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Junho 05, 2011

Quebrando o tabu ou só deslocando-o de lugar?

Filme centrado na figura de FHC é importante por ajudar a difundir debate, mas peca ao focar-se somente na descriminalização do usuário e ao igualar consumo de drogas com doença

 

Gabriela Moncau – Coletivo DAR

 

“Como não há receitas e cada país tem suas peculiaridades, cada um tem que encontrar o seu caminho. Certamente o caminho que vem sido percorrido desde que se decretou a guerra às drogas tem sido o caminho do desastre”, diagnostica o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso (FHC) em um encontro com a imprensa, a respeito do documentário Quebrando o Tabu, dirigido por Fernando Grostein Andrade – meio-irmão do apresentador Luciano Huck, co-produtor do filme, estreou nesta sexta, 3 de junho.

 

O filme, gravado durante 2 anos, tem como principal objetivo trazer o debate a respeito da descriminalização das drogas – em especial a maconha – no Brasil. FHC, o âncora do longa-metragem, viaja pelo mundo (leia-se Europa e Estados Unidos) para conversar com usuários, médicos e ex-presidentes a respeito de diferentes experiências na legislação de drogas. Ora o próprio FHC dá entrevistas enquanto sociólogo, ora aparece como entrevistador, coletando depoimentos.

 

De 2008 para cá o ex-presidente brasileiro vem pautando a questão e posicionando-se publicamente favorável à descriminalização da maconha e a políticas de redução de danos para usuários. Durante seus anos de presidência (1994-2001), no entanto, não só não tocou no tema como esteve alinhadíssimo com o modelo estadunidense de guerra às drogas, com forte repressão aos usuários e vendedores e crescente encarceramento. “Eu não sabia muita coisa”, se defende, “Minha experiência pessoal sobre a questão de drogas é nula. Eu aprendi ao fazer o filme, não sabia. Quando eu era presidente, menos ainda. E também o Brasil vivia outro momento, não era um tema tão candente”.

 

Apesar de presidir a Comissão Global de Política Sobre Drogas, FHC afirma que se fosse presidente da República hoje não garante que descriminalizaria a maconha: “Não sei qual seria minha relação no congresso, não sei quais seriam os outros temas candentes, não posso afirmar nada”.

 

Em Quebrando o Tabu, não é só FHC que admite o fracasso da guerra às drogas: Bill Clinton, presidente dos Estados Unidos de 1993 a 2001, também assume o “erro” da política de drogas baseada na repressão. “Obviamente é mais fácil, uma pessoa que é ex-presidente se sente mais a vontade para falar sobre uma série de temas”, comentou Fernando Henrique. Infelizmente nenhum presidente atual aparece no filme. Tampouco o documentário faz uma retrospectiva dos interesses políticos e econômicos dos governos estadunidenses que internacionalizaram o proibicionismo das drogas.

 

Entre os entrevistados estão também os ex-presidentes Jimmy Carter (EUA), César Gavíria (Colômbia), Ruth Dreifuss (Suiça), bem como o diretor do Drug Policy Alliance, Ethan Nadelman, o ator Gael García Bernal, o escritor Paulo Coelho e o médico Dráuzio Varella.

 

Durante a coletiva de imprensa, FHC soltou uma frase a respeito dos usuários de drogas que resume bem a limitada perspectiva na qual o filme se baseou: “Precisamos tratar essa gente como doentes, gente que precisa de assistência médica, e não como criminosos”. De fato, a ideia de que o usuário não deve ir para a cadeia, e a defesa da redução de danos – uma estratégia de abordagem humanizada que parte do princípio de que não haverá extinção do uso das drogas na sociedade e portanto formula práticas para que os danos produzidos por esse consumo sejam diminuídos – encampada por uma figura pública com o respaldo do ex-presidente tucano é simbolicamente importante.

 

No entanto, o simplismo de reduzir usuários de drogas a doentes que necessariamente precisam de tratamento não só alimenta um estereótipo de que “drogas” por si só são maléficas em qualquer situação, como a ideia de que a relação do Estado com consumidores de drogas seja obrigatoriamente de tratamento médico (como se esse não dissesse respeito ao próprio uso de mais drogas) justamente se contrapõe a um dos princípios dos que trabalham com a redução de danos: o de que o próprio indivíduo deve ter a autonomia de escolha se quer se tratar ou não. Não se leva em conta o enorme número de usuários de drogas que não são dependentes, nem doentes, simplesmente usam determinada substância para uso recreativo/religioso/cultural e vivem muito bem, obrigado.

 

Nesse sentido, além do documentário não abarcar a questão do direito individual de cada cidadão decidir o que deve ou não consumir e fazer com seu próprio corpo, ele abre brechas para uma leitura – diante do argumento de que o usuário é doente e o Estado tem de tratá-lo e mesmo interná-lo – de que a autonomia do indivíduo não cabe nem no âmbito do proibicionismo nem no da descriminalização.

 

Um exemplo desse autoritarismo do Estado nessa questão é a medida posta em prática pela prefeitura do Rio de Janeiro nessa semana, por meio de determinação do Judiciário carioca interpretando a lei da reforma manicomial, de internar crianças e adolescentes usuários de drogas compulsoriamente em clínicas de reabilitação. “Provocados por parentes assistidos pela Defensoria Pública fluminense, os juízes de Vara de Fazenda Pública do Rio têm entendido que entre uma “aparente” liberdade da pessoa e o direito à saúde, prevalece o último”, conta reportagem de Marina Ito.

 

O filme foi financiado por renúncia fiscal, e custou R$2,7 milhões. O jovem diretor conta que o convencimento para que as empresas financiassem uma produção com esse tema foi difícil, “mesmo que seja num filme que seja para ir contra a droga, para reduzir o dano, o consumo”. “Isso já mostra que o tabu está sendo quebrado. É inimaginável pensar há tempos atrás no Banco Santander, Telefônica, etc., se envolverem numa discussão tão polêmica e que questiona a lógica da proibição. Isso já é positivo”, completa Grostein.

“Se você perguntar para a sociedade se ele é a favor da legalização, acho que 80% vai dizer que não. Porém, se perguntar se a solução é colocar as pessoas na cadeia, a maioria vai dizer que isso não resolve. Depende apenas de como se coloca a questão”, encerra Andrade.

 

O ex-presidente brasileiro tem absolutamente claro qual o setor social que mais sofre com a proibição das drogas: “É crime para alguns, mas não para todos. Nos EUA tem centenas de milhares de presos, mas quase todos são negros e pobres. O acesso à droga no Brasil para as classes médias é menos arriscado do que para os mais pobres, há uma injustiça social”, descreve. Porém, os posicionamentos que defende publicamente e emplacados no documentário não apontam para uma alternativa que desagrave essa injustiça.

 

Quebrando o Tabu faz uma defesa unicamente da descriminalização do usuário. Questionado pelo DAR a respeito da hipocrisia de tal defesa, na medida em que libera o consumidor e criminaliza o vendedor, de modo a manter a violência sobre os mais pobres, Fernando Henrique responde que “as sociedades não mudam de uma vez, então não adianta pensar no fim do processo, é preciso dar passos. Vários países estão tentando encontrar alternativas, mas nenhum tem uma solução cabal.”

 

E a regulamentação total da produção, venda e consumo? E a proposta de alguma alternativa que impeça que a justificativa de guerra às drogas – ou no caso da descriminalização do usuário, a guerra ao vendedor de drogas – continue com a criminalização da pobreza, o encarceramento em massa, a militarização das favelas? “É simples falar, mas é difícil fazer. Não é por hipocrisia, mas por não disponibilidade ainda de respostas satisfatórias”, resume-se a dizer FHC.

 

O filme Quebrando o Tabu é importante na medida em que fomenta o debate sobre a questão das drogas na sociedade, além de evidenciar que até figuras conservadoras como Bill Clinton e Fernando Henrique Cardoso assumem que a guerra às drogas fracassou. Mas mais que isso: deixa clara a importância não só da inserção do máximo de pessoas possível no antiproibicionismo, mas a urgência da disputa dos projetos alternativos à proibição por parte dos que lutam por uma sociedade de fato digna e igualitária.

 

 

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