O primeiro espaço para consumo de drogas, ou “sala de shoot”, como é chamada no paÃs, promessa de campanha do presidente François Hollande, será aberto em Paris neste semestre, segundo o governo.
Ele será inaugurado nas proximidades da estação de trem Gare du Nord (de onde parte e chega o Eurostar, que liga Paris a Londres), no 10° distrito (arrondissement) de Paris.
O local irá acolher usuários de heroÃna, crack e cocaÃna, que trarão suas drogas ao local e poderão utilizá-las sem fornecer sua verdadeira identidade.
O objetivo é que as drogas possam ser consumidas em boas condições de higiene e sob a supervisão de funcionários de saúde, evitando novos casos de Aids ou de hepatite C e overdoses.
Alguns especialistas ressaltam que o fato de existir supervisão médica no momento do consumo da droga pode incitar usuários a utilizar quantidades maiores e aumenta os riscos de overdose.
O prefeito do 10° distrito, o socialista Rémi Féraud, foi o único prefeito de bairro da capital a se candidatar para a abertura do local.
Viciados em drogas, sobretudo injetáveis, costumam circular nos arredores da Gare du Nord e de outra estação de trem, a Gare de l’Est, nas proximidades. Segundo o prefeito, são “centenas de toxicômanos que vagam pelas ruas” nesses locais.
Para Féraud, o sinal verde dado pelo governo para a criação de um local de consumo de drogas “com riscos menores e enquadramento médico é uma excelente notÃcia”.
Mas muitos não compartilham do entusiasmo do prefeito. A Academia Nacional de Medicina da França, que tem como função responder a questões do governo na área de saúde pública, divulgou um comunicado reiterando sua oposição à criação de salas de consumo de drogas.
Para a Academia de Medicina, a iniciativa pode contribuir para manter o vÃcio do toxicômano em vez de tratar o problema da dependência quÃmica.
“A França já possui estruturas para viciados facilmente acessÃveis e que fornecem tratamentos de substituição à heroÃna, com a utilização da metadona”, afirma a entidade.
Essas estruturas já existentes oferecem também acompanhamento psicológico e social para os viciados inscritos.
“A medicina deve tratar e não manter as doenças. Os resultados de experiências de consumo livre de drogas em salas desse tipo em outros paÃses não permitem tirar conclusões médicas positivas”, afirma o psiquiatra Jean-Pierre Olié e membro da Academia de Medicina da França.
Segundo ele, experiências desse tipo em paÃses como a SuÃça, Holanda, Alemanha ou Canadá, não resultaram no aumento nem na diminuição do número de viciados, e também não levaram a um aumento no número de inscrições em programas de desintoxicação.
A SuÃça foi pioneira, em meados dos anos 80, na criação de locais de consumo livre de drogas.
Olié afirma ainda que a falta de uma análise mais técnica e aprofundada das drogas utilizadas no local não permitirá verificar a natureza dos produtos injetados.
Partidos da oposição de direita também criticam a sala de “shoot” em Paris, afirmando que isso “vai encorajar e banalizar o consumo de drogas e garantir assistência ao envenenamento das pessoas”.
Uma pesquisa do Instituto Ifop revela que a maioria dos franceses é contrária às salas de consumo de drogas.
Associações de moradores e de lojistas do 10° distrito de Paris também criticam a abertura da “sala de shoot” no bairro. Eles temem que o local acabe agravando o problema do tráfico e do consumo de drogas que já existe na região.
Diante de tantas crÃticas, a ministra da Saúde, Marisol Touraine, disse que o governo terá “tolerância zero” em relação ao tráfico.
“Trata-se de acompanhar os viciados e fazer com que eles encontrem profissionais de saúde e possam sair da dependência”, defende a ministra.