A notÃcia saiu nos jornais meio na pressa, entre uma e outra fala do governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral. Mas nesta segunda-feira o negócio começou para valer: entrou em vigor o decreto que cria no Rio de Janeiro a CEIV, Comissão Especial de Investigação de Atos de Vandalismo em Manifestações Públicas.
O que o governo quer com isso?
“A comissão vai unificar o trabalho de investigação, uma vez que estavam registrados em diferentes delegacias. Ela vai dar maior agilidade e eficiência ao trabalho de elucidação de crimes e aplicação da lei. É uma resposta das forças de Segurança e do MP, que é o desejo da sociedade diante de sua perplexidade com os acontecimentosâ€, disse Cabral.
Na prática, essa Comissão reunirá membros do Ministério Público, Secretaria de Segurança do Estado e das polÃcias civil e militar para investigar casos de vandalismo e participação em manifestações. O Estado vai investigar e endurecer – esse é o recado. Cabral está preocupado com “a presença de organizações internacionais cujas redes na internet permitem um nÃvel de comunicação que não se tinha no passadoâ€.
Ao texto:
Art. 2º Caberá à CEIV tomar todas as providências necessárias à realização da investigação da prática de atos de vandalismo, podendo requisitar informações, realizar diligências e praticar quaisquer atos necessários à instrução de procedimentos criminais com a finalidade de punição de atos ilÃcitos praticados no âmbito de manifestações públicas.
“Todas as providências necessárias.†“Quaisquer atos necessários.†Não foi à toa que já chamaram essa comissão de Doi-Codi de Cabral.
Art. 3º As solicitações e determinações da CEIV encaminhadas a todos os órgãos públicos e privados no âmbito do Estado do Rio de Janeiro terão prioridade absoluta em relação a quaisquer outras atividades da sua competência ou atribuição.
Quer dizer: se um juiz tem qualquer outro pedido em mãos – habeas corpus, ação indenizatória, o que seja – ele deverá deixar de lado para autorizar quebras de sigilo e outras demandas que essa comissão exigir para investigar os atos “de vandalismoâ€. Qualquer crime investigado pela Ceiv terá prioridade em relação aos outros.
Só que isso, como me explicou o Paulo Rená (que é mestre em direito constitucional) éinconstitucional. Sim, porque a Constituição do Estado do Rio de Janeiro já determina quais serão as prioridades.
Parágrafo único. As empresas Operadoras de Telefonia e Provedores de Internet terão prazo máximo de 24 horas para atendimento dos pedidos de informações da CEIV.
A partir de agora, os cidadãos do Rio de Janeiro poderão ter seu sigilo telefônico e suas correspondências e trocas de mensagem online violadas para fins de investigação da Comissão.
Só que é crime interceptar comunicações telefônicas ou eletrônicas sem autorização judicial.
“Certamente, essa previsão de obrigação sobre as Operadoras de Telefonia e Provedores de Internet extrapola a competência legislativa do Governadorâ€, diz Rená. “É um uso muito abusivo do poder Estatal. É uma norma que só serve para ameaçar os intermediários. O decreto incita as operadoras a cometer um crime previsto em lei, e a violar a Constituição Federal.â€
Além disso, os estados não podem regular as telecomunicações. Isso é competência da União.
O decreto de Sérgio Cabral é ilegal. É inconstitucional. Ultrapassa as competências do Estado. A não ser que já estejamos Estado de Exceção – desta vez, de maneira mais descarada. Cidadãos já foram proibidos de ir e vir de várias maneiras diferentes neste último mês. O Ceiv é mais um passo nesta direção – um passo institucionalizado. “O fato é que, na prática, está instaurado um estado de exceção por esse decretoâ€, diz o jurista.
Junte isso a este relato. Aos tweets, perseguições e desaparecimentos. À sequência de acontecimentos do último mês em todo o PaÃs. Ao que foi o dia 13 de julho e ao que fizeram parecer o dia 17 de julho em São Paulo.
O Gil falou isso há cinco décadas: aqui é o fim do mundo.
Comentário por Paulo Rená
23 de julho de 2013 Ã s 5h13
Aponto rápidos elementos legais e argumentos que servem para contestar a legalidade do Decreto, que foi publicado 22/07/2013: Constituição Federal, artigos 5º, inciso XII, 22, IV, 25, § 1º, 136, § 1º, I, c, §§ 2º e 4º, 139; III, Lei Federal nº 9296/1996, artigos 1º, 3º e 10;Constituição Estadual do Rio de Janeiro, artigos 17 e 24.
1 – A previsão de obrigação sobre as Operadoras de Telefonia e Provedores de Internet extrapola a competência legislativa do Governador, pois só a União pode regular serviços de telecomunicações.
2 – A obrigação de Operadoras de Telefonia e Provedores de Internet responderem em 24 não é compatÃvel com a exigência de que haja uma ordem judicial. O decreto incita as operadoras a cometer um crime (art. 10 da Lei 9296), violando a garantia do sigilo de comunicações.
3 – Apenas é constitucional restringir o sigilo de comunicações em Estado de SÃtio ou de Defesa, que deve ser decretado pelo Presidente da República, com aval do Congresso Nacional. Assim, na prática, o decreto estabelece um estado de exceção por uma via inconstitucional.
4 – Mesmo se for observada a exigência de ordem judicial, a previsão de “prioridade absoluta em relação a quaisquer outras atividades †não está prevista na Constituição do Estado do RJ, que enumera, para o Poder Judiciário, hipóteses especÃficas em que deve haver “preferência no julgamentoâ€.
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23 de julho de 2013 Ã s 8h22
Os cariocas colocaram esse biltre corrupto no poder…merecem as suas ações desmoralizadas…quebrem tudo…ou que se danem … o RS tem um péssimo administrador…o estado esta quebrado…cada povo tem que pagar pelos seus erros…até não errar mais.
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23 de julho de 2013 Ã s 12h38
Aponto alguns dispositivos que podem ser usados formalmente para para contestar a validade do Decreto nº 44.302 do Governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral, de 19/07/2013, que foi publicado 22/07/2013: Constituição Federal, artigos 5º, inciso XII, 22, IV, 25, § 1º, 136, § 1º, I, c, §§ 2º e 4º, 139; III, Lei Federal nº 9296/1996, artigos 1º, 3º e 10; Constituição Estadual do Rio de Janeiro, artigos 17 e 24.
E aponto quatro linhas de argumentos:
a) A previsão de obrigação sobre as Operadoras de Telefonia e Provedores de Internet extrapola a competência legislativa do Governador. Primeiro, porque cabe exclusivamente à União regular o serviço de telecomunicações. Segundo, porque o Poder Executivo não tem poder para estabelecer uma prioridade para “todos†os órgãos oficiais, de forma indistinta.
b) A exigência sobre as Operadoras de Telefonia e Provedores de Internet configura um uso abusivo do poder estatal. É uma norma que só serve para ameaçar os intermediários. O decreto, ao impor um prazo de 24h para atender pedidos de informações, incita as empresas privadas a cometer um crime previsto em lei (art. 10 da Lei 9296), ao quebrar o sigilo de comunicação sem a exigência expressa de uma ordem judicial.
c) Apenas é admitido restringir o sigilo de comunicações em estado de sÃtio ou de defesa (que deve ser declarado pelo Presidente da República e ratificado pelo Congresso Nacional). Assim, na prática, esse decreto instaura um estado de exceção no Rio de Janeiro.
d) Ainda que, nesse prazo exÃguo de 24h, seja observada a exigência de ordem judicial, ao impor aos “órgãos públicos e privados no âmbito do Estado do Rio de Janeiro†uma “prioridade absoluta em relação a quaisquer outras atividadesâ€, o decreto se mostra incompatÃvel com as previsões da Constituição Estadual do RJ, a qual prevê expressamente (i) “preferência no julgamento da ação de inconstitucionalidade, do habeas corpus, do mandado de segurança individual ou coletivo, do habeas data, do mandado de injunção, da ação popular, da ação indenizatória por erro judiciário e da ação de alimentosâ€, e, ainda, que (ii) “A tortura, o tráfico ilÃcito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os crimes definidos como hediondos serão objeto de prioritária prevenção e repressão pelos órgãos estaduais e municipais competentesâ€.
(obs.: essa é uma segunda versão desse comentário, originalmente publicado aqui mesmo)