por NegoDito
Não é apenas o futebol que faz a cabeça dos brasileiros. A maconha também é parte da cultura local e em muitos locais já se é possÃvel fumar livremente (ainda que ilegalmente).
Mas os esforços por uma nova lei, menos repressiva, ainda demoram a dar resultados, enquanto os problemas da violência do tráfico continuam nas periferias das grandes cidades.
Ricardo Ampudia, especial para o NegoDito |
No maior paÃs da América do Sul são gastos milhões de dólares com uma polÃtica de repressão à s drogas que, além de não ter efeito na redução do consumo, contribui somente para o aumento da violência do tráfico. A guerra contra as drogas no Brasil é também uma guerra social: Nas favelas, morros e periferias das grandes cidades, tráfico e polÃcia travam batalhas que vitimam famÃlias, crianças e trabalhadores, mas ninguém vence.
O debate sobre um novo paradigma para reprimir e regular o uso de entorpecentes no Brasil ainda caminha a passos lentos e é envolvida pelo moralismo e informações deturpadas.
A última vez em que a Lei Antidrogas foi modificada já conta cinco anos no calendário. Em 2006, depois de um longo perÃodo de negociações, a antiga lei de 1976, que não distinguia usuário de traficante, foi modificada por um texto que agora regula a punição do usuário não com prisão – antes chegava a 15 anos de reclusão – mas com medidas socioeducativas.
A nova Lei 11.343 prevê que o consumo, porte e cultivo para uso pessoal sejam penalizados com medidas alternativas como serviços comunitários e até com tratamento para o vÃcio. Ainda que insuficiente, a medida foi um importante passo para advogados e ativistas que agora lutam por medidas favoráveis a growers.
O antropólogo Sérgio Vidal, que faz parte do Grupo de Trabalho do Conselho Nacional de PolÃticas sobre Drogas, em que se discute as mudanças da lei, reconhece os avanços, mas avalia que há lugares em que o tema ainda está emperrado. “Atualmente, a análise da maioria do GT, e minha também, é que há uma tolerância maior, um interesse em levar a questão adiante e um espaço maior de atuação no Judiciário e Executivo, mas no Legislativo ainda persistem os projetos sugerindo prisão a usuáriosâ€, comenta.
O jornalista R.L* conhece a nova lei de perto. Vivendo numa pacata cidade no sul do paÃs, com pouco mais de 300 mil habitantes, cultivava três pés de maconha com menos de um mês de idade. “Nem dava pra ver as folhas de cinco pontas ainda, tinha uns dez centÃmetros de alturaâ€, conta.
Ao atender a campainha, que tocava sem que a pessoa do lado de fora se identificasse, em 19 de novembro de 2008 – enquanto o Brasil se preparava para disputar uma partida contra Portugal, lembra ele – R.L se deparou com dois policiais de arma em punho que o puseram na parede e perguntaram pelas plantas.
Por três pequenas plantas e mais 15 gramas de erva, o jornalista passou mais de duas horas na prisão, assinou papeis e agora tenta cumprir os serviços comunitários obrigatórios, como frequentar reuniões com psicólogos e grupos de apoio.
“Essa lei, que pensávamos ser uma de pequena salvação, no papel é mais burra, demorada demais. Além do mais, a lei diz uma coisa, a polÃcia faz outra quando está na sua casaâ€, diz ele, que ainda conta que a primeira coisa que fez depois de sair da prisão foi acender um fininho “Para relaxar, né!?â€, confessa.
Growroom
Criado há oito anos, o Growroom (www.growroom.net) é mais do que um portal sobre maconhismo, é praticamente uma instituição. “Das diversas motivações, poderÃamos dizer que a mais importante é a defesa dos direitos do usuário. Não se trata apenas do direito de decidir se vai ou não consumir, mas de escolher cultivar o que se consome, de expressar sua cultura de usoâ€, diz Sérgio Vidal, também antropólogo e ativista do Growroom.
Com cerca de sete mil acessos diários e mais de 31 mil usuários no fórum, o Growroom se tornou se tornou um espaço de troca de informações sobre cultivo, uso, redução de danos e ativismo. Foi ali que nasceu a Marcha da Maconha.
Marchar pela mudança, marchar pela maconha
Segundo o cientista social Marco Magri, do coletivo Marcha da Maconha de São Paulo, o momento para a polÃtica sobre drogas no Brasil está muito mal, e o paÃs está atrasado nas discussões da questão, diferente da Argentina e Uruguai. “No mundo todo se debate polÃticas de pós-proibição, já que é um fato que a repressão não está funcionando. E aqui ainda debatemos nosso direito de poder expressar nossas opiniões sobre o assuntoâ€, diz ele, referindo-se a proibição da Marcha em algumas cidades.
A Marcha é um coletivo organizado em 15 capitais brasileiras, que luta pela mudança da Lei Antidrogas e passa todos os anos, desde 2005, em diferentes datas por cada cidade. Nos últimos anos, o Ministério Público vem pedindo a proibição do protesto, alegando crime de apologia, o que Magri pensa ser um retardo muito grande na discussão.
“Em São Paulo, por exemplo, onde a Justiça proibiu a Marcha nos últimos dois anos, nós perdemos tempo tentando legaliza-la. Esse tempo poderÃamos ter usado para debater questões importantes como a descriminalização, colocando o Brasil num debate internacionalâ€, opina.
Ayahuasca pooode
Conhecido como Santo Daime, a ayahuasca é uma infusão de ervas amazônicas utilizada em rituais por algumas religiões do Brasil. Ainda em 1986 começou o debate sobre a legalidade do uso da droga, já que a Constituição traz como princÃpio a defesa da liberdade religiosa e de culto.
Somente em 2006, 20 anos depois, o Conselho Nacional de PolÃticas sobre Drogas (CONAD) deu o parecer favorável ao uso da ayahuasca. Vinculada a uma permissão especial do Ministério da Justiça, as religiões podem utilizar a infusão em cultos.
Os efeitos descritos pelos usuários são alucinações visuais e sonoras, viagens ditas como um encontro consigo mesmo, que os fiéis creem ser como uma descoberta dos medos dos quais irá se libertar. Outro efeito muito comum são os vômitos, que funcionam como um purificador do organismo, eliminando o que faz mal.
Ainda que a constituição estabeleça liberdade de culto religioso e de tentativas jurÃdicas, o uso da cannabis pelas comunidades rastafáris no norte – onde a religião é mais amplamente difundida – segue ilegal.
Outras:
Merla é o nome da substância feita a base de pasta de coca, ácido sulfúrico, querosene e cal que se vende na região central do Brasil, especialmente Distrito Federal. É mais barato e muito mais destrutivo que o crack.
Crack é o entorpecente cujo consumo mais aumenta no Brasil. Em 2005 foram 136 toneladas de pedras apreendidas. Em 2007, último dado, 578 toneladas.
No dia 18 desse mês, a primeira apreensão de oxi no Piauà foi feita – dias depois da PM gaúcha estrear sua apreensão no sul. Atualmente, essa mistura de substâncias corrosivas, como querosene, lÃquido de bateria e cal virgem, é a inimiga número um dos agentes do Denarc e da mÃdia. O oxi tem como atribuições um efeito três ou quatro vezes mais nocivo que o crack. Existe o registro de uso por parte de algumas tribos indÃgenas.
Eram 422.590 presos por tráfico nas prisões brasileiras em 2007. Cada preso custa cerca de R$1,5 mil ao Estado por mês.
Numa pesquisa nacional em 2005, 8.8% dos entrevistados afirmaram que já experimentaram maconha. 2,9% já haviam consumido cocaÃna.
Segundo a ONU, o Brasil é o terceiro maior consumidor de anfetamina do mundo, e o campeão em uso de remédios para o emagrecimento.
*O entrevistado preferiu não se identificar
Quando Marchar:
São Paulo – 21/5, embaixo do Masp
Curitiba, JundiaÃ, Porto Alegre e Recife – 22/5;
BrasÃlia – 27/5
Campinas, Floripa, Fortaleza, Natal e Salvador – 28/5
Rio das Ostras – 25/6