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Julho 25, 2014

Crimes Fantasma! A quem os ativistas lesaram?

Oximity

Texto: Thiago H. M. Guimarães Corrêa

Sobre a prisão dos 23 presos políticos no Rio de Janeiro, neste sombrio Julho de perdas intelectuais e democráticas, vale uma investigação sobre os instrumentos teóricos da repressão, utilizadas pelo Ministério Público na acusação destes cidadãos. Por que foram eles presos, se só violaram entes imateriais como fantasmas, imaginários como o medo e o alarde?

Não há crime sem lesão. O Estado pune quando a ele se provam as lesões, mas não se pode convencê-lo a punir por mero jogo de palavras, diálogos ou declaração de intenções. Se intenção bastasse, magia negra seria crime. Lesões são alterações no mundo físico: um corte, uma queimadura. Deixam vestígios, sempre, por mais que algumas vezes não possamos encontrá-los.

Mas há um crime que foge a essa regra, é utilizado para perseguição política e – más notícias – ele se consolidou como bálsamo salvador da nossa sociedade, porque prende traficantes, considerados inimigos número um da sociedade, e promove a perseguição (também política) dos jovens negros e pobres.

O nome desse crime é… “288 Formação de Quadrilha”, como cantou Marcelo D2.

Todavia, mudou de nome em 2 de Agosto de 2013, logo após o Junho de protestos, para disfarçá-lo mais ainda aos olhos do cidadão; para o seu branding, seu nome, ficar mais amplo, porque formação de quadrilha soa muito bem para favelados ou colarinho branco, mas não para cidadãos de classe média que foram às ruas. Passou a ser chamado de Associação Criminosa, ainda no mesmo artigo 288 do Código Penal.  E piorou seu conteúdo.

Antes da lei nº 12.850 de 2 de Agosto de 2013, era necessário um mínimo de quatro pessoas. Agora, conta-se a partir de 3 o número de integrantes. Em um crime que não deixa vestígio, porque se consuma quando as pessoas manifestam sua intenção de delinquir.

Nas faculdades de Direito aprende-se que cada crime ou conjunto de crimes servem para proteger um determinado “bem jurídico” específico. Para descobrir o bem jurídico é fácil, basta olhar no Código Penal em qual título do livro ele se insere. Assim, roubo e furto são crimes diferentes, mas ambos se inserem no Título II – Dos crimes contra o patrimônio, e o bem jurídico que estes crimes protegem é o patrimônio, um bem material que pode sofrer ações físicas humanas, portanto, deixa vestígios.

Já o crime de Associação Criminosa (ex-Formação de Quadrilha) se insere no Título IX – dos crimes contra a Paz Pública, sendo a Paz Pública o “bem jurídico” protegido de sofrer violações ou alterações pela ação física humana.

Mas, espera aí..? Como alguém pode atingir fisicamente a Paz Pública? Paz é um sentimento, que pertence a nossa mente (intenção), e não faz parte do mundo físico. O mau humor que leva uma pessoa a chutar um objeto não está no mundo material, o que estão são o objeto e o movimento da perna. Paz Pública é, portanto, um engodo, um instrumento de enganação que Luis Greco, professor assistente de Claus Roxin, chama de… pseudo bem jurídico. Paz Pública é uma construção somente conceitual, não física, de palavras, não de átomos, que serve de contraponto à criminalização de intenções, subjetividades e opiniões.

Aqui fica interessante entender como esse crime que se presta apenas a negar os princípios básicos de Direito Penal pôde ter sido usado para as prisões políticas feitas no Rio de Janeiro, depois do power-up que conscientemente lhe foi dado no ano passado. O que já era ruim ficou pior, e agora os acusados de violar o sentimento de paz coletiva, ou seja, violar “Paz Pública” dos cidadãos estão encarcerados. Talvez o juiz devesse saber que o público não é sentimental e não ficou magoado com os professores de Filosofia encarcerados.

Todos eles agora em Bangu, sem ter provocado dano a coisa alguma, por força do Efeito Minority Report, que Leonardo Sakamoto apontou bem em seu blog.

Atrocidade não é surpresa na Justiça brasileira. Quando Marcha da Maconha era considerada crime de Apologia ao Crime, o vereador Renato Cinco foi preso por  Apologia ao Crime de Apologia ao Crime (!!!), quando distribuía panfletos com a data de realização da marcha. Um efeito circular que à época eu batizei de Efeito Inception – o Direito se tornando digno de filmes de fantasia.

Agora, a circularidade volta à tona, pois o crime é que:

1. Formação de Quadrilha: há uma quadrilha com objetivo de cometer crime específico.

2. O crime específico que a quadrilha pratica é Incitação ao Crime.

3. O crime incitado pela quadrilha é o crime de Formação de Quadrilha.

Uma circularidade engenhosa, mas que parte do princípio de que há uma quadrilha a priori. Isso é a perseguição política. Pedir, por princípio, que um grupo seja considerado criminoso. Daí derivando a circularidade do argumento. Paradox! –exclamaria Arthur em Inception.

Depois de estabelecido o argumento, expede-se mandados de prisão temporária “para investigar”, com fundamento na absurda herança deixada pelo presidente José Sarney em 1989, a Lei de Prisão Temporária, lei 7.960/89, que traveste de Direito Processual Penal a perseguição política digna da Inquisição da Idade Média.

No meio do caminho, procura-se desviar os holofotes e criar pseudo fundamentos ou factoides que desviem os olhos do argumento circular: uma arma com registro vencido do pai de uma adolescente é considerada pertencente à jovem, como se esta pudesse comprar armas legalmente. Diga-se, todos os crimes que envolvem o simples “portar” são violadores do princípio da lesividade, a primeira lição de Direito Penal. Crimes que se consumam com o simples portar não constituem ações lesivas que causam alteração em um ente concreto, feito de matéria. Aliás, o crime de Incitação ao Crime também viola o pseudo bem jurídico da Paz Pública. Um detalhe teórico que vira avalanche política.

Na denúncia do ilustre promotor de Justiça, causa certo estranhamento quando desenha assim a suposta organização dos acusados: uma organização central (autor intelectual) com vários tentáculos, sendo que cada tentáculo (sub-grupo) não se conhece entre si. Causa estranheza, porque o que caracteriza o crime de Associação Criminosa (ex-Formação de Quadrilha) é justamente o fato de haver ligação subjetiva entre as pessoas. Devem se conhecer, interagir, planejar e executar conjuntamente. Por que então o promotor faz isso? Por que diz que os sub-grupos não se conhecem? Vejamos o que escreveu:

Note-se que, dada a estrutura pulverizada da organização, não é possível estabelecer, por muitas vezes, o liame entre integrantes de diversos subgrupos – que podem sequer se conhecer. A existência, todavia, de um comando centralizado e a convergência de desígnios existente entre os integrantes das diversas estruturas orgânicas permite o reconhecimento da associação entre todos, ainda que de forma compartimentalizada, passando-se, a seguir, a especificar a conduta dos denunciados e a estrutura dos grupos.

Estaria o exame para ingressar no Ministério Público mais fácil? Estaria aprovando candidatos que desconhecem o crime de Associação Criminosa? Por um minuto, pensei que sim. Mas me enganei. O buraco é mais embaixo e o expediente é o seguinte: dizer que cada tentáculo (sub-grupo) era organizado em núcleos de 4 pessoas. O crime de Associação Criminosa se consuma em cada sub-grupo, e não apenas na articulação dos diversos sub-grupos, feito pela “cabeça”, pela autoria intelectual. It’s a trap!

Note que o promotor ainda se deu ao requinte de sagacidade de observar o crime em sua forma antiga, quando era necessário haver 4 pessoas, não 3. Vai que a lei nova, mais maléfica, é declarada inconstitucional! Ou a defesa alega que os acusados atuavam desde antes da alteração legislativa! Neste caso –todos sabem– a lei nova, mais maléfica, não retroagiria. Estariam absolvidos. Antevendo essa possibilidade, o excelentíssimo promotor observou o limite mínimo de integrantes da lei antiga. Um requinte de intelectualidade! O Ministério Público não aprova incompetentes em seus quadros.

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