Pronunciamento que acabo de registrar na Câmara sobre a nova lei que dispõe sobre o Sistema Nacional de PolÃticas sobre Drogas:
Senhor Presidente, Senhoras e Senhores Deputados e todo(a)s o(a)s que assistem a esta sessão ou nela trabalham:
A nova lei que dispõe sobre o Sistema Nacional de PolÃticas sobre Drogas, aprovada nesta Casa, apresentada por alguns como a “redenção da famÃlia brasileiraâ€, mereceu nossa crÃtica a partir das razões que aqui elenco, e que ofereço ao debate da sociedade:
1) O Projeto não trata apenas de cuidados de saúde e assistência social para com as vÃtimas do flagelo das drogas, mas também da questão penal e fiscal. E aÃ, em nossa visão, residem seus principais problemas.
2) O Projeto tem 2 longos artigos, o 10º e 11º, que agravam penas, caminhando no sentido do Estado Penal, em detrimento da Saúde Pública. Ali, a necessária diferenciação entre traficante, usuário e dependente diminui, podendo ficar os dois últimos na condição de cotraficantes: 4 pessoas já podem ser acusadas de constituir ‘organização criminosa’. Colocar usuário na cadeia, junto com traficantes e outros criminosos, é encaminhá-lo para a delinquência.
3) Nos artigos sobre financiamento de entidades privadas, filantrópicas, as chamadas comunidades terapêuticas, há dedução de parcelas do Imposto de Renda até mesmo para pessoas fÃsicas que apresentarem projetos de enfrentamento do problema, o que nos parece temerário em um paÃs com oportunistas de todo tipo, e que fazem até da desgraça das pessoas meio de obtenção de vantagens. O enfrentamento dessa gravÃssima questão não pode se dar pelo estÃmulo à privatização dos tratamentos e pela oficialização dos que fazem terapias de ‘cura pela conversão’, à s vezes até prescindindo do acompanhamento médico.
4) O Projeto faz clara opção de combate à drogadição pelo caminho da internação compulsória e da abstinência forçada. Sabemos que o êxito das terapias para os dependentes quÃmicos está muito vinculado ao fato deles, pacientes, se sentirem acolhidos e manifestarem conhecimento do próprio problema e vontade de se tratar. Por outro lado, é comum a opção de autoridades públicas brasileiras de fazerem polÃticas de ‘higienização’ urbana, tirando da vista dos olhos da população os segmentos que ‘incomodam’, mas sem qualquer preocupação séria com seus direitos, reinserção social e destino.
5) Recentemente foi realizado aqui em BrasÃlia um importante Congresso Internacional sobre Drogas. Destaco a intervenção de um dos participantes, Ethan Nandelmann, cientista polÃtico da ONG Norte-americana Drug Policy Alliance, publicada em O Globo de 11/05/13: “Tome como exemplo a situação do crack nas ruas brasileiras. Se você pudesse, com um estalar de dedos, eliminar o crack da sociedade, acabaria o problema social da pobreza, das pessoas que vivem nas ruas e das crianças abandonadas? Será que essas pessoas em situação de vulnerabilidade ficariam livres das drogas ou voltariam a cheirar cola e gasolina ou ingerir álcool como costumavam fazer antes? Com a diferença de que não eram criminalizadas, porque essas substâncias são lÃcitas. Internação forçada ou tratamentos involuntários não são a solução para o problema do crack. Uma boa resposta, pautada pelo respeito aos direitos humanos, está na assistência social e na saúde mental, que oferecem estratégias mais baratas e eficazes do que o sistema de justiça criminal.â€
Agradeço a atenção,
Sala das Sessões, 23 de maio de 2013.
Chico Alencar
Deputado Federal, PSOL/RJ.