O policiamento está reforçado na manhã desta quarta-feira (14), na favela Parque Proletário, na Penha, Zona Norte do Rio, após manifestação em que três ônibus foram incendiados na noite de terça (13), como mostrou o Bom Dia Rio. Os moradores protestaram pela morte de Laércio Hilário da Luz Neto, de 17 anos. Segundo eles, o jovem trabalhava em um salão na comunidade e estava desaparecido desde segunda-feira à noite, quando teria sido abordado por policiais da Unidade de PolÃcia Pacificadora (UPP) da área.
O pai Ladilson Araújo diz que acredita nessa versão. “Perfuração não tem. Ele está alà com marca roxa no pescoço, chutes. Agora segundo informações que eu soube os próprios policiais amarraram a cara com ele, jogaram dinheiro em cima”, acusa Ladilson Araújo.
O corpo de Laércio foi encontrado no inÃcio da noite de terça-feira (13) na laje de uma casa da favela. Revoltados, os moradores protestaram nos acessos à comunidade. Três ônibus que circulavam pelo conjunto de favelas da Penha foram parados e incendiados. Dois deles ficaram atravessados na rua, dificultando a circulação de moradores e da polÃcia.
Testemunhas contaram que os veÃculos estavam cheios e que os passageiros tiveram de descer à s pressas. Ninguém ficou ferido. O fogo atingiu também a fiação elétrica e muitas casas ficaram sem luz. Durante quase toda a noite técnicos da light trabalharam nos reparos. Além dos ônibus, um carro da PM, que fica em uma das entradas da comunidade, também foi destruÃdo.
Dois dos coletivos atendiam a linha 621 (Penha-Saens Peña) e um fazia o trajeto 313 (Penha x Praça da República). Segundo a viação Nossa Senhora de Lourdes, nesta quarta-feira, os coletivos que têm ponto final dentro da “área de conflito” não estão circulando pela região. A empresa orienta que os usuários sigam até a Avenida Brás de Pina, na mesma altura, para embarcarem.
A viação Nossa Senhora de Lourdes lamentou o caso e informou que não tem como repor os coletivos por outros a médio prazo.
Durante a madrugada, policiais de outras UPPs do Conjunto de Favelas da Penha foram deslocados para reforçar a segurança no Parque Proletário. Patrulhas bloquearam as entradas. Quem chegava tinha de se identificar.
A movimentação era intensa. Agentes da Divisão de HomicÃdios fizeram perÃcia no lugar onde Laércio foi encontrado. Segundo a polÃcia, o corpo do jovem não apresentava marcas de tiros ou agressões.
O coronel Frederico Caldas, responsável pelo comando das UPPs, esteve na comunidade durante a madrugada. Ele afirmou que Laércio não foi abordado ou conduzido por policiais da Unidade de PolÃcia Pacificadora.
“Não há qualquer confirmação de que o jovem que morreu teria sido abordado por policiais militares. Com ele foi encontrado um cordão de ouro. Enfim, havia uma integridade fÃsica que evidencia claramente a ausência de sinais de violência. Somente a perÃcia pode afirmar exatamente em que dinâmica aconteceu a morte desse jovem”, disse o coordenador das UPPs.
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O desaparecimento do ajudante de pedreiro Amarildo Dias de Souza, 43, completou nesta quarta-feira (14) um mês sem qualquer avanço na investigação ou informação oficial sobre seu paradeiro. Desde o dia 14 de julho, quando foi visto pela última vez, seu nome virou um sÃmbolo da violência no Rio de Janeiro e provocou uma série de manifestações pelo Brasil e pelo mundo. Hoje, mais uma vez, familiares e moradores da Rocinha organizam a partir das 18h um protesto na comunidade para chamar a atenção para o caso.
Segundo a mulher dele, Elizabete Gomes, Amarildo foi levado por PMs da porta da casa onde o casal mora com os seis filhos até a base da UPP (Unidade de PolÃcia Pacificadora) da Rocinha, favela da zona sul ocupada em novembro do ano passado, “para averiguação”.
De acordo com o comandante da unidade, major Edson dos Santos, ele foi liberado em seguida, quando se constatou que ele havia sido confundido com outra pessoa, e deixou o local caminhando. O pedreiro nunca mais foi visto.
As duas câmeras de monitoramento da base da UPP, que poderiam confirmar a versão do oficial, não estavam funcionando naquela noite. Os equipamentos de GPS (Sistema de Posicionamento Global, por satélites) dos carros da unidade que levaram Amarildo até a base também estavam desligados. Não foi possÃvel saber, portanto, o trajeto percorrido.
A Divisão de HomicÃdios da PolÃcia Civil trabalha com a hipótese de assassinato, cometido por policiais militares da UPP ou por traficantes de drogas da região.
A repercussão do sumiço acabou arranhando a imagem da UPP da Rocinha e coincidiu com o momento de mais baixa popularidade do governador Sérgio Cabral (PMDB), que tem sido alvo de protestos quase diários.
A PolÃcia Militar também entrou na mira das manifestações. Em diversos atos, manifestantes provocaram PMs gritando “Cadê o Amarildo?”. O nome do ajudante de pedreiro se proliferou em cartazes e muros da cidade.
No dia 18 de julho, quatro policiais militares da UPP da Rocinha foram afastados de suas funções operacionais. Nas últimas semanas, houve troca de comando na corporação. Saiu o coronel Erir Costa Filho, exonerado, e entrou o coronel José LuÃs Castro Menezes.
O novo comandante da PM informou que o sumiço de Amarildo gerou investigação interna, mas disse ao UOL que não há motivo para punir policiais que levaram Amarildo.
Inicialmente sob o comando do delegado Orlando Zaccone, titular da delegacia da Gávea (15ª DP), as investigações do desaparecimento de Amarildo foram repassadas no último dia 31 para a Divisão de HomicÃdios, liderada pelo delegado Rivaldo Barbosa.
Na semana passada, o ex-delegado adjunto da 15ª DP, Ruchester Marreiros, pediu a prisão preventiva da mulher de Amarildo. Nas suas investigações, ele indicava o envolvimento do casal com o tráfico na comunidade. O relatório foi desconsiderado pelo delegado Zaccone.
Elizabete negou as acusações e disse que elas têm como objetivo desviar o foco de atenção das investigaçõessobre o desaparecimento do marido.
A mulher de Amarildo já afirmou ter certeza de que não voltará a ver o marido com vida. “Já procuramos em tudo o que é lugar e não tivemos resposta de nada. Tenho certeza de que meu marido está morto”, declarou no dia 24 de julho, quando foi recebida pelo governador Sérgio Cabral.
No último dia 5, a famÃlia pediu ao Tribunal de Justiça do Estado do Rio oreconhecimento da morte presumida de Amarildo para lavrar a certidão de óbito e para que os familiares entrem com um pedido de pensão junto ao governo do Estado.
A polÃcia também já demonstrou não acreditar que ele esteja vivo. Nos últimos dias 7 e 8, foram realizadas buscas pelo corpo de Amarildo em uma mata próxima à sede da UPP da Rocinha e no aterro sanitário de Seropédica, na região metropolitana do Rio.
Com medo de sofrerem represálias, familiares chegaram a aceitar a inclusão da famÃlia no programa de proteção a testemunhas do governo do Estado, mas recusaram dias depois, já que teriam que deixar a favela onde sempre moraram. Eles chegaram a passar um perÃodo fora da comunidade, mas voltaram no último sábado (10).
Nesta terça (13), uma irmã de Amarildo disse, em depoimento na Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro, que PMs da UPP da Rocinha intimidam os familiares que buscam respostas sobre o sumiço.
O caso também gerou reações de artistas como o ator Wagner Moura e o cantor Caetano Veloso. No sábado (10), ao receber um prêmio no Festival de Cinema de Gramado (RS), Moura cobrou esclarecimentos sobre o paradeiro de Amarildo.
No dia seguinte, Caetano mencionou o caso em sua coluna no jornal “O Globo”. No texto, o baiano classificou o sumiço do morador da Rocinha como “o acontecimento mais impactante nesse perÃodo de eventos marcantes na cidade”.
Também no domingo (11), quando se comemorou o Dia dos Pais, a Anistia Internacional promoveu na Rocinha um ato de solidariedade à famÃlia do pedreiro, com a presença da mulher e dos seis filhos dele.