O recente acordo firmado pela gigante farmacêutica Novartis com a britânica GW Pharmaceuticals para vender o Sativex, um remédio à base de maconha, em regiões como Austrália, Ãsia, Oriente Médio e Ãfrica reacendeu o debate sobre o uso medicinal da Cannabis sativa (nome cientÃfico da maconha).
Já aprovado no Canadá, nos Estados Unidos e em alguns paÃses da Europa, o medicamento, que serve para tratar a esclerose múltipla, pode chegar ao Brasil em breve. A lei do PaÃs não permite remédios que tenham extratos da maconha em sua composição, mas existem brechas para casos especÃficos.
A GW Pharmaceuticals, fabricante do Sativex, inclusive já iniciou discussões com a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), no fim do ano passado, para a venda do remédio no Brasil, mas até o momento não houve a liberação.
De acordo com o professor de farmacologia da Universidade de São Paulo (USP) e da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), Gilberto da Nucci, a eficiência do uso de princÃpios da maconha no combate à dor já está comprovada, mas ainda não se sabe exatamente como ela age no cérebro.
“A Cannabis sativa é utilizada como analgésico há mais de 5 mil anos. Foram identificados canabinóides endógenos que atuam em receptores especÃficos no cérebro em sistemas de processamento de dor”, diz. “Os canabinóides orais, tais como tetrahidrocanabinol, canabidiol e nabilona demonstram eficácia analgésica em dor neuropática periférica ou central, artrite reumatóide e fibromialgia”, explica.
“Não é conhecido o mecanismo de ação dos canabinóides no cérebro. Foram identificados receptores para canabinóides endógenos, entretanto, não se sabe ainda a importância dos mesmos na ação da cannabis”, pondera.
Ainda assim, Da Nucci considera que há pouco risco. “Não há evidências de que o uso por perÃodo curto de tempo cause malefÃcios aos pacientes. Esta substância já está liberada para ensaios clÃnicos, assim como em vários outros paÃses, mas não no Brasil. Vários estados americanos aprovaram leis estaduais permitindo a venda e o uso da cannabis para uma variedade de indicações terapêuticas”, diz.
Mesmo quanto ao uso terapêutico na forma de cigarro, liberado em alguns estados americanos, como a Califórnia, por exemplo, Da Nucci faz avaliação positiva. “Um estudo recente demonstrou que a inalação da cannabis três vezes ao dia, por cinco dias, reduziu a intensidade da dor e melhorou a qualidade do sono em pacientes com neuropatia periférica. A inalação da cannabis foi bem tolerada”, diz.
Para o professor, as pesquisas com maconha podem mostrar à medicina um novo campo de ação, com novas substâncias sintéticas sem os efeitos indesejáveis do THC (princÃpio ativo da droga), que poderiam ser úteis no tratamento de várias doenças. “São exemplo as doenças de origem cognitivas, a dor, problemas gastrointestinais e doenças neurológicas. É neste campo que se concentram, hoje, a maior parte dos cientistas que estudam os compostos canabinóides”, diz.