baseia-se em quatro etapas: o usuário encontra um gatilho (algo que estimula sua atenção) e uma oportunidade para ação. O resultado, variável e imprevisível, funciona como uma espécie de recompensa, que o estimula a fazer um investimento, como curtir ou comentar o que viu. Esse investimento acaba por reforçar o comportamento de gatilho-ação-recompensa, da mesma forma que uma máquina de moedinhas em um cassino.

Ao pobre usuário, termo que até a década de 1990 era reservado exclusivamente para o consumidor de drogas, o que sobra é um número limitado de opções, a maioria de natureza tóxica. Pode-se usar o aplicativo, serviço, rede ou jogo que preferir. Só não é permitido abrir mão de qualquer escolha, sob pena de exclusão social.

O canto da sereia das mídias sociais pode ser bastante difícil de resistir, ainda mais em um cotidiano competitivo, estressante ou monótono. Para empresas que se alimentam da Economia da Atenção, quanto mais variáveis forem os resultados, maior o tempo que se passará em suas páginas, e, consequentemente, maior o inventário de conteúdo para anunciar. Por mais que pareça distraído, o membro ativo de uma rede social desenvolve uma espécie de foco seletivo, hiperconcentrado, que prioriza as ações e recompensas digitas às que seriam obtidas na lenta interação com pessoas reais nos monótonos e previsíveis ambientes “normais”.

A maioria das corporações bem-sucedidas no mundo digital lança mão dessa realidade artificial para capturar a atenção de seus usuários e convertê-la em cliques. Descendentes viciosos da indústria perniciosa da Publicidade, elas baseiam o seu sucesso na criação de hábitos entre seus consumidores zumbis, competindo pelo máximo possível de atenção. E, no processo, contratando uma elite profissional que poderia desenvolver produtos para mudar o mundo mas que dedica boa parte de seu tempo a quebrar a força de vontade das pessoas comuns.

Não é uma luta justa. E o resultado que se vê é o número cada vez maior de pessoas distraídas e atordoadas, aguardando o primeiro momento de distração ou tédio para recorrer ao paraíso artificial de seus tablets e smartphones.

Não se pode esperar dessas empresas que tomem jeito ou respeitem a vida particular de seus usuários, ainda mais quando boa parte de seu faturamento depende desse comportamento autômato. Certos truques, como o desenvolvimento de páginas de comprimento infinito ou vídeos que tocam automaticamente podem ser limitados ou inibidos por outras tecnologias, como um dia o foram os pop-ups e diversos tipos de banners. Mas isso não impedirá as mentes brilhantes a serviço do lado negro da Força que desenvolvam novas armadilhas.

Não se pode mais esperar que o usuário, o elo fraco nessa cadeia de modulação de atenção, seja responsável pelo combate a um sistema viciado no sequestro de sua atenção. É preciso ajudá-lo a desenvolver práticas e modelos de conteúdos que tornem seu uso da rede uma experiência que amplie suas escolhas e seu conhecimento, ajudando-o a ter uma vida conectada mais feliz, saudável e gratificante.

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