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RIO – As despesas com pessoal consomem quase dois terços do total gasto, mensalmente, pela Secretaria municipal de Assistência Social no acolhimento e no tratamento de viciados em crack. Segundo a planilha de março apresentada pelo órgão, do total de R$ 1.699.141,24 – menos do que os R$ 2 milhões informados inicialmente -, R$ 1.049.896,85 foram destinados ao pagamento de 584 servidores públicos ou profissionais contratados. Entre eles, apenas cinco são médicos: quatro lotados em unidades que abrigam compulsoriamente menores e um (sanitarista), que deve dar apoio a todas as equipes de abordagem de drogados nas ruas.
Ao justificar o número reduzido de médicos, a secretaria alegou que a função do órgão é prestar assistência social. Pelo quadro apresentado, entre os profissionais que trabalham em abrigos para viciados e nas equipes de abordagem, há 38 assistentes sociais, 34 psicólogos e cinco enfermeiros.
Além dos salários, o valor de quase R$ 1,7 milhão é destinado mensalmente ainda ao pagamento de alimentação (R$ 197.937,96), de transportes (R$ 199.719,50), de serviços diversos (R$ 54.957,29 para limpeza e material pedagógico, entre outros), de concessionárias (R$ 51.190 para quitar contas de luz, gás e telefone), de aluguel de quatro casas (R$ 30.100), de monitoramento (R$ 59.689,64) e de convênios com entidades responsáveis por dois abrigos para homens e mulheres (Emaús, em Cordovil; e Retiro do Maranathá, no Engenho de Dentro).
É com a Unidade de Reinserção Social Rio Acolhedor, para adultos, em Realengo, que a prefeitura gasta mais: R$ 481.783,82. O Rio Acolhedor é ainda o abrigo com mais funcionários: 180, que, juntos, representam um gasto de quase R$ 267 mil. Da equipe, sem médicos, fazem parte um enfermeiro, 14 psicólogos e dez assistentes sociais. Se todas as 450 vagas da unidade estivessem ocupadas, seriam dois funcionários e meio para cada paciente. Como o acolhimento é compulsório apenas para os menores, no entanto, a rotatividade nesse abrigo é grande.
Outras três unidades recebem adultos viciados e recursos da prefeitura: Irmã Dulce, no Rio Comprido, com 16 vagas para mulheres; Emaús, com 33 vagas para homens; e Maranathá, com 40 vagas. Juntando as quatro casas, as despesas da prefeitura com adultos viciados chegam a R$ 587.366,56.
Para atender crianças e adolescentes viciados, o gasto é um pouco maior: R$ 697.202,12. A fatia destinada às equipes de abordagem é de R$ 230.952,06. Outros R$ 183.620,50 são para custear os gastos do grupo que trabalha no gerenciamento do programa de combate às drogas, formado por 40 profissionais.
As quatro unidades que atendem menores com dependência quÃmica funcionam em prédios alugados. Juntas, têm 178 vagas, mas, atualmente, há apenas 119 menores internados compulsoriamente. Elas funcionam em Laranjeiras (Casa Viva, para adolescentes do sexo masculino), Guaratiba (Ser Criança e Bezerra de Menezes, esta para menores do sexo feminino) e Campo Grande (Ser Adolescente).
A rede municipal de assistência a dependentes quÃmicos é formada ainda por três centros que fazem a triagem dos menores abordados nas ruas: a Central de Recepção Ademar Ferreira de Oliveira e a Central de Recepção Taiguara, ambas no Centro; e a Central de Recepção Bangu. Nesses centros, é avaliado se o menor precisa ou não ser internado compulsoriamente para se tratar.
Segundo a Secretaria de Assistência Social, 40% dos menores recolhidos nas ruas e em cracolândias foram internados. Das crianças e adolescentes acolhidos compulsoriamente, 24% são reincidentes, ou seja, foram abordadas mais de um vez. Ainda de acordo com a secretaria, 31% dos menores internados no último ano não receberam uma única visita de familiares. O crack foi a droga utilizada mais mencionada por essas crianças e adolescentes, seguida pelo cigarro, pela maconha e pela cocaÃna.
Dos abrigados compulsoriamente, 60% são do sexo masculino. Números mostram ainda que 50% têm entre 13 e 15 anos; 35% entre 16 e 17 anos; e 15% até 12 anos.
Especialistas divergem sobre a internação compulsória de usuários de crack. Presidente da Comissão de PolÃticas Sobre Drogas da Ordem dos Advogados do Brasil, seção Rio (OAB-RJ), o advogado Wanderley Rebello de Oliveira diz que não há base legal:
– Considero uma ilegalidade ações como essa. O álcool mata mais do que todas as drogas juntas, e não existe histórico de recolhimento de pessoas sob o efeito de bebida.
Especialistas têm opiniões divergentes
Perguntado se a lei 10.216 fundamenta esse tipo de procedimento, o advogado afirmou que ela não se refere a pessoas com dependência quÃmica. Já a psiquiatra Analice Gigliotti, especialista em dependência quÃmica, discorda. Para ela, a lei respalda a internação involuntária.
– Existe uma diferença entre internação compulsória e involuntária. Na primeira, ela ocorre por decisão judicial. Na segunda, por decisão médica, com base no fato de que um dependente de crack pode, por exemplo, colocar em risco a própria vida e a de terceiros. A lei dá base legal à internação involuntária, pois qualquer condição que afete o cérebro e mude o comportamento é um transtorno mental, mesmo que passageiro.
Para ela, o caso do dependente de crack não é um transtorno passageiro, e sim crônico.
Na tarde de sexta-feira, PMs a cavalo começaram a patrulhar o Campo de Santana, onde ocorrem assaltos e viciados costumam se reunir.
Ministro da Saúde visita cracolândias e assina convênio de R$ 240 milhões para o estado
Horas antes da assinatura do convênio entre União, estado e municÃpio como parte da campanha “Crack, é possÃvel vencer”, do governo federal, o ministro da Saúde, Alexandre Padilha, acompanhou na madrugada de sexta-feira uma operação de acolhimento de usuários da droga nos arredores da Central do Brasil e da Cidade do Samba, na Gamboa. Durante a ação, que reuniu 30 agentes da Secretaria de Assistência Social e um carro do 5º BPM (Praça Harmonia), 15 adultos aceitaram ir para abrigos e uma adolescente foi recolhida compulsoriamente.
Para o ministro, a droga passou a atingir mais pessoas, de diversos perfis, e mais regiões, o que demanda uma ação integrada. Ele acompanhou a operação ao lado do secretário municipal de Assistência Social, Rodrigo Bethlem.
– Hoje, não são apenas os moradores de rua que usam crack, nem é mais um problema exclusivo das cidades grandes – disse Padilha, que conversou com pessoas que eram abordadas pelos agentes. – Por isso, é preciso disponibilizar equipamentos para tipos de atendimentos diversos. Tornou-se necessário combinar investimentos em prevenção, cuidados e forte repressão ao tráfico, este último sob responsabilidade do Ministério da Justiça e da Secretaria de Segurança.
Bethlem disse que, com as verbas que serão repassadas, haverá ampliação da estrutura de atendimento.
– Antes de termos o acolhimento compulsório de crianças e adolescentes, contávamos com 30 vagas para o grupo e elas não eram preenchidas. Hoje, temos 170 vagas e mais de 110 delas estão preenchidas. Com as verbas, vamos ampliar o atendimento.
Consultórios serão montados em ônibus
Ações de saúde, segurança e inserção social. Esse é o tripé do atendimento aos usuários de crack previsto no convênio de “Crack, é possÃvel vencer”, assinado na manhã de sexta-feira. Está previsto um investimento de R$ 240 milhões no estado pelo governo federal. Ao assinar o acordo, o ministro da Saúde anunciou já para os próximos 30 dias a instalação de dois consultórios móveis – ônibus com médicos, psicólogos e assistentes sociais – junto à s cracolândias do Jacarezinho e do Morro Santo Amaro, no Catete.
– Os consultórios terão o papel de fazer uma busca de quem vive na rua. Os profissionais de saúde treinados avaliarão, junto com assistentes sociais, a melhor forma de tratamento para o dependente da droga – disse Padilha.
A previsão é que, até 2014, a capital receba uma verba de R$ 4,25 milhões: R$ 1,23 milhão para Santo Amaro e R$ 2,44 milhões para Jacarezinho, Manguinhos e Bangu. Desse montante, R$ 1,3 milhão já serão investidos nos próximos seis meses.
No programa estão previstas ainda ações de segurança pública, com operações policiais concentradas nas divisas do estado e em cracolândias, onde serão instaladas câmeras. Segundo o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, a ideia é identificar e prender quadrilhas de traficantes. O Rio receberá cem câmeras, cinco bases móveis de videomonitoramento, 15 veÃculos e 200 profissionais de segurança pública. O total de investimento federal nesse sistema será de cerca de R$ 9 milhões.
As ações de saúde incluirão a criação de 427 leitos em enfermarias especializadas de hospitais federais para tratamento de dependentes quÃmicos. Está prevista ainda a criação de seis novos centros de acolhimento de viciados. Equipes médicas e de profissionais de assistência social serão treinadas para lidar com os usuários de crack. A previsão é que, até 2014, cerca de 308 equipes de abordagem estejam treinadas.
Após assinar o convênio para combate ao consumo de crack e tratamento de dependentes da droga, o prefeito Eduardo Paes defendeu a internação compulsória de adultos viciados:
– Queria deixar explÃcita minha posição favorável à internação compulsória em caso de adultos viciados em crack. Sei de pessoas que perderam o bom senso, a capacidade de julgar, de avaliar e de tomar decisões. É um tema polêmico, mas temos que salvar vidas.
Já o ministro da Saúde disse ser a favor da internação involuntária, com base na lei federal 10.216, de junho de 2001, que trata da internação compulsória de pessoas com transtorno mental. Segundo ele, as internações respeitarão um protocolo e terão que ser determinadas por profissionais de saúde:
– Temos regras e leis que nos permitem fazer a internação quando o profissional avaliar que aquela pessoa corre risco de vida ou coloca em risco a vida de outras pessoas. Temos regras para dizer que é possÃvel fazer internações involuntárias.