É positivo que, após ensaiarem um grave retrocesso na tramitação do Projeto de Lei 7.663, que trata do combate à s drogas no paÃs, integrantes do grupo parlamentar responsável pelo assunto, à frente o relator Givaldo Carimbão (PSB-AL), tenham voltado atrás em artigos que, se aprovados, fariam a luta contra os entorpecentes regredir a um patamar tão preocupante quanto indesejável. Ao menos nas discussões extra-plenário, provocadas pela pressão de setores da sociedade inconformados com a possibilidade de o Congresso aprovar um texto desconectado com a realidade, avançou-se em questões como a internação compulsória de usuários dependentes e o papel das chamadas comunidades terapêuticas na rede de tratamento. Mas ainda é preocupante o perfil do projeto que deve ir à votação nos próximos dias.
Entre outras razões porque o projeto é vago em relação à descriminalização, um caminho que em alguns paÃses levou a melhoras dos indicadores de consumo de drogas e problemas sociais dele decorrentes. O texto também caminha para deixar como está a questão da fixação do limite de uso/porte que distinga o usuário do traficante. A legislação atual é mais branda em relação ao usuário (um avanço), mas a sua tipificação, se dependente ou traficante, permanece como prerrogativa do delegado ou do juiz — nos dois casos, desprotegida de um critério nÃtido como a fixação da quantidade permitida para o consumo. Não deixa de ser um risco.
Também inquieta o fato de que uma das instâncias de interlocução com o Legislativo, a Casa Civil, tem manifestado, pela voz da ministra-chefe Gleisi Hoffman, posições que se contrapõem a visões mais modernas sobre a questão das drogas. Caso da descriminalização, condenada por ela.
Mesmo no caso das comunidades terapêuticas, as modificações no texto não contemplam a questão central — o fato de que o governo destinará a esses organismos, grande parte deles ligada a correntes religiosas, uma boa fatia do orçamento da Saúde cuja destinação mais indicada seria o sistema oficial de atendimento (SUS e redes estaduais e municipais, por exemplo). De um lado, atenuou-se o papel das comunidades no tratamento de dependentes, pois elas deixam de ficar caracterizadas como unidades de saúde, portanto sem poderem internar. Apenas darão acolhimento a pacientes crônicos. Mas, por outro, não se desanuviou a desconfiança de que o repasse de verbas atende menos a necessidades do programa antidrogas que a interesses polÃticos do governo.Nunca deve ser esquecido, na prestação de serviços por concessionário, o caráter laico do Estado.
Entre idas e vindas, o recuo em proposições que brecariam o avanço no combate à s drogas no paÃs dá esperanças de que, quando for a plenário, o texto possa ser mais aperfeiçoado. Mas a guarda não pode ser baixada. De qualquer forma, já é um passo à frente esse processo que levou à abertura de um debate em nÃvel nacional da polÃtica sobre entorpecentes.