• Home
  • Quem somos
  • A razão entorpecida
  • Chame o DAR pra sua quebrada ou escola
  • Fale com a gente
  • Podcast
  • Quem somos
  • A razão entorpecida
  • Podcast
  • Chame o DAR pra sua quebrada ou escola
  • Fale com a gente
Julho 14, 2017

Marcha da Maconha: o ato de desobediência civil mais periférico do país

por Juliana Paula, integrante da Craco Resiste e do Coletivo DAR

Esse texto está um pouco atrasado.

Peço perdão pelo vacilo, mas é que muitas vezes é tão difícil escrever sobre o que realmente acreditamos e amamos que é preciso esperar.

Ano passado, nessa mesma época, escrevi um texto sobre a Marcha da Maconha de São Paulo pra dizer que eu tinha certeza que essa marcha poderia ser mais preta e mais periférica do que tava sendo. E que ela tinha muito potencial pra isso.

Disseram que tinha gente preta pra caramba, rolou uma pesquisa que deu uns 35% desse público na marcha de 2016, que teve pelo menos 30 mil pessoas marchando (prefiro os 42 mil, por motivos óbvios).

Achei um número expressivo sim, principalmente se tratando de um ato político que foi historicamente organizado pela esquerda de maioria branca e de classe média, esses roles que a perifa não cola fácil, não fica à vontade, não tem muito espaço de fala. É, o bagulho é loco. Um número bacana, mas ainda pouco.

Critiquei a ausência de uma maior representatividade preta e periférica na marcha, porque afinal as pautas de legalização da maconha e do fim da guerra às drogas é um assunto que nos atinge diretamente (geralmente com munição letal e com intenção de matar) e com frequência (uma frequência chata e assustadora também).

Mas, como diria Belo, “tudo mudou”…

Crédito: Tiago Macambira

Crédito: Tiago Macambira

2017 foi o primeiro ano em que me comprometi, pelo DAR, a acompanhar as reuniões e tudo o mais que diz respeito à organização da Marcha da Maconha de São Paulo e, me aproximando dessa parte do rolê, percebi que o interesse em chegar pra além do centro, colar nas quebradas e pautar a guerra às drogas onde ela realmente vem fazendo muitas vítimas era uma preocupação constante e importante.

Priorizamos, colocando como pauta desde a primeira reunião, as atividades na periferia e foi aí que a coisa ficou preta! “Se eu te falar que a coisa tá preta, a coisa tá boa, pode acreditar!” (Sapiência neles!)

Acompanhei a organização das atividades na zona sudoeste, com pessoas que fumam um há cem mil anos e muitas nunca tinham colado na marcha. Esse rolê foi louco!

Uma das características da Marcha de SP é a autonomia e a organicidade, claro. Dessa forma, cada marcha que foi organizada na quebrada foi feita com a identidade e respeitando as especificidades da região que tava organizando. Na sudoeste, isso foi feito expressivamente pelo pessoal do Café Mesóclise, um cafezinho de vila, gerenciado por uma família tradicional maconheira, que é um ato de desobediência civil perene, que vem cotidianamente dizer pro mundo que autorização pra coffee shop é o cacete e que na quebrada é ação direta e nóis por nóis que faz as coisa acontecerem.

18402304_1493855377301970_9220151118565202621_o

Sim, um oásis na periferia, de cultura, de política, de resistência e de amor pela planta mais consumida e mais perseguida desse mundão. Aliás, nisso a perifa e a Mary Jane tem muito em comum: ambas são exploradas e perseguidas de sol a sol por esse vasto mundo. E ambas são muito mais potentes do que sonha nossa vã filosofia.

E foi assim, com o Mesóclise e com a perifa que construímos a marcha desse ano: muitas mãos, muita vontade de fazer acontecer, muito envolvimento, suor e fumaça pro ar. Foi bonito demais!

A Marcha de São Paulo foi precedida das marchas periféricas e foi nessa participação da quebrada na construção do rolê que vimos a potência do que somos e do que podemos fazer. A perifa é que sabe desse corre, mais que ninguém. Aqui a guerra às drogas atinge geral e de todas as maneiras possíveis, o resultado é sempre o mesmo: mais um da Silva morto, mais um de Souza preso, mais uma dos Santos chorando.

Nas palavras de Laricat, que não colou na marcha desse ano porque trabalhou no sábado até as 19h =/:

“A minha primeira vez com a marcha foi no ano passado. Fui porque sou uma pessoa que não gosta de debater nada sem o conhecimento, e eu sempre estudei sobre a maconha e tal… Fui para ver como era e acabei gostando, porque ali só tem gente que não tá ali só pra fumar maconha, e sim pra lutar contra a violência nas comunidades, porque por mais que a pessoa não esteja fazendo nada, se é pego pelo PM sentado fumando um beck a pessoa é agredida, humilhada, ou até mesmo é forjada e vai preso por algo que não fez, então vi que não é só pelo fato de fumar e sim pelo fim dessa guerra… Eu adorei muito ano passado e esse ano eu não fui mas adorei também, porque eu ajudei com a organização e divulgação… Só de ver que foram 60 mil maconheiros a mais que no ano passado, eu me senti bem de ver que conseguimos aumentar isso a cada dia, mostrar que não são só os negros e pobres de periferia que consomem, e sim um grande público, de todos os tipos de pessoas, todas classes, e tal.”

Crédito: Foto Ativismo

Crédito: Foto Ativismo

É isso. A Marcha da Maconha conseguiu o que muita militância nunca chegou perto de conseguir e nem chegará: colar na perifa e deixar a perifa encostar, nas palavras do mestre Criolo, “colar sem arrastar”. Estender o debate e falar a língua de quem precisa participar dele, deixar de lado as falas complicadas e o pedantismo, deixar o protagonismo pra quem tem esse direito.

Resolvi perguntar pra algumas pessoas do Mesóclise como foi chegar junto da Marcha, ajudar a construir essa história. As respostas tão aí:

“Foi a minha primeira marcha e foi muuuuuuito boa (…) Não achava que era de playboy não.” (Simone)

“Quando eu fui pra marcha pela primeira vez, fui porque eu vi aquelas pessoas lutando por algo que eu também desejava, então eu tinha que ir. Agora, fazer parte da organização da marcha foi outra coisa que me deixou assim, maravilhada, porque foi bom demais, eu quero continuar e encontrei pessoas maravilhosas. Participar da organização pra mim foi um divisor de águas.” (Hulda)

“Eu deixei de participar das primeiras marchas, logo que fiquei sabendo que rolava, mais por falta de informação mesmo, quando ficava sabendo já tinha acontecido. E participar da organização, isso aconteceu logo depois da minha primeira marcha. Eu fiquei encantado com tudo aquilo que vi e resolvi que tinha que participar também, que tinha que estar junto. E, pra mim, não foi muita surpresa o tipo de gente que eu encontrei lá, porque esperava encontrar gente parecida comigo (…) Acho que me envolver com a organização da Marcha da Maconha foi uma das coisas mais importantes que já fiz na minha vida. Eu posso dizer que aquele clima de revolução da primeira marcha me seduziu.” (Carlão)

“Eu sempre tive o meu espaço, frequento desde o início, sou morador de periferia (…) e sempre vou frequentar (…) vamos lutar pelos nossos direitos.” (Dimitri)

“Acho que eu e a galera da quebrada a gente às vezes não tem nem vontade né mano (…) será que eu vou, vai ser legal, se vou ser bem recebido ou não, acho que a galera daqui às vezes não tem nem vontade, tá ligado, de colar, de se misturar (…) muitas vezes eu não tinha nem vontade de colar lá, ficar fumando ali no meio da Paulista, com um monte de playboy (…) acho que esse bagulho deve ser mó zoado, é isso que eu tinha na minha cabeça (…) agora já é um bagulho mais cômodo, mais família, mais rolê assim ó, você sabe que vai poder colar com seu brother, que vai ficar suave, tá ligado, todos os brothers são bem recebidos lá de boa.” (Michel)

Crédito: Tiago Macambira

Crédito: Tiago Macambira

Pra mim, Juliana, a marcha desse ano foi emblemática. Eu cheguei de metrô em cima da hora e o metrô tava repleto de gente que me representa, que vem de onde eu vim. E era muita gente chegado junta, fazendo festa, tirando selfie e ouvindo funk no alto-falante do celular. Legalizamos a maconha no metrô, na Paulista, na Brigadeiro e na quebrada. Soltamos fumaça na cara dos coxas e fizemos o maior e mais periférico ato de desobediência civil do Brasil. Ali naquele dia, naquelas horas, a gente foi livre, a gente teve direito ao nosso corpo, à nossa vida e às nossas escolhas. Porque na quebrada tentam tirar de nós o direito de ter ideais, de lutar pelo que acreditamos e termos sonhos, projetos de vida.

Eu me sinto grata hoje, enquanto escrevo esse texto, por fazer parte de uma militância que não exclui e que não quer falar por ninguém, uma militância que é antiproibicionista, fechada com a quebrada, preta e feminista. Porque a revolução será preta e feminista, ou não será.

Seguimos lutando por nós e pelas parceiras e parceiros. Enquanto a periferia estiver sangrando, continuaremos em luta!

Um agradecimento enorme ao Café Mesóclise, que construiu essa marcha e esse texto do meu lado. “É nóis por nóis, porque se não for assim, não tem como” (Emicida)

A foto que abre este texto é de autoria de Foto Ativismo.

Comments

comments

Nos ajude a melhorar o sítio! Caso repare um erro, notifique para nós!

Recent Posts

  • NOV 26 NÓS SOMOS OS 43 – Ação de solidariedade a Ayotzinapa
  • Quem foi a primeira mulher a usar LSD
  • Cloroquina, crack e tratamentos de morte
  • Polícia abre inquérito em perseguição política contra A Craco Resiste
  • Um jeito de plantar maconha (dentro de casa)

Recent Comments

  1. DAR – Desentorpecendo A Razão em Guerras às drogas: a consolidação de um Estado racista
  2. No Grajaú, polícia ainda não entendeu que falar de maconha não é crime em No Grajaú, polícia ainda não entendeu que falar de maconha não é crime
  3. DAR – Desentorpecendo A Razão – Um canceriano sem lar. em “Espetáculo de liberdade”: Marcha da Maconha SP deixou saudade!
  4. 10 motivos para legalizar a maconha – Verão da Lata em Visitei um clube canábico no Uruguai e devia ter ficado por lá
  5. Argyreia Nervosa e Redução de Danos – RD com Logan em Anvisa anuncia proibição da Sálvia Divinorum e do LSA

Archives

  • Março 2022
  • Dezembro 2021
  • Setembro 2021
  • Agosto 2021
  • Julho 2021
  • Maio 2021
  • Abril 2021
  • Março 2021
  • Fevereiro 2021
  • Janeiro 2021
  • Dezembro 2020
  • Novembro 2020
  • Outubro 2020
  • Setembro 2020
  • Agosto 2020
  • Julho 2020
  • Junho 2020
  • Março 2019
  • Setembro 2018
  • Junho 2018
  • Maio 2018
  • Abril 2018
  • Março 2018
  • Fevereiro 2018
  • Dezembro 2017
  • Novembro 2017
  • Outubro 2017
  • Agosto 2017
  • Julho 2017
  • Junho 2017
  • Maio 2017
  • Abril 2017
  • Março 2017
  • Janeiro 2017
  • Dezembro 2016
  • Novembro 2016
  • Setembro 2016
  • Agosto 2016
  • Julho 2016
  • Junho 2016
  • Maio 2016
  • Abril 2016
  • Março 2016
  • Fevereiro 2016
  • Janeiro 2016
  • Dezembro 2015
  • Novembro 2015
  • Outubro 2015
  • Setembro 2015
  • Agosto 2015
  • Julho 2015
  • Junho 2015
  • Maio 2015
  • Abril 2015
  • Março 2015
  • Fevereiro 2015
  • Janeiro 2015
  • Dezembro 2014
  • Novembro 2014
  • Outubro 2014
  • Setembro 2014
  • Agosto 2014
  • Julho 2014
  • Junho 2014
  • Maio 2014
  • Abril 2014
  • Março 2014
  • Fevereiro 2014
  • Janeiro 2014
  • Dezembro 2013
  • Novembro 2013
  • Outubro 2013
  • Setembro 2013
  • Agosto 2013
  • Julho 2013
  • Junho 2013
  • Maio 2013
  • Abril 2013
  • Março 2013
  • Fevereiro 2013
  • Janeiro 2013
  • Dezembro 2012
  • Novembro 2012
  • Outubro 2012
  • Setembro 2012
  • Agosto 2012
  • Julho 2012
  • Junho 2012
  • Maio 2012
  • Abril 2012
  • Março 2012
  • Fevereiro 2012
  • Janeiro 2012
  • Dezembro 2011
  • Novembro 2011
  • Outubro 2011
  • Setembro 2011
  • Agosto 2011
  • Julho 2011
  • Junho 2011
  • Maio 2011
  • Abril 2011
  • Março 2011
  • Fevereiro 2011
  • Janeiro 2011
  • Dezembro 2010
  • Novembro 2010
  • Outubro 2010
  • Setembro 2010
  • Agosto 2010
  • Julho 2010
  • Junho 2010
  • Maio 2010
  • Abril 2010
  • Março 2010
  • Fevereiro 2010
  • Janeiro 2010
  • Dezembro 2009
  • Novembro 2009
  • Outubro 2009
  • Setembro 2009
  • Agosto 2009
  • Julho 2009

Categories

  • Abre a roda
  • Abusos da polí­cia
  • Antiproibicionismo
  • Cartas na mesa
  • Criminalização da pobreza
  • Cultura
  • Cultura pra DAR
  • DAR – Conteúdo próprio
  • Destaque 01
  • Destaque 02
  • Dica Do DAR
  • Direitos Humanos
  • Entrevistas
  • Eventos
  • Galerias de fotos
  • História
  • Internacional
  • Justiça
  • Marcha da Maconha
  • Medicina
  • Mídia/Notí­cias
  • Mí­dia
  • Podcast
  • Polí­tica
  • Redução de Danos
  • Saúde
  • Saúde Mental
  • Segurança
  • Sem tema
  • Sistema Carcerário
  • Traduções
  • Uncategorized
  • Vídeos