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Dezembro 06, 2010

ONDE ESTÃO OS MORTOS?

A seguir, três textos da Folha de S.Paulo, publicados no dia 5 e 6 de dezembro, sobre a não divulgação do número de mortos (a enorme maioria composta por negros) e laudos sobre estas mortes nas operações na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão. Nada de novo no front, a começar pelo “silêncio sorridente” daqueles que saudaram a “chegada da lei”, “da paz” e da “democracia” no momento das operações.

Onde estão os mortos?

Houve 37 mortes nas operações da Vila Cruzeiro e do Complexo do Alemão; não se sabe como ocorreram nem quem era bandido ou inocente

Marlene Bergamo – 30.nov.2010/ Folhapress

Enterro de Rogério Cavalcante, que morreu após ser atingido por uma bala no Alemão

LAURA CAPRIGLIONE
MARLENE BERGAMO

ENVIADAS ESPECIAIS AO RIO DE JANEIRO

O adolescente Davi Basílio Alves, de 17 anos, morreu na quinta-feira (25/11). Soldado do tráfico -a própria família o admite-, o jovem foi alvejado por policiais e caiu morto em uma rua de terra da Vila Cruzeiro, quando tentava fugir para o Complexo do Alemão. A mãe de Davi mora em uma viela suja, pichada com um imenso C.V. do Comando Vermelho, na parte baixa da favela.
A mulher logo recebeu a notícia de que o filho não conseguiu escapar. Quando o tiroteio amainou, ela correu ladeira acima. Viu Davi morto ao lado de um campinho de futebol e pediu aos soldados vasculhando as quebradas em busca de armas e drogas para que removessem o corpo de lá.
“Eles disseram que tinham mais o que fazer. Que, se ela tinha sido capaz de pôr um bandido no mundo, seria capaz também de enterrá-lo”, rememorou uma vizinha.
A mãe telefonou para a funerária. “Disseram que não dava para fazer o trabalho.” E não dava mesmo. Rajadas de tiros ainda cortavam a favela.
Choveu na noite de quinta. A manhã úmida veio com um calor de 29ºC na sexta. O corpo do adolescente grandalhão começou a incomodar. Rondavam urubus, que se empoleiravam às dezenas na torre de transmissão elétrica, a poucos metros dali.

AOS PORCOS
Das mais de 20 pocilgas localizadas nos terrenos baldios próximos, saíam porcos magros, em estado de fome crônica. No sábado, o cadáver amanheceu dilacerado.
A mãe arrumou um carro -a vizinhança já não suportava o cheiro. O corpo foi enrolado em uma lona e conduzido ao Hospital Getúlio Vargas, na Penha.
Oficialmente, o jovem morreu naquele dia. Ficou assim registrado na planilha divulgada pelo Instituto Médico Legal: Davi Basílio Alves, 17 anos, pardo, Vila Cruzeiro. Só.
Para a Polícia Militar, 37 pessoas morreram em confrontos polícia-bandidos desde o dia 21 na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão.
Todo dia, a corporação solta um balanço das operações. Coisa sucinta, contabiliza mortos junto com número de garrafas PET e litros de álcool e gasolina apreendidos. Nenhum nome.
Para a Secretaria de Segurança Pública, morreram 18 pessoas (17 identificadas).
O número refere-se aos cadáveres produzidos a partir do dia 25. Os mortos entre os dias 21 e 24, a secretaria não contabiliza. E diz que nem o Instituto Médico Legal do Rio tem dados referentes aos mortos desse período, apesar de todos os corpos recolhidos nas favelas sinistradas pela violência terem sido encaminhados para lá.

INOCENTES
Coincidentemente, a contabilidade da Secretaria de Segurança Pública, omitindo as estatísticas anteriores ao dia 25, evita mencionar incômodas mortes de inocentes óbvios. Como a da adolescente Rosângela Barbosa Alves, 14, atingida por um tiro nas costas enquanto estudava dentro de casa, na frente do computador. Ou a da dona de casa Janaína Romualdo dos Santos, 43, e de um idoso -todos atingidos por balas perdidas.
Sobre as mortes ocorridas a partir do dia 25, o IML nada informa a respeito das circunstâncias em que elas aconteceram. Diz que os “detalhes sobre os laudos são peças de investigação e não serão divulgados”.
Assim, não se sabe se houve tiros à queima-roupa, ou o número de perfurações nos corpos, ou se houve concentração de disparos na cabeça. Nem sequer se sabe se alguém morreu esfaqueado.

SILÊNCIO
A Folha pediu para entrevistar um perito do IML. Resposta: “Infelizmente, não há perito disponível para conceder entrevista sobre o laudo cadavérico dos corpos”.
“Esse tipo de silêncio seria inadmissível se os mortos fossem moradores ricos de Ipanema, mas, como é gente pobre, vale tudo”, disse uma professora da Vila Cruzeiro.
O segurança Rogério Costa Cavalcante, 34, aparece em uma lista de mortos como um dos “traficantes que trocaram tiros com os policiais”, segundo informação oficial da assessoria de comunicação da Polícia Civil do Rio.
Das poucas coisas que se sabe sobre os mortos nos confrontos dos últimos dias, uma das mais certas é que Rogério Costa Cavalcante não trocou tiros com os policiais. Ele foi alvejado bem na frente das câmeras de fotógrafos e cinegrafistas.
Tinha os bolsos cheios de convites para a festa de aniversário de seu único filho. Iria entregá-los quando deu o azar de ficar entre os fogos da polícia e dos traficantes.
Cavalcante caiu com um buraco na barriga, pediu socorro e desfaleceu na frente das câmeras. A Primeira Página da Folha de sábado passado (27/11) publicou a foto.

SEM AUTORIDADE
O homem foi enterrado no cemitério do Catumbi na terça-feira (30/ 11). Com a polícia acusando-o de ligação com o tráfico, nenhum representante do Estado achou necessário levar solidariedade à família. Da imprensa que se acotovelava no Complexo do Alemão quando Cavalcante foi atingido, só a Folha acompanhou o enterro.
O Ministério Público ainda aguarda a conclusão dos inquéritos sobre as mortes, para entrar na história. Isso pode demorar até 30 dias.
Na última quinta-feira, um grupo de ONGs com atuação na área dos confrontos reuniu-se para “construir uma agenda propositiva para o conjunto de favelas do Alemão”. Pediam investimentos do governo. Sobre os 37 mortos, nenhuma palavra.

Governo não divulga lista de mortos e presos

COLABORAÇÃO PARA A FOLHA, DO RIO

Duas semanas após o início dos ataques a veículos no Rio -cuja reação foi a ocupação policial dos Complexos do Alemão e da Penha-, a Secretaria de Segurança Pública ainda não divulgou uma lista completa dos nomes de presos e mortos.
Até sexta-feira, o número oficial de pessoas que continuavam presas era 118. Ainda não há informações sobre quantas foram detidas e depois liberadas.
Em relação aos mortos, a secretaria disse que já identificou 18 de um total de “pelo menos 40”. A Polícia Militar fala em 37 e a Folha contabilizou 51.
A secretaria alega “problemas burocráticos” para receber informações dos IMLs (Institutos Médico-Legais) do Estado.
Nas delegacias próximas ao Alemão e à Penha, policiais disseram à reportagem que é nítida a redução de ocorrências. Na 38ª DP (Brás de Pina), o índice de roubos a pedestres caiu de uma média de 30 casos diários para nove, diz o inspetor Paulo Roberto Alves. (FERNANDO MAGALHÃES)

FERNANDO DE BARROS E SILVA

A sorte dos pobres

SÃO PAULO – “Esse silêncio seria inadmissível se os mortos fossem moradores ricos de Ipanema, mas, como é gente pobre, vale tudo”.
A professora da Vila Cruzeiro se refere ao silêncio das autoridades e dos órgãos públicos do Rio a respeito da identificação e do paradeiro dos que morreram (supostamente) em confronto com a polícia na megaoperação contra o tráfico.
São, segundo a PM, 37 cadáveres desde o último dia 21, na Vila Cruzeiro e no Complexo do Alemão. Para a Secretaria de Segurança Pública, porém, morreram 18 pessoas, uma delas ainda não (ou nunca mais) identificada. A secretaria só reconhece os mortos a partir do dia 25 e afirma que nem o IML tem dados sobre as vítimas entre os dias 21 e 24. Quem precisa de Kafka diante de um Estado como esse?
As jornalistas Laura Capriglione e Marlene Bergamo explicam, na reportagem “Onde estão os mortos?”, na Folha de ontem, que a contabilidade de araque serve, na prática, para evitar a menção à morte de pessoas inocentes. Como a estudante de 14 anos, morta dentro de casa, na frente do computador, por um tiro nas costas.
O IML, além disso, não dá nenhuma informação sobre as circunstâncias das mortes a partir do dia 25. Houve execuções? Sabemos apenas, pela relação do jornal, que 15 das 18 vítimas eram negros ou pardos. Todos eram homens e só três tinham mais de 30 anos.
O corpo do mais novo, de 17 anos, ficou exposto a céu aberto por dois dias, ao lado de um campinho. Já havia sido dilacerado por porcos quando foi recolhido por familiares e levado ao IML. Nem a polícia nem o serviço funerário se prestaram à tarefa. Kafka? Ora, ora…
No clima que se criou, esses episódios não devem figurar nem como nota de rodapé nos relatos da “batalha do Alemão”. Mas eles nos ensinam, muito mais que a narrativa apoteótica da guerra, sobre o que ainda há de descompromisso, arbitrariedade e humilhação na relação do Estado com os pobres.

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