por Urubatan Nery de Castro
Será que a face ambiental da polÃtica proibicionista pode estar sendo mascarada para que o senso comum continue pensando nelas como um inimigo interno a ser combatido e erradicado através de bordões do tipo “a maconha é a porta de entrada para outras drogasâ€, “o que será da nossa juventude?â€, “quem vai pagar a conta dos viciados?â€, “diga não à s drogasâ€, “viciados financiam a violênciaâ€, “punição severa para traficantesâ€, “o usuário é o câncer da nossa sociedade†ente outras?
A produção de drogas tem um alto custo ambiental. Argumenta-se que esse custo seria muito maior se não fossem os programas de erradicação e as duras medidas repressivas e punitivas que impedem os produtores de drogas de expandir suas operações. Mas esse argumento revela um ocultamento intencional para as evidências que se apresentam. As intensas pulverizações aéreas e os programas de erradicação não reduziram os prejuÃzos ambientais que resultam da produção desregulada de drogas. Eles têm apenas transferido esses danos para áreas mais remotas e sensÃveis ecologicamente como a floresta Amazônica, uma consequência do “efeito-balãoâ€.
Contrariamente à s afirmações dos agentes oficiais da lei, é a própria guerra à s drogas que está provocando devastação ambiental decorrente das técnicas de produção clandestina. As medidas atuais de controle de drogas, sem supervisão regulatória adequada, caÃram nas mãos de criminosos sem escrúpulos. Diante disso, será que a produção de drogas deve continuar a ser conduzida clandestinamente, levando ao despejo de resÃduos quÃmicos perigosos e danos a importantes ecossistemas?
Durante o planejamento, implementação e avaliação dos programas de erradicação da droga em nÃvel internacional devem ser levados em consideração os impactos sociais, ambientais, econômicos e na saúde decorrentes das ações desses programas. O UNODC (Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crimes) deve adotar diretrizes ambientais para as equipes. Todos os impactos da polÃtica de drogas devem ser avaliados em conjunto com uma gama de sistemas alternativos, como por exemplo, a descriminalização para posse pessoal de drogas, modelos legais e eficientes de regulação e legalização, reforma agrária, investimentos pesados em prevenção, educação e saúde, autocultivo para cultivar o dissenso e produzir novos sentidos existenciais indo contra o sistema estabelecido. Sempre fornecendo orientação sobre as melhores maneiras de avançar sobre essa questão de uma forma menos violenta e autoritária e mais respeitosa.
A demanda pelo consumo de drogas sempre existiu na história humana e nunca deixará de existir, por isso é um mercado extremamente rentável. A polÃtica de proibição, fundamentada em princÃpios moralistas e fundamentalistas, pelo visto, vem contribuindo para a concentração de poder e riqueza nas mãos de uma minoria, seja da elite banqueira e polÃtica, seja nas mãos dos grandes cartéis e monopólios criminosos. A proposta antiproibicionista, fomentada neste trabalho, deve ser uma tomada de consciência que pretende questionar o modelo de sociedade e de ambiente que queremos a partir das mazelas observadas no cotidiano rural e urbano decorrentes de uma polÃtica autoritária.
Ora, não seria a própria proibição e o mercado criminal que estariam aumentando e espalhando os prejuÃzos? O que ou quem seriam os responsáveis por levar à criação de drogas mais letais como o crack e o encarceramento em massa com superlotação dos presÃdios? Os últimos cinquenta anos de proibição e guerra à s drogas foram totalmente contraproducentes em suas tentativas para conter os danos ambientais causados ​​pelo comércio ilegal. Mais florestas equatoriais foram desmatadas ilegalmente para produção da droga, mais poluição de córregos em nascentes de rios, mais terror para as populações pobres e negras das periferias metropolitanas e para os pequenos camponeses pobres, negros e indÃgenas nas terras do agronegócio ilÃcito.
Reforçamos que a proposta antiproibicionista na perspectiva ambiental deve ser também uma proposta antirracista e anticapitalista. Destarte, ao promover o controle e a regulamentação da cadeia produtiva das drogas, essa proposta deve incluir em seu escopo a situação de vulnerabilidade socioambiental de grupos perseguidos culturalmente, as condições de miserabilidade impostas pela polÃtica de erradicação aos campesinos nas áreas de plantio, a necessidade de uma reforma agrária que atenda aos interesses dos pequenos agricultores e não do grande capital, e por fim, a substituição dos cartéis e monopólios criminosos que controlam a economia da droga por associações e cooperativas de pequenos produtores. Sempre lembrando que não existe uma maneira mais ou menos correta de lidar com a questão, mas sim através de tentativas, erros e acertos.
A maioria dos documentos pesquisados nesse trabalho está impregnada de evidências e referências sobre a urgência de uma nova abordagem para a atual polÃtica de drogas, tornando-se mais esclarecidas questões que o senso comum trata com moralismo, estereótipos e tabu. Para uma visão crÃtica do ambiente é fundamental a análise da realidade em suas múltiplas determinações. Fica claro que, para um futuro próximo, a pobreza e a desigualdade nas regiões que cultivam a droga para suprir a demanda do mercado signifiquem a existência de muitos agricultores dispostos a plantar drogas e outros dispostos a comercializá-las. O ambiente, entendido como uma rede de relações, pode ter influência na tomada de decisões e escolhas de um indivÃduo ou grupo de pessoas ou ser afetado por essas decisões.  De qualquer forma a guerra à s drogas é uma escolha polÃtica e existem outras opções que devem ser debatidas e exploradas usando as melhores análises e evidências possÃveis.
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*Esse texto é a conclusão da monografia de pós-graduação do pesquisador Urubatan Nery na Universidade Católica de Petrópolis. Leia o artigo completo fazendo o download no link: Impactos do proibicionismo no ambiente – Urubatan Nery