Fevereiro 12, 2010Notas sobre a pseudo-reportagem de capa da revista Isto É sobre a ayahuasca
Por Beatriz Caiuby Labate
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Recentemente, a Revista Istoé publicou a reportagem “As Encruzilhadas do Daime†(ed. 2100, 5/02/2010), assinada por Hélio Gomes, que, não obstante tente disfarçar sua agenda oculta, visa criar um quadro de medo e alarmismo com relação à s religiões ayahuasqueiras brasileiras. A ayahuasca é composta pelo cipó Banisteriopsis caapi e pelas folhas do arbusto Psychotria viridis. As principais religiões que a utilizam são o Santo Daime e a União do Vegetal (UDV), que nasceram no norte do paÃs nas décadas de 30 e 60, e se expandiram para os centros urbanos a partir da década de 70, e para o exterior a partir dos anos 80. Há também outras vertentes urbanas mais recentes. Este tipo de abordagem desonesta e preconceituosa em nada contribui para o a discussão sobre o uso de substâncias psicoativas, além de violar frontalmente o respeito à liberdade religiosa. Eis a série de imprecisões e equÃvocos da “reportagemâ€:
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– Denomina equivocadamente os seguidores dos movimentos religiosos do Santo Daime e da União do Vegetal de “daimistasâ€, revelando desconhecimento básico sobre o tema;
– Informa equivocadamente que o governo “liberou o Daimeâ€. O reconhecimento do uso ritual e religioso da ayahuasca se deu na década de 80, e foi reafirmado através de uma série de resoluções e pareceres publicados ao longos dos últimos 25 anos, culminando na Resolução N. 1 do Conad, de 25 de janeiro de 2010. Esta, ao contrário, estabelece maiores regras e controles para o uso religioso da ayahuasca do que as anteriores;
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– Afirma que o governo peca ao deixar mortes ocorrerem e ao mesmo tempo “liberou geralâ€, confundindo não só o papel do judiciário, executivo e legislativo no controle sobre o uso de substâncias psicoativas, mas também a ordem dos fatos, uma vez que a resolução do CONAD publicada em 2010 contém o Relatório Final do Grupo Multidisciplinar de Trabalho sobre a Ayahuasca (GMT), concluÃdo em 2006;
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 – Associa levianamente o consumo da ayahuasca à duas mortes recentes. Não há absolutamente nenhuma informação concreta nos dois casos citados no texto que possam comprovar a conexão entre o consumo da ayahuasca e morte, muito menos evidências empÃricas ou cientÃficas que tais situações sejam recorrentes e preoupantes;
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– Afirma que há um alarmante tráfico de ayahuasca no paÃs, mas não realiza nenhuma investigação a respeito, a exceção de digitar no google “comprar ayahuasca†e reproduzir vagamente alguns dos resultados encontrados;
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– Afirma que o uso da ayahuasca causa dependência (“substitutir um vÃcio por outroâ€). Não há informações cientÃficas que comprovem tais afirmação;
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– Afirma que “o uso de ayahuasca por gestantes e crianças é periogosoâ€. Não há informações cientÃficas que comprovem tais afirmações; Â
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– Contém uma coleção de erros nos box “alucinações sagradas†e outro no box sobre os riscos e efeitos da ayahuasca, as quais não valhe a pena detalhar aqui.
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Para sair desta encruzilhada, só com Exu mesmo!
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A matéria publicada na revista Istoé pode ser lida em:
http://www.istoe.com.br/reportagens/48304_A+ENCRUZILHADA+DO+DAIME+PARTE+1?pathImagens=&path=&actualArea=internalPage
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Beatriz Caiuby Labate é pesquisadora Associada do Instituto de Psicologia Médica da Universidade de Heidelberg e membro do Grupo Especial de Pesquisa (SFB 619) “Dinâmicas do ritual – Processos socioculturais sob uma perspectiva comparativa histórica e cultural†(www.ritualdynamik.de) e pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre Psicoativos (www.neip.info).
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