Fábio Nassif, Carta Maior
São Paulo – Completando cinco anos de existência no Brasil, o movimento Marcha da Maconha pretende fazer suas maiores manifestações este ano. Será a primeira leva nacional de protestos depois da decisão unânime do Supremo Tribunal Federal (STF), em junho de 2011, que legalizou a realização das marchas. A exemplo de São Paulo, o movimento deverá se focar no eixo “Basta de guerra –por uma outra polÃtica de drogasâ€.
Uma das primeiras brigas do movimento que reivindica a legalização da maconha é romper a barreira da mÃdia, que segundo suas lideranças alimenta uma imagem distorcida dessa pauta e de seus defensores. Os integrantes do movimento querem que mais gente compreenda que sua luta não se resume ao direito individual de consumo da droga, mas que é preciso discutir uma nova polÃtica de drogas que envolva os temas de saúde pública, redução de danos, segurança e combate à pobreza.
Gabriela Moncau, uma das organizadoras da Marcha, acredita que entre os principais aspectos negativos da guerra à s drogas estão “a ingerência indevida do Estado na escolha pessoal do que cada indivÃduo adulto consome, escolha essa que afeta o seu próprio corpo somenteâ€, além de ser usada como “pretexto para justificar a violência estatal, invariavelmente sobre os setores mais pobres da população, como mostram as ocupações militares nos morros do Rio de Janeiro, por exemploâ€.
Alguns dados expostos em um vÃdeo da Marcha da Maconha de SP esboçam uma realidade difÃcil em decorrência da proibição. A “guerra à s drogas†justifica uma polÃtica brutal de repressão que recai principalmente sobre os jovens, negros e pardos, moradores das periferias – perfil majoritário das prisões por tráfico de drogas. Segundo o vÃdeo, 57% dos condenados por tráfico são réus primários e o número de presos por este motivo aumentou 118%. “A maior parte das mulheres sob custódia no sistema prisional brasileiro foram condenadas por tráfico de drogasâ€, completa o vÃdeo.
“Fica cada vez mais evidente que se a proibição das drogas tinha o objetivo de acabar com o consumo de substâncias psicoativas, tradição milenar da humanidade, ela fracassouâ€, diz Moncau, acrescentando que “a falta de regulação para esse enorme mercado só alimenta a corrupção, a violência, a falta de tratamento para o uso abusivo e a desinformaçãoâ€. “É contra isso que a Marcha da Maconha se levanta e é por isso que acreditamos que nossa reivindicação diz respeito a todos que lutam por uma sociedade mais justa e humana, sejam usuários ou nãoâ€, afirma.
O movimento acredita que a legalização significa o estabelecimento de outras leis sobre o uso da maconha. A legalização pode alterar a lógica de criminalização da pobreza e do encarceramento em massa enquanto polÃtica do Estado. Do ponto de vista da saúde, a prevenção de danos e os tratamentos públicos de dependência são itens que complementam a proposta.
Proibição ao debate
Em 2011, pelo menos quatro das vinte marchas que pediam a legalização da maconha foram proibidas pela justiça. Além das treze pessoas detidas pelo paÃs, em São Paulo, a PolÃcia Militar utilizou bombas de gás lacrimogêneo, spray de pimenta e balas de borracha para reprimir os manifestantes, ferindo dezenas.
Encarada como “apologia ao crime†por alguns Tribunais de Justiça estaduais, as Marchas da Maconha impulsionaram a realização das Marchas da Liberdade em mais de 30 cidades, que incluÃam, entre outras reivindicações, o direito à liberdade de expressão. Após grande repercussão, o STF decidiu por unanimidade pela legalidade das marchas.
Celso de Mello, relator da proposta, declarou no julgamento que “a defesa da legalização das drogas (…), longe de significar ilÃcito penal (…), representa prática legÃtima da liberdade de expressãoâ€. E seguiu dizendo que “[a liberdade de expressão] é um direito que não pode nos ser retirado por agentes do Estadoâ€.
Mais aliviado em poder sair à s ruas para levantar um debate polÃtico na sociedade, o movimento está fazendo uma campanha de arrecadação de fundos para ampliar sua visibilidade. E pretende, pelo menos, qualificar uma discussão complexa. “Enquanto o paÃs não se abrir para isso, o tema continuará sendo utilizado em campanhas conservadoras e obscurantistasâ€, diz Moncau.
As marchas acontecerão em maio no Rio de Janeiro (5), Belo Horizonte, Fortaleza, Niterói (12), Curitiba, Patos, Salvador, São Paulo (19), Aracaju, Atibaia, JundiaÃ, Natal (20), BrasÃlia (25), Diadema, João Pessoa (26), Blumenau, Guarulhos (27), Juiz de Fora (28), e em junho em Goiania (1) e Florianópolis (2).