Folha de S. Paulo
Em teste realizado no Distrito Federal, polÃcia calcula consumo em 2 t/ano
É possÃvel monitorar consumo por quarteirão e até mesmo localizar laboratórios que produzem cocaÃna
FLÃVIO FERREIRA
DE SÃO PAULO
A PolÃcia Federal adotou um novo método para combater o tráfico de drogas no paÃs: a análise da rede de esgoto das cidades.
Os primeiros testes foram feitos neste ano na rede do Distrito Federal e levaram a PF a calcular que o consumo de cocaÃna na capital federal é de duas toneladas por ano.
A pista deixada pelos usuários é uma substância quÃmica chamada Benzoilecgonina, expelida na urina.
É possÃvel identificar até mesmo o consumo por quarteirão, dependendo do número de equipamentos instalados em uma região.
Além do mapeamento de áreas de uso, o método permite investigar laboratórios que produzem cocaÃna.
Em regiões onde há consumo da droga, geralmente a análise encontra quatro partes de Benzoilecgonina para cada uma da cocaÃna pura.
Se a relação se inverte e grandes quantidades da droga são encontradas, é provável que na região ocorra a lavagem de objetos usados na fabricação do entorpecente.
“As análises poderão orientar a repressão ao tráfico de drogas porque vão mostrar nos mapas as regiões onde se consome mais e onde as investigações devem ser intensificadas”, afirma o diretor Técnico-CientÃfico da PF, Paulo Roberto Fagundes.
O projeto, intitulado de Quantox (Quantificativo de Analitos Tóxicos), foi desenvolvido pelo Serviço de PerÃcias em Laboratório e BalÃstica, órgão do Instituto Nacional de CriminalÃstica da PF.
CRACK
O perito criminal federal Adriano Maldaner, chefe do serviço, diz que o objetivo é desenvolver análises para detectar vestÃgios de crack.
“O princÃpio ativo da pedra de crack é a cocaÃna, porém o crack é muito menos estudado que a cocaÃna. Nosso objetivo é produzir estudos inclusive para a comunidade acadêmica”, diz.
Com as amostras colhidas em seis estações de tratamento de esgoto, nos dias 16 e 17 de março e 1º e 2 de junho, a PF calculou em, no mÃnimo, duas toneladas o consumo da droga.
Em 2009, cerca de 350 kg de cocaÃna foram apreendidos na região- com mais de 2,5 milhões de pessoas.
“Antes do Quantox, era difÃcil saber se as quantidades apreendidas pela PF eram significativas em relação ao combate ao tráfico. Com as análises, agora podemos fazer melhor esse tipo de avaliação”, disse Maldaner.
As análises foram feitas em parceria com a Unicamp e UnB. Estudos semelhantes já foram realizados na Itália, Reino Unido, SuÃça e EUA.
Samambaia foi a cidade em que pesquisa mais detectou cocaÃna
De acordo com a análise, média anual na cidade-satélite é equivalente a 27 doses por pessoa
Número encontrado pela PF é quase quatro vezes maior do que nas outras cidades que fizeram parte do projeto
DE SÃO PAULO
A cidade-satélite de Samambaia foi a região do Distrito Federal onde a PolÃcia Federal encontrou o maior consumo de cocaÃna nas primeiras medições realizadas pelo projeto Quantox.
Os cálculos dos peritos criminais da PF ligados ao projeto apontaram um consumo médio por ano de 27 doses de cocaÃna por pessoa na cidade-satélite.
O resultado chama atenção por ser quase quatro vezes maior do que a média geral apurada pela pesquisa nas outras regiões pesquisadas do Distrito Federal.
De acordo com os resultados apontados pelo Quantox, nas outras cidades do Distrito Federal a média de consumo encontrada é de sete doses da droga por habitante anualmente.
As equipes da PF colheram amostras em seis ETEs (Estações de Tratamento de Esgoto) da região analisada: Sul, Norte, Riacho Fundo, Paranoá, Samambaia e Melchior.
Essas ETEs são responsáveis pelo tratamento de cerca de 70% de todo o esgoto produzido e despejado nas redes de coleta do Distrito Federal.
ASSENTAMENTO
De acordo com o diretor técnico-cientÃfico da PF, Paulo Roberto Fagundes, Samambaia é uma cidade-satélite que teve origem a partir de um dos assentamentos criados pelo ex-governador Joaquim Roriz.
A cidade nasceu com o objetivo de abrigar as pessoas que migravam das outras regiões do paÃs e começou a se desenvolver a partir de 1989. Hoje, Samambaia tem cerca de 150 mil habitantes.
O diretor afirma que a população do local é composta por uma maioria de habitantes nas faixas C e D de renda.
O diretor técnico-cientÃfico da PF afirma que ainda é preciso aprofundar os estudos sobre os números de Samambaia, mas as análises do Quantox permitem levantar algumas hipóteses sobre o resultado encontrado.
“Pode ser uma região onde estejam fixadas algumas “bocas” poderosas e em função disso haja um público consumidor maior na área”, de acordo com o diretor.
Em números absolutos, os cálculos da PF apontam um consumo de 512 kg de cocaÃna por ano em Samambaia.
Em termos percentuais, essa quantidade corresponde a 37% do total consumido na área abrangida pela pesquisa do Quantox.
PLANOS
No segundo lugar no ranking do Quantox, está a cidade-satélite de Melchior, com 397 kg por ano, o que representa 27% do total.
Em seguida na lista aparece a Asa Sul de BrasÃlia, com um consumo de 304 kg da droga (quantidade equivalente a 21% do total apontado pela pesquisa).
De acordo com Fagundes, a meta agora é levar o Quantox para outras cidades brasileiras e integrar o projeto aos trabalhos das autoridades ligadas ao combate ao crime organizado. “Para expandir o Quantox para outros lugares será necessária também uma negociação com companhias de água e esgoto de outros municÃpios”, diz.