“Ninguém será arbitrariamente preso ou detido.†– Artigo 9 de uma antiga fábula chamada Declaração Universal dos Direitos Humanos.
Na noite de 1 de julho de 2014, ocorreu na Praça Roosevelt, centro de São Paulo, o Debate Democrático pela Libertação dos Presos PolÃticos. Conforme a organização do ato, não haveria “passeata, mas uma plenária ampla para arregimentar apoio à luta contra as prisões polÃticas.†O objetivo do encontro era, portanto, apenas o debate, sobre os seguintes eventos recentes: tentativa da PM de impedir a realização de uma passeata, por não haverem “lÃderesâ€; coerção para depoimento de 22 militantes do MPL no DEIC; demissão de 42 metroviários no exercÃcio de seu direito de greve; mandado de busca e apreensão emitido contra 57 ativistas; prisão e tortura de militantes dentro da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo; intimidação de integrantes do coletivo Território Livre, na Praça Roosevelt, por dezenas de soldados da tropa de choque.
Antes mesmo do inÃcio do debate, a praça já se encontrava totalmente sitiada pelas seguintes forças militares: polÃcia militar ordinária, cavalaria, tropa de choque, Rocam e “tropa do braçoâ€. O cerco pode facilmente ser verificado no mapa abaixo:
O local e todos os acessos a ele encontravam-se sob controle completo da PM, de modo que para se aproximar dali era preciso submeter-se à revista pessoal, apresentação de documentos e fornecimento de dados pessoais. Uma situação em que o livre direito de manifestação foi completamente restringido pelo Estado, sem qualquer justificativa para a flagrante desproporção entre o efetivo da PM e a população.
Evidentemente, tal efetivo estava ali para garantir que o ato fosse esvaziado pela intimidação. A perversidade do Estado mais uma vez deixou a todos perplexos com um controle social em tudo injustificável, no impedimento do exercÃcio de reunião, manifestação e liberdade de pensamento.
A única manifestação a que de fato assistimos foi a ingerência de um corpo absolutamente estranho à praça pública – a PM – no espaço historiacamente consagrado para o debate e manifestação da opinião. Um espaço, portanto, que tem sua razão de ser na Sociedade Civil, e não na corporação militar – para a qual existem os quartéis. Nesse cenário claramente contraditório do Estado Democrático de Direito, atuavam os coletivos OL (Observadores Legais) e Advogados Ativistas, ambos convidados a participar do debate.
Em dado momento, alguns OLs constataram a presença de diversos soldados do choque sem a devida identificação – inclusive uma tenente, no comando da tropa. As filmagens iniciaram-se já com o questionamento da PM, que logo em seguida questionou também a validade dos documentos pessoais apresentados e, finalmente, o uso do espaço público, sem nenhum critério lógico ou legal.
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“A tenente já veio pra cima de mim me enforcando e quase quebrando meu pulso. Quando me levaram para perto da viatura eu vi que o outro detido era nosso companheiro, o advogado Daniel Biral, que estava no camburão sendo agredido por diversos policiais. Ele estava algemado, gritando e se debatendo na tentativa de se defender.†Silvia Daskal, Advogada Ativista detida.
“Quando fui retirado do local ninguém me informou porque eu estava sendo preso ou pra onde seria levado. Antes de entrar no camburão os policiais começaram a me bater. Eles me deram uma gravata e levantaram minhas pernas, em dado momento cai no chão e acabei sendo arrastado até a viatura. Já no camburão tentaram me algemar e impediram que entrasse em contato com a Comissão de Prerrogativas da OAB. Quando cheguei ao 4DP, os policiais abriram a porta da viatura e mais uma vez começaram a me espancar. No terceiro soco eu desmaiei e fui arrastado para delegacia. Quando acordei não sabia sequer onde estava.†Daniel Biral, Advogado Ativista detido.
Delegacia –  foi recusado pelo delegado de plantão que os advogados fizessem a identificação dos policiais que os prenderam e os agrediram. O delegado também se recusou a lavrar o boletim de ocorrência de abuso de autoridade e lesão corporal em 3 advogados. No entanto, já estamos trabalhando para tomar as medidas cabÃveis através de outros meios.
É absolutamente inaceitável a conduta da PolÃcia Militar, que em nada se ajusta aos interesses da Sociedade Civil em situações como a que assistimos hoje. Mais uma vez, um verdadeiro “espetáculo†de ilegalidade e truculência, repleto de excessos: revista vexatória e sem fundada suspeita; detenções arbitrárias; negação de informações sobre os motivos das detenções ou para quais delegacias seriam levados os detidos; desrespeito à s prerrogativas dos advogados; agressão fÃsica; uso desproporcional da força, com uso de bombas e spray de pimenta, em total desacordo com o manual da PM; linguagem provocativa; falta de identificação; agressão verbal; arma letal em punho durante a ocorrência.
Tudo isso, tudo estranho e já normal, em plena praça pública.