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Março 07, 2010

Feminismo e anti-proibicionismo – um diálogo necessário na luta contra as opressões

Coletivo DAR, março de 2010

Nesta segunda-feira, o dia 8 de março completa cem anos de celebração do Dia Internacional da Mulher, dia de luta por uma sociedade livre das opressões de gênero. Como explica a socióloga Maria Lygia Quartim de Moraes, em sua tese de livre-docência 20 anos de feminismo, “O feminismo, enquanto conjunto de valores e representações sobre a mulher, é uma ideologia contemporânea que animou com bandeiras de luta e plataformas políticas uma fração importante do movimento popular” e parte de duas premissas consensuais: “(1) as mulheres, além de sofrerem outras formas de exploração, são oprimidas enquanto tais, isto é, enquanto representantes do sexo feminino; (2) a opressão da mulher antecede o capitalismo e persiste no socialismo, demonstrando uma especificidade que só poderá ser superada através da militância das mulheres”.

Como militantes do movimento anti-proibicionista, que busca alternativas à atual política de guerra às drogas – responsável pela inaceitável intromissão do Estado na esfera privada dos cidadãos e instrumento de corrupção, violência e criminalização da pobreza – vemos na luta das mulheres por liberdade muitos pontos de confluência, o que levanta cada vez mais a necessidade de articulação entre os diferentes setores que atuam no combate às opressões específicas. As lutas das mulheres por direito ao próprio corpo, pelo fim da hipocrisia que separa público do privado, pela não hierarquização das lutas e contra a militarização e a criminalização da pobreza são irmãs da bandeira do anti-proibicionismo das drogas. Assim como questionar a arbitrária ilicitude de algumas drogas é tarefa não só dos usuários destas substâncias, as bandeiras levantadas pelas feministas devem ser empunhadas por todos que buscam uma sociedade mais justa e igualitária.


Feminismo e anti-proibicionismo são lutas políticas contra um status quo sustentado por interesses econômicos e valores morais milenares que, infelizmente, ainda balizam nossa estrutura social para muito além do que se pode ver na aparência. E são esses interesses e valores um importante pilar de sustentação das desigualdades que oprimem pobres, mulheres, homossexuais, negros, imigrantes e indígenas. Todo comportamento que destoa da ideologia dominante é tachado a priori como ameaçador ao sistema, mesmo que este depois apresente ferramentas de incorporá-lo.

Direito ao próprio corpo

Uma das principais pautas do movimento de mulheres hoje é a defesa da legalização do aborto, cuja ilicitude acarreta em milhares e milhares de mortes de mulheres pobres, que realizam seus abortos em clínicas clandestinas com péssimas condições. Assim como a demanda por drogas ilícitas não diminui com a proibição, a realização de abortos não é inibida pela inexistência de políticas de saúde públicas que o prevejam de forma segura e consequente. E, assim como no caso da proibição das drogas, é um setor muito específico da sociedade o que sofre as consequenciais dessa proibição: os pobres. Se o usuário de drogas que tem dinheiro não tem problemas em obter essas substâncias por enquanto ilícitas e nem é reprimido pela polícia, a mulher de classe alta também não encontra o menor obstáculo para realizar um aborto seguro em clínicas clandestinas de qualidade.


A ilegalidade do aborto é incompatível com um Estado laico, e com uma sociedade que preveja a diversidade como baliza para relações igualitárias. Da mesma forma como a proibição das drogas, a proibição do aborto viola a intimidade e a vida privada dos cidadãos, e representa invasão do Estado sobre a auto-determinação de cada pessoa. E da mesma maneira como defender a legalização das drogas não significa defender o uso de drogas necessariamente, a bandeira do aborto legal não é uma defesa apologética de uma prática que não é simples e livre de consequenciais perigosas – no entanto, em ambos os casos, o status jurídico não pode impedir decisões individuais que não tragam prejuízos a terceiros.

Não por coincidência, os setores mais ativos no combate à legalização das drogas e do aborto são os representantes do que há de mais nefasto na ideologia conservadora e religiosa que sustenta o Poder com P maiúsculo.

Não hierarquização das lutas

Tradicionalmente, dentro dos setores combativos existe um antagonismo entre os que defendem uma relação de horizontalidade entre as diferentes formas de luta – como a sindical, a estudantil, a feminista, a do movimento gay, etc – e grupos dogmáticos que defendem a centralidade da luta política “revolucionária”, que deveria submeter todas as outras, colocando-as em segundo plano. Algo como “primeiro tomamos o poder, depois resolvemos esses problemas menores”.

Exemplo claro está no diálogo entre a alemã Clara Zétkin, precursora feminista que propôs a criação do 8 de março, e o bolchevique Lênin, que defendeu em 1920 que a prioridade na atuação de sua companheira alemã deveria ser “a revolução”, não o debate sobre as condições de vida das mulheres (coincidentemente a imensa maiorias das lideranças da Revolução de Outubro era composta por homens, mesmo que entre a “base” dos lutadores houvesse milhares de mulheres). “Seria agora o momento de incentivar as proletárias com discussões de como se ama ou é amada, como se casam ou estão casadas?” questionou Lênin. “Agora todos os pensamentos das companheiras, das mulheres da classe trabalhadora, precisa ser direcionada para a revolução proletária. Isso criará as bases de uma renovação real no casamento e nas relações sexuais. No momento outros problemas são mais urgentes que as formas de casamento de Maoris ou incesto dos tempos antigos. A questão dos sovietes ainda está na agenda do proletariado alemão”.

Seriam essas questões excludentes? É mais importante a tomada do poder ou a mudança nos valores cotidianos que oprimem inclusive as mulheres dos revolucionários bolcheviques? Não é possível uma luta que congregue mudanças macro-econômicas e políticas com a transformação da mente e das concepções cujas raízes remontam à própria constituição da família e da sociabiliadde humana?

No caso da demanda por alternativas ao proibicionismo, é comum ouvirmos que essa é uma pauta importante mas “não prioritária”. Mesmo os que não assumem essa hierarquização, fazem como fazem com as bandeiras das feministas dentro de parte das organizações de esquerda: resoluções que não saem do papel. Defendemos o aborto ou lutamos contra a guerra às drogas em nossas resoluções, jornais ou até posicionamentos públicos, mas nossa atuação se concentra na disputa do poder (invariavelmente identificada com a disputa do Estado).

Sem falar no moralismo entranhado na prática mesmo dos que supostamente combatem a ordem dominante mas que reproduzem em seu cotidiano pessoal e político distorções e preconceitos contra os quais deveriam lutar.

É a separação entre público e privado, também combatida pelas feministas.

Como explica Maria Lygia, “a instituição da família monogâmica, com o advento da sociedade de classes, reduz a produção doméstica a um serviço privado, feito por cada mulher, no interior de cada unidade familiar. A partir de então a vida social cinde-se em duas esferas: a pública, domínio dos homens, que sofrerá grandes transformações no decorrer da História e a esfera privada, lugar da família, domínio da mulher, que se vê, pois, excluída de qualquer participação social que ultrapasse os limites do seu “lar””.


A luta política restringe-se a transformação da esfera pública, na privada reproduz-se a opressão e a desigualdade. No caso da relação com o uso de drogas, se observa o mesmo comportamento: combatemos os preconceitos, as desigualdades, o senso-comum, mas apenas na esfera pública, em nossa vida pessoal reproduzimos a mesma moral de ascetismo e disciplina que pregam as igrejas e os setores mais conservadores (pensemos na explicação de Weber sobre a relação entre a ética protestante e a moral capitalista – não seria essa pregação ao “sacrifício militante” análoga à louvação do trabalho como salvação?). Experimentações sexuais e sensorais só fazem atrapalhar a “moral bolchevique” (nos termos de Nahuel Moreno) necessária à prática política e à transformação social, esquecendo-se que também as transformações micro-políticas são passos para a formação de uma nova consciência. “Ainda somos os mesmos e vivemos como nossos pais”…

Combate à militarização e à criminalização da pobreza

Um dos quatro eixos de ação da Marcha Mundial das Mulheres para 2010 é “Paz e Desmilitarização”. “No Brasil, lutamos contra a criminalização da pobreza e dos movimentos sociais e contra o processo crescente de militarização da sociedade, que se manifesta por meio de atitudes repressivas e violentas do Estado, como os inúmeros assassinatos cometidos pelas polícias, ou na crença de que as armas são capazes de resolver a questão da segurança pública. Denunciamos como essas ações atingem, sobretudo os negros e negras”, diz a Marcha.

A relação é evidente entre essa bandeira e a necessidade do combate à guerra às drogas, instrumento dessas atitudes repressivas e violentas do Estado. Crimes relacionados às drogas são responsáveis pelo encarceramento de cerca de 75 mil pessoas no Brasil, e no caso das mulheres são a principal justificativa para aprisionamento, o que se repete no mundo todo. Cresce cada vez mais o número de mulheres presas pelo pequeno comércio de drogas, obviamente pobres e na maioria das vezes negras.


Aproveitemos o 8 de março para levantar ainda mais alto a bandeira dos direitos das mulheres. Aproveitemos o momento também para refletir sobre a necessidade da integração entre as lutas e as formulações dos diversos movimentos de combate às opressões. No caso específico entre a relação entre feminismo e anti-proibicionismo, ressaltamos a necessidade tanto da preocupação feminista dentro de nossa militância anti-proibicionista quanto a também impostergável necessidade de reflexão anti-proibicionista dentro da atuação feminista. Esperamos contribuir para a construção deste processo.

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