Entrevista com coletivo de Campinas inaugura seção no site do Desentorpecendo A Razão
O nome faz alusão ao THC [delta-9-tetrahidrocanabinol], mas não se engane a primeira lida: o coletivo discute mais do que maconha. Defensores de — e lutadores por — uma nova polÃtica de drogas, o Delta 9 participa da organização da Marcha da Maconha e toca diversas atividades relacionadas ao antiproibicionismo em Campinas.
Para entender como e por que esse “coletivo plural, não centralizado e antibroibicionista” debate “proibição das drogas, democracia, liberdade do corpo e criminalização da pobreza” na luta por uma “sociedade menos preconceituosa, menos opressora e mais inclusiva”, confira a entrevista abaixo! É a primeira da seção “Abre a roda”, na qual o DAR convida coletivos para um bate-papo sobre  a trajetória de luta de cada um deles.Â
DAR — Como rolou a ideia de formar um coletivo antiproibicionista?
Delta 9 — Há dois anos, alguns dos membros iniciaram uma movimentação na cidade de Campinas em prol da realização da Marcha da Maconha. Nesse momento, o recente movimento passava por um crescimento intenso na cidade e nos envolvemos, principalmente, consolidando o Coletivo MM para realização da marcha. Depois da marcha daquele ano, o coletivo se esvaiu e os que ficaram sentiram muita falta da criação de algo mais orgânico e contÃnuo. Ainda nos mantivemos como Coletivo MM e mantivemos alguma movimentação, no limite que nos era requisitado. Tempos depois, em um espaço socio-cultural organizado por outro coletivo, nos apresentamos e contamos um pouco do que foi a Marcha da Maconha daquele ano, e algumas pessoas começaram a se interessar em somar força à causa da maconha. E logo no inÃcio deste ano, essa galera tomou as rédias, já marcando reuniões da MM do ano de 2012. Os dois coletivos logo se juntaram num novo Coletivo da Marcha da Maconha grande e comprometido.
DAR — E como o debate avançou para além da legalização da maconha?
Delta 9 — Com o passar das reuniões, a partir das discussões, foi se mostrando necessária uma revisão da polÃtica de drogas como um todo, não apenas se retendo à s questões relacionadas à maconha, mas a uma discussão geral acerca do tema das drogas e todos os subtemas relacionados. Em meio a esse processo, o coletivo se criou, com a ideia de montar na semana da marcha uma semana de discussões sobre drogas: “DnA – Drogas na atualidadeâ€. Passada a marcha, fizemos uma reunião para discutir o coletivo e o que seria essa organização. Ao fim, resolvemos fazer deste um coletivo plural, não centralizado e antibroibicionista, por entendermos que, dentre muitos fatores relacionados à democracia, liberdade do corpo e criminalização da pobreza, a proibição de todas as drogas só está acarretando prejuÃzo e atraso a uma sociedade que pode ser menos preconceituosa, menos opressora, mais inclusiva, enfim, mais próxima a uma comunidade.
DAR — Quais ideais unem o Delta 9?
Delta 9 — A certeza de que uma mudança na atual polÃtica de drogas é necessária e que tal mudança não virá gratuitamente por parte de nossos governantes. Compartimos a posição polÃtica ativa, acreditando na organização popular para exigir seus direitos e reivindicar mudanças nos pontos com os quais discorda. A esperança de um mundo mais justo motiva e impulsiona a todos nós. Ao nosso ver, os entorpecentes não podem ser proibidos. O Estado não deve ser um inibidor, mas sim um mantenedor da nossa liberdade. Deve dar educação sobre drogas, saúde aos que necessitam e capacidade de tratamento aos que querem tratar. Proibir só acarreta em danos à sociedade. Instiga a vontade de estar fora da lei, não passa por controle de qualidade, não especifica que droga está sendo consumida. Ou seja, o consumo não deixa de existir, apenas traz lucro para polÃticos que mantêm essa situação e serve de pretexto para criminalizar a pobreza. A legalização deve ser acompanhada de controle estatal, para que a distribuição não caia na mão de grandes empresários.
DAR — Quais são as principais realizações/atividades do Delta 9?
Delta 9 — O Coletivo Delta 9 atua com grande entusiasmo em eventos sócio-culturais, seja como organizador ou como colaborador. Recentemente, atuou como parceiro e divulgador dos eventos Reggueiro Faz Fogo – campanha para coleta de agasalhos para a distribuição no inverno e da Campanha Dia das Crianças, com a coleta de brinquedos. Estamos organizando um evento cultural, com a presença de bandas da região, para a divulgação do programa de rádio que apresentamos: Plant’a Muda, na Rádio Muda, rádio livre da Unicamp. No programa apresentamos, além de uma variedade de músicas de artistas locais e diversos, informações atualizadas e variadas sobre a temática das drogas. Além da participação na organização das 2 edições da Marcha da Maconha de Campinas, o coletivo possui em seu currÃculo a organização da DnA, Drogas na Atualidade, evento que durou 1 semana, com a apresentação diária de palestras e filmes sobre a temática drogas, legislação correspondente, riscos da drogadição, uso sacro e ritualÃstico, etc. O evento contou com a presença de Denis Burgierman, autor do livro “O Fim da Guerra”, Rodrigo MacNiven, produtor do filme “Cortina de Fumaça”, Maurides Ribeiro de Mello, Presidente da Comissão de PolÃtica Nacional de Drogas do Instituto Brasileiro de Ciências Criminais, Ras Geraldinho, fundador e lÃder da Primeira Igreja EtÃope Coptic de Sião do Brasil, a Igreja da Maconha, atualmente preso sob a falsa acusação de tráfico de drogas, entre outros. Discutimos atualmente, a segunda versão do evento.
DAR — E quanto a organização para tocar o coletivo?
Delta 9 — Nosso principal meio de comunicação é virtual, através de redes sociais e grupos de e-mail. Com uma frequência que varia entre quinzenal e mensal, nos encontramos pessoalmente para discutir os próximos passos do coletivo e dar andamento nos projetos atuais.
DAR — Além de marchas, o que pode ser feito para mudar a realidade proibicionista?
Delta 9 — Produzir contra-informação! Acreditamos que a possibilidade cibernética pode criar mais visibilidade a assuntos que a grande mÃdia não trata, ou trata com uma parcialidade extrema. Tentar criar uma criticidade com relação ao tema das drogas é algo imprescindÃvel para libertar uma população historicamente maniqueÃsta.
DAR — Quais as vantagens e dificuldades de fazer movimento em Campinas?
Delta 9 — Campinas tem mais de um milhão de habitantes, sendo maior que Florianópolis. Porém, por ser uma cidade muito dividida e não ter um centro comum, como é a avenida Paulista, em São Paulo, complica na hora da movimentação. Barão Geraldo é um distrito afastado do centro por uma marginal, e lá fica a UNICAMP, onde parte dos membros moram e onde acaba se dando a maior parte de nossas intervenções, como a semana de drogas por exemplo, que ocorreu quase totalmente na UNICAMP. Assim, uma cidade dividida como é Campinas resulta numa Marcha da Maconha de quatrocentas e poucas pessoas. Talvez se fizessemos a marcha em Barão Geraldo, ela poderia ter sido maior, mas não teria significado algum. Acho que a vantagem é que os membros estão mais próximos, por mais que Campinas seja uma cidade grande, nunca chegará aos pés do tamanho e das distâncias de São Paulo.
DAR — Como a mÃdia local trabalha a questão das drogas?
Delta 9 — A mÃdia, em geral, atua de maneira contraditória, quase esquizofrênica. Por vezes, solta matérias coerentes e realmente informativas, enquanto que em outras ocasiões, solta matérias dignas de chacota por parte das pessoas mais informadas. Compreendemos que alguns jornais não assumem uma postura contra ou a favor, sobrando a cada jornalista usar seu poder informativo de acordo com suas crenças pessoais. Entretanto, alguns jornais locais mostram tendências crescentes na divulgação de matérias pró legalização, e até nos ajudam na divulgação de nossos projetos.
DAR — Para vocês, a polÃtica de drogas brasileira é:
Delta 9 — AtrasadÃssima! Nossa sociedade é muito conservadora em relação a muitas questões. É homofóbica, racista, machista, maconhofóbica e tudo isso se reflete nos polÃticos que elegemos, e principalmente nas ruas com o preconceito diário que sofre o maconheiro, os abusos constantes por parte da policia, etc. Para que algo mude, acredito que só com uma pressão externa, como por exemplo a revisão da polÃtica de drogas que está acontecendo hoje em toda a América do Sul, o que reverbera no Brasil com o novo código penal (clique e leia uma reflexão sobre o novo código).
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