Nessa quarta-feira, 19, o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) protocolará um projeto de lei que, entre outras importantes mudanças na polÃtica de drogas do Brasil,
O projeto foi elaborado com a participação e colaboração de diferentes entidades, especialistas na matéria e militantes dos movimentos sociais que lutam por mudanças nas polÃticas de drogas e contribuÃram na construção da proposta que Wyllys apresenta hoje ao Congresso, esperando que seja o pontapé inicial de um amplo debate social que começa, mas não acaba com essa proposta.
Na justificativa do projeto, o deputado explica que «o projeto não pretende “liberar†o comércio da maconha, mas regulá-lo. Aliás, ele está, hoje, na prática, “liberadoâ€, assim como o comércio de todas as outras drogas atualmente proibidas. Existe, por um lado, uma legislação que o proÃbe e o criminaliza, cuja ineficácia prática é incontestável, e por outro lado, todo um sistema de produção e comercialização da maconha que funciona, sem qualquer impedimento, no mundo real. Isso é fato. Com independência da ação punitiva do Estado, esse sistema continua funcionando e cada pessoa que é presa ou executada sem direito de defesa pela polÃcia ou por uma facção rival — quase sempre pobres, favelados e na maior ia dos casos jovens e negros; quase sempre aqueles que têm a menor responsabilidade e os menores lucros, na ponta — é substituÃda por outra sem atrapalhar ou impedir a continuidade do circuito. Milhares de pessoas morrem por causa disso, milhares vivem armadas, clandestinas, exercendo a violência, muitas são presas e, na cadeia, submetidas a condições desumanas e a situações de violência idênticas ou piores à s que sofriam em “liberdadeâ€, mas o sistema continua funcionando. O Estado “regula†esse sistema de maneira informal e clandestina, através de uma rede de cumplicidades que envolvem as forças de segurança e os poderes públicos. E a maconha (como as outras drogas atualmente ilÃcitas) é importada, plantada, produzida, industrializada, vendida e comprada de forma ilegal sem que o Estado consiga, em momento algum, que isso deixe de acontecer, como não conseguiram as legislações contra o álcool, nos EUA, que o uÃsque deixasse de ser produzido e vendido, mas, ao colocá-lo na ilegalidade, fomentaram a criação de um circuito de violência (e a falta de controle de qualidade do produto, com graves consequências para a saúde pública) que só foi superado com a legalização, admitido o fracasso absoluto da mesma polÃtica que depois foi ressuscitada para seu uso com outras drogas semelhantes ao álcool, que foram convenientemente cercadas de pânico moral e estigmatização, em muitos casos por motivos raciais ou polÃticos».
«O comércio da maconha funciona, na prática, sem controle. Ninguém sabe a composição dos produtos que são vendidos, sua qualidade não passa por qualquer tipo de fiscalização nem precisa se adequar a nenhuma norma, o consumidor não recebe qualquer tipo de informação relevante para a sua saúde e segurança, diversos processos de industrialização (como o prensado de maconha para fumo com amônia, altamente tóxica) são realizados sem qualquer fiscalização. Não há restrições à venda que impeçam o acesso dos menores de idade a esse comércio ilegal — seja como compradores, seja como vendedores ou “soldados†do tráfico — e tudo isso funciona sob o império da violência, das guerras de facç&oti lde;es, da corrupção e brutalidade policial e do descaso e/ou da impotência do poder público. A proibição não acabou e nem acabará com o comércio ilegal de drogas, mas produz outros efeitos, infinitamente piores do que aqueles que diz combater ou prevenir», ressaltou Wyllys.
No mesmo sentido, o deputado explica que «este projeto de lei propõe regras para a produção e comercialização da maconha baseadas em critérios técnicos e cientÃficos, bem como nas experiências de polÃticas públicas que foram bem sucedidas em outros paÃses. E seu efeito não será o aumento ou a redução da quantidade de usuários ou de comerciantes, nem do volume da maconha comercializada, mas incidirá, sim, e positivamente, na sua qualidade, porque a Cannabis, derivados e produtos de Cannabis deverão ser elaborados de acordo com determinadas normas e serão fiscalizados; haverá condições e restrições para sua produção e comercialização, se estabelecerão regras semelhantes à s que regulam o comércio legal de álcool e tabaco; se cuidará da segurança pública, facilitando a redução da violência e da criminalidade e se protegerá a saúde dos usuários, dando a eles a informação sobre aquilo que estão consumindo; além de trazer outros benefÃcios, como o recolhimento de tributos».
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O projeto também propõe uma série de medidas para acabar com uma polÃtica que só tem produzido morte, violência e criminalização da pobreza. Ele dispõe uma anistia geral para “todos que, antes da sanção da presente lei, cometeram crimes análogos aos previstos na nova redação estabelecida para o artigo 33 da lei 11.343, de 23 de agosto de 2006, sempre que a droga que tiver sido objeto da conduta anteriormente ilÃcita por elas praticada tenha sido a Cannabis, derivados e produtos de Cannabisâ€, excluindo desse benefÃcio as pessoas que tenham praticado qualquer crime violento, mas oferecendo à queles que foram condenados apenas pelo comércio de substâncias ilÃcitas a possibilidade de reinserção na legalidade como parte de uma polÃtica “de transição†entre o velho e o novo regime.
Por isso, o projeto também estabelece que aqueles que atualmente se dedicam ao comércio de drogas ilÃcitas — que, na maioria dos casos, inclui outras drogas além da maconha — mas ainda não foram acusados, indiciados, processados ou condenados por esses crimes, tenham a possibilidade de sair da “clandestinidade†e se inserir no mercado legal da Cannabis, abandonando a comercialização de outras substâncias ainda ilÃcitas, adequando-se em tudo à lei e à s regulamentações que forem ditadas pelo Executivo e transformando-se em empreendedores de uma atividade legal.
«O Brasil precisa mudar o paradigma, porque as polÃticas atuais jamais surtirão efeito, como hoje não surtem. Se avaliarmos a eficiência dessas polÃticas em relação ao dinheiro empregado nelas e os danos terrÃveis que causaram, o erro fica evidente», afirmou o deputado.
TEXTO DO PROJETO:Â http://jeanwyllys.com.br/wp/wp-content/uploads/2014/03/SISTEMA-NACIONAL-DE-POLITICAS-PUBLICAS-SOBRE-DROGAS_versao-final_18-03-2014.pdf
Informações: ascom@jeanwyllys.com.br ou (61) 3215-5646.
[youtube]https://www.youtube.com/watch?v=aRePS3PCsvk[/youtube]
Autor da proposta, Jean Wyllys diz que objetivo da “anistia†é diminuir a população carcerária, com mais de 100 mil presos por tráfico. Detidos por comércio de outras drogas permaneceriam na cadeia
O projeto que legaliza o consumo de maconha, apresentado nesta quarta-feira (19) pelo deputado Jean Wyllys (Psol-RJ), também perdoa os traficantes da droga. Pela proposta, presos condenados pelo comércio de outras drogas, como cocaÃna, crack e LSD, por exemplo, continuariam na cadeia. Não é possÃvel saber com exatidão quantas pessoas poderão se beneficiar do projeto caso ele seja aprovado. Hoje, existem no Brasil 131 mil pessoas presas por tráfico, independentemente do tipo de droga comercializada.
O Projeto de Lei 7270/14 prevê anistia para quem foi condenado por venda da maconha. A medida vale para as condenações anteriores à aprovação da lei. Segundo o texto, o perdão é para “todos que, antes da sanção da lei, cometeram crime previsto na lei antidrogas, sempre que a droga que tiver sido objeto da conduta anteriormente ilÃcita por elas praticada tenha sido a cannabis [nome cientÃfico da planta], derivados e produtos da cannabisâ€.
Em entrevista ao Congresso em Foco, Jean disse que a soltura do traficante é uma questão de coerência. “Se a venda for legalizada, não faz sentido a pessoa continuar presa. A gente precisa ser uma sociedade solidária, discutir. Nós temos a quarta maior população carcerária do mundoâ€, disse ele hoje.
Segundo o deputado, pobres e negros são os principais integrantes das cadeias. “Precisamos acabar com isso de punir pobres e negros, principalmente jovens, moradores de periferias das grandes cidades, que são aliciados pelo tráfico e presos por portarem quantidades de maconha. Eles são jogados em celas, num sistema carcerário desumano.â€
População contra
De acordo com levantamento da empresa Expertise, divulgado no final do mês passado, 81% dos brasileiros são contra a legalização da maconha e 19%, favoráveis. Os números são semelhantes aos da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), apurados em 2013, que apontaram 75% da população contrária à liberação do entorpecente.
Porém, a Expertise anotou que 57% dos brasileiros são favoráveis ao uso medicinal da maconha.
Segundo lugar
Tráfico de drogas é o segundo principal motivo de prisões no Brasil, perdendo apenas para crimes contra o patrimônio, como roubo e estelionato. O último levantamento do Departamento Penitenciário Nacional (Depen), de 2012, mostra que venda de drogas ilÃcitas é o motivo da prisão de 25% das 548 mil pessoas que formam a população carcerária.
Destes, 131 mil cometeram tráfico comum e 6.800, internacional. Entre os traficantes detidos, 123 mil são homens e 15 mil mulheres.
Saiba mais: Por quais crimes eles estão presos
O projeto de Jean Wyllys tem exceções. Os presos por tráfico internacional de drogas não poderiam ser beneficiados pela anistia. Também estariam fora quem for processado por crimes praticados com violência, grave ameaça ou emprego de arma de fogo.
Perdem ainda a anistia quem cometer crimes valendo-se de cargos públicos ou no desempenho de missão de educação, poder familiar, guarda ou vigilância. Se houver envolvimento de criança, adolescente ou pessoa com menor capacidade de entendimento, também não se admite o perdão da pena.
Segundo projeto este ano
A proposta para legalizar a maconha é a segunda apresentada este ano na Câmara. No mês passado, o deputado Eurico Júnior (PV-RJ) protocolou texto sobre o mesmo assunto. A principal diferença entre os dois são as quantidades que podem ser produzidas de forma caseira e a previsão de produção em larga escala.
O projeto do deputado Jean Wyllys permite uma grande plantação de maconha desde que inspecionada e fiscalizada pelo Ministério da Agricultura.
Também há variação na quantidade de pés que podem ser cultivados em casa. A proposta de Eurico Júnior permite, no máximo, seis pés da planta por residência. O de Jean Wyllys legaliza a produção de 12 pés por pessoa em cada casa: seis pés maduros e seis verdes. Se a produção passar de uma dúzia de plantas, é necessária comprovação de que a quantidade de plantas é proporcional ao número de residentes no local. Os dois projetos preveem o máximo de 480 gramas para a produção caseira.
Fora da inspeção
Pelo texto de Jean Wyllys, a cannabis, nome cientÃfico da maconha, deixa de integrar a lista de substâncias e medicamentos sujeitos à inspeção da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa). Passa a fazer parte da mesma lei que regulamenta o uso de cigarros e bebidas alcoólicas. O projeto define como Cannabis toda a parte da planta, em crescimento ou não, as sementes da mesma, a resina extraÃda de qualquer parte da planta, e todo o composto, manufatura, sal, derivados, mistura ou preparação da planta.
O texto mais recente, como o anterior, legaliza e regulamenta o cultivo e uso em associações. Os clubes de autocultivadores deverão ter um máximo de 45 sócios. Poderão plantar um número de plantas proporcional ao número de sócios, o que equivale a um máximo de 540 plantas de Cannabis para clubes de 45 sócios, sendo 270 plantas maduras e 270 plantas imaturas, e obter como produto da colheita da plantação um máximo de armazenamento anual proporcional ao número de sócios, que não poderá exceder 21,6 kg anuais.
No Senado
O Senado também terá de discutir o assunto nos próximos meses. O senador Cristovam Buarque (PDT-DF) apresentará, na Comissão de Direitos Humanos e Legislação Participativa, parecer a uma proposta que libera o uso recreativo, medicinal ou industrial da droga.
A sugestão chegou ao Senado por meio do portal da Casa recebeu mais de 20 mil manifestações de apoio. Caberá ao relator opinar pela rejeição ou pela transformação da proposta em projeto de lei.
O texto sugerido aos senadores prevê que o consumo da maconha seja legalizado, a exemplo do que ocorre hoje com bebidas alcoólicas e cigarros. Estabelece, ainda, que seja considerado legal “o cultivo caseiro, o registro de clubes de cultivadores, o licenciamento de estabelecimentos de cultivo e de venda de maconha no atacado e no varejo e a regularização do uso medicinalâ€.
Cristovam pediu um estudo a consultores do Senado para saber como andam os processos de legalização da maconha em outros paÃses, quais são os impactos cientÃficos e econômicos da medida, seus benefÃcios e custos. O estudo também deve indicar se a liberação contribui para o aumento ou diminuição do consumo da droga.
Em maio do ano passado, a Associação Brasileira do Estudo do Ãlcool e outras Drogas (Abead) se posicionou, pela primeira vez, contra a legalização da maconh, em um relatório entregue ao chefe da Secretaria Nacional de PolÃticas sobre Drogas (Senad), Vitore André ZÃlio Maximiano. De acordo com a entidade, em sete paÃses, a liberação da droga causou mais prejuÃzos (aumento do consumo e diminuição da idade de experimentação, por exemplo) que benefÃcios, como a queda no número de prisões e o crescimento da busca por tratamento.
Uruguai
Em dezembro do ano passado, o Senado uruguaio aprovou a legalização da produção, distribuição e venda da maconha sob controle do Estado. Pela lei uruguaia, o usuário pode comprar até 40 gramas de maconha por mês, em farmácias, e cultivar até seis pés da erva individualmente.
Esse número sobe para 99 plantas caso os usuários se reúnam em clubes com 15 a 45 integrantes. O governo do paÃs vizinho defende a medida como forma de reduzir o poder do narcotráfico e a dependência dos uruguaios de drogas mais pesadas.
Traficante e usuário
A chamada Lei Antidrogas (11.343/2006) proÃbe o uso de substâncias entorpecentes, “bem como o plantio, a cultura, a colheita e a exploração de vegetais e substratos dos quais possam ser extraÃdas ou produzidas drogasâ€. A lei estabelece punições diferentes para usuários e traficantes. Quem for flagrado comprando, guardando ou transportando droga para consumo pessoal está sujeito a advertência, prestação de serviço à comunidade e a medida educativa de comparecimento a programas ou cursos.
Já os traficantes podem ser condenados de cinco a 15 anos de prisão, além do pagamento de multa. Cerca de 25% dos 548 mil presos brasileiros estão privados da liberdade por terem sido enquadrados no crime de tráfico de drogas. A lei, no entanto, não estabelece critérios objetivos para diferenciar o usuário do traficante. A decisão cabe ao juiz.