O tratamento mais seguro e efetivo para indivÃduos extremamente viciados em heroÃna e que não conseguem controlar o vÃcio usando metadona e outros métodos pode ser a própria droga, adquirida com receita médica. É isso o que os pesquisadores estão dizendo após o primeiro teste rigoroso desta abordagem realizado na América do Norte.
Há anos, paÃses europeus como a SuÃça e a Holanda permitem que médicos forneçam a alguns viciados receitas para a aquisição de heroÃna como uma alternativa à compra da droga nas ruas. O estudo revelou que o tratamento é seguro e mantém os viciados longe de problemas. Porém, a abordagem é polêmica – não só porque a droga é ilegal, mas também porque as autoridades governamentais temem que o tratamento à base de heroÃna possa intensificar o vÃcio.
O estudo, que foi publicado em uma edição recente do periódico “New England Journal of Medicine”, poderá acabar com alguns desses temores.
“Ele revelou que a heroÃna funciona melhor do que a metadona nesta população de usuários, e que os pacientes demonstram grande disposição para utilizá-la”, afirma Joshua Boverman, psiquiatra da Universidade de Saúde e Ciência do Oregon, em Portland.
De acordo com Boverman, a maior deficiência do tratamento à base de metadona talvez seja o fato de que “muitos pacientes não desejam tomar esta droga; eles simplesmente não gostam dela”.
No estudo, pesquisadores no Canadá utilizaram 226 indivÃduos que eram viciados antigos e que não conseguiram melhorar usando outros métodos, incluindo terapia de manutenção à base de metadona. Os médicos consideram a metadona, um produto quÃmico parecido com a heroÃna que previne a sÃndrome de abstinência, mas que não tem os mesmos efeitos estupefacientes, o melhor tratamento para a toxicomania. Uma nova droga, a buprenorfina, também é efetiva.
Os pesquisadores canadenses dividiram de forma aleatória os voluntários em dois grupos. Os integrantes do primeiro grupo tomaram metadona e os membros do segundo grupo receberam injeções diárias de diacetilmorfina, o ingrediente ativo da heroÃna. Um ano depois, 88% dos indivÃduos que receberam o componente da heroÃna ainda permaneciam no estudo, e dois terços deles haviam reduzido significativamente as suas atividades ilÃcitas, incluÃdo o uso de drogas adquiridas nas ruas. Já no grupo da metadona, 54% ainda permaneciam no estudo e, destes, 48% reduziram as suas atividades ilÃcitas.
“A principal descoberta foi que, para este grupo que é geralmente tido como não tratável, tanto a metadona quanto a prescrição de heroÃna podem proporcionar benefÃcios reais, diz o principal autor do estudo, Martin T. Schechter, que é professor da Escola de Saúde Pública e de População da Universidade da Colúmbia Britânica.
Aqueles que receberam injeções de heroÃna sofreram mais efeitos colaterais; houve dez casos de overdose e seis convulsões. Mas Schechter afirma que não houve sinais de uso abusivo da droga. A dose média recebida pelos participantes foi de 450 miligramas, uma quantidade bem inferior ao nÃvel máximo de 1.000 miligramas.
Cerca de 663 mil norte-americanos são usuários regulares da heroÃna, segundo estimativas do governo. Os pesquisadores afirmam que entre 15% e 25% desses indivÃduos fazem uso intenso da droga e poderiam beneficiar-se da prescrição médica de heroÃna. Mas isso se algum dia eles tiverem tal oportunidade. A heroÃna é ilegal, classificada nos Estados Unidos como “Substância de NÃvel 1”, o que significa que existe um alto potencial para o uso abusivo e que a droga não tem nenhuma utilidade médica legÃtima. Os pesquisadores acreditam que é improvável que essa designação seja modificada tão cedo.
Em um editorial que acompanhou o artigo, Virginia Berridge, da Escola de Higiene e Medicina Tropical de Londres, concluiu: “A ascensão e a queda dos métodos de tratamento nesta área polêmica baseiam-se nas evidências cientÃficas, mas frequentemente elas estão mais vinculadas à conjuntura polÃtica”.
Tradução: UOL