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Fevereiro 10, 2015

Somos tod@s traficantes: pela liberdade dos cultivadores e demais presos pela guerra às drogas

montag600

COLETIVO DAR

A recente onda de prisões de cultivadores de maconha no Rio de Janeiro tem agitado o debate nas rodas esfumaçadas Brasil afora. Entre os presos na Operação do Leme ao Pontal, realizada na semana passada, está Flávio Dilan, que sofre de epilepsia e planta o seu remédio (cannabis) em casa. Enquanto uns defendem a liberdade imediata dos jardineiros, outros acreditam que eles assumiram o risco ao realizarem uma atividade (ainda) ilegal. E de que lado nós sambamos? Como não poderia ser diferente, abraçamos a liberdade e levantamos o dedo do meio ao proibicionismo.

Os cultivadores de maconha não podem seguir encarcerados, da mesma forma que todos os demais presos por esse nefasto moinho de moer gente chamado “guerra às drogas”. Afinal, estão todos lá por culpa de uma lei absurda que classifica certas substâncias como ilegais e, na prática, acaba por classificar pessoas como “traficantes” e “usuários”. Aos primeiros: jaula, bala de fuzil, uma vala comum. Aos segundos: tratamento médico, bíblia na cabeça, internação.

Como toda guerra, a contra as drogas se sustenta sobre a ideia de que há um inimigo a ser combatido. Já que substâncias inanimadas (mas de valor inestimável <3) não dão lá um bom inimigo aos olhos de quem tem mais de dois neurônios, aquilo que deve ser combatido foi personificado na figura do "traficante". Dessa forma, acusadas de fazerem parte do temido "tráfico", populações indesejadas são controladas ao longo da história. Representou ameaça à ordem? Desagradou o rei? Enquadra como traficante e mete na masmorra. No imaginário popular, o traficante é violento, inescrupuloso e, geralmente, morador de periferia. No entanto, se você levar em conta que todos os envolvidos com a economia das drogas podem ser enquadrados como "traficantes" na letra fria da lei e no bafo quente do delegado, percebe-se que o termo serve apenas para obscurecer o debate em torno da complexa economia das drogas, que abarca usuários, cultivadores urbanos, camponeses, atacadistas, mulas, vendedores varejistas (de todas as classes), endoladores, fogueteiros, falcões, aviãozinhos, gerentes, donos de boca, policiais e políticos corruptos, contadores, advogados, comerciantes e bancos lavadores de dinheiro. Quem ganha é o proibicionismo, pois têm suas classificações obscurantistas reproduzidas por aqueles que lutam pela sua extinção e, de quebra, esconde quem realmente lucra com a proibição.

Jardineiro é traficante? Sim! – tod@s somos

Enquanto a guerra trabalha com a lógica de classificar pessoas e drogas dividindo-as entre boas e más, nós que lutamos pelo seu fim não podemos deixar de refletir até que ponto não reproduzimos essa dicotomia ao adotarmos discursos que buscam segregar em grupos os atingidos pelo proibicionismo. Levantar a bandeira “jardineiro não é traficante” é uma forma de pedir a liberdade de um cultivador urbano de maconha, disso ninguém duvida. Por outro lado, tal frase, ao buscar diferenciar o cultivador dos demais criminosos aos olhos do proibicionismo, acaba por cumprir o papel de reforçar a dicotomia entre bons e maus envolvidos com a economia das drogas.

O mesmo vale para o debate sobre usuários medicinais e usuários recreacionais (sociais) ou acerca da diferenciação de usuários e traficantes de acordo com a quantidade de drogas – se pode usar, pode comprar, né?. Essa linha que nos dividiria em isso ou aquilo é apenas fictícia, para não dizer absurda. Por exemplo, o usuário que vende para sustentar o uso é traficante ou usuário? O sujeito que fuma maconha para aliviar dores, e acaba se divertindo no processo, faz uso recreacional ou medicinal? O maninho ao relento passando droga com uma pochete é vítima ou vilão da proibição?

Então, nesse raciocínio, figuras como Carlos Abadia e outros donos de helicópteros carregados de pasta base devem ser defendidas? Não. Os grandes capitalistas da economia das drogas não têm a nossa simpatia e solidariedade. Não por serem “traficantes”, mas por serem megacapitalistas que lucram com a exploração de um mercado violento. Não somos contra o “tráfico” (venda ilegal de drogas), somos contra a proibição – a verdadeira causa da violência que envolve esse mercado.

Antes de usuários ou traficantes, somos pessoas atingidas diretamente pela mesma guerra às drogas. Se juntos somos mais fortes, não há motivo para nos separarmos no momento do enfrentamento – ainda por cima quando do outro lado da trincheira estão as industrias farmacêutica e armamentista, governos, igrejas, clínicas, bancos e capos, que lucram com a manutenção da guerra. Neste sentido, qualquer remendo ou concessão que vá no sentido de descriminalizar a conduta de apenas um grupo específico se trata de uma readaptação do proibicionismo, uma remodelação da guerra às drogas, e não o seu fim como política opressora.

Enquanto a proibição seguir prendendo nossos corpos ou derramando nosso sangue no centro e, principalmente, na periferia, nós, que optamos por desrespeitá-la, seremos criminosos – e isso nos une ainda mais. O ponto comum entre o cultivador urbano, o passador de droga na quebrada, o rastafari e o usuário medicinal ou recreacional (social) é justamente o fato de sermos todos criminosos e vítimas – ou combatentes forçados – de uma guerra que não escolhemos lutar.

Assim, a dor de mães como a Katiele, que tem uma filha com epilepsia severa e até pouco tempo não podia medicá-la com um remédio a base de maconha, não é menor ou maior do que a dor de Débora e das demais Mães de Maio, cujos filhos foram assassinados pela PM no ano de 2006. A dor de Ras Geraldinho ou de Marco Sávio e seus familiares e amigos não é mais ou menos angustiante do que a dor dos centenas de milhares de presos pela guerra às drogas. A dor da família do garoto de 11 anos Patrick, morto pela PM do RJ com um tiro de fuzil, não merece estar mais ou menos nas capas dos jornais do que aquela dos companheiros e familiares dos 43 estudantes normalistas mexicanos ou de conhecidos dos 15 jovens mortos na chacina do Cabula, em Salvador (BA). A dor causada pela execução de Marco Archer na Indonésia não é mais ou menos latejante do que a de nossos Amarildos e DGs. A sua dor é a nossa dor, e ela se transforma na mais digna raiva direcionada ao proibicionismo.

O traficante e a conveniência – a eterna farsa

Segundo o dicionário, ‘traficante” é aquele que leva um produto de um lugar ao outro com objetivo de negociá-lo com terceiros. O termo era comum para designar comerciantes de escravos no séc. XIX e, numa triste ironia, hoje recai principalmente sobre os descendentes dos negros vendidos como mercadoria no passado. No subjetivismo dessa categorização fica evidente como a guerra às drogas serve como instrumento de controle social. Qualquer um pode ser o monstro chamado “traficante” quando é conveniente aos grupos que gerem o Estado, basta representar uma ameaça. Hoje, no Brasil, o termo geralmente é usado para definir jovens negros moradores de periferia e trabalhadores do varejo das drogas. Tal preconceito foi construído ao longo dos anos.

Lá atrás, no século XIX, enquanto o Brasil ensaiava a abolição da escravatura, também eram moldadas as formas de controle social que seriam empregadas sobre a população de homens e mulheres recém libertados. Dessa forma, em 1850 foi instaurada tanto a Lei Eusébio de Queiroz, que proibiu o contrabando de escravos, quanto a Lei de Terras, que limitou o direito à propriedade àqueles que pudessem pagar por ela. Se a primeira apontava para uma possível libertação, a segunda garantia que os ex-escravos não seriam proprietários legais de terras – e não gerariam despesas com gastos públicos. Passadas cerca de 4 décadas foi a vez da Lei Aurea (1888) apontar para a liberdade dos negros, enquanto o código penal de 1890 elevava ao nível nacional a proibição da capoeiragem, que englobava todas as manifestações culturais dos negros, como o jongo, samba, religiões e o hábito de fumar maconha. Esse inimigo moldado no século XIX hoje é o ‘traficante’ que aterroriza o imaginário popular.

Não pense que tal processo de criminalizar condutas para controlar populações é exclusividade do Brasil. Muito pelo contrário. Os EUA, responsáveis pela globalização da guerra às drogas, usaram do mesmo expediente para controlar negros, chineses, mexicanos e irlandeses. Aos olhos dos proibicionistas americanos do começo do século XX, os negros seriam estupradores lascivos e cheiradores de cocaína, já os chineses eram relacionados ao ópio, enquanto os mexicanos à maconha e os irlandeses ao abuso do álcool – cuja proibição não deu lá muito certo. O cenário, infelizmente, não mudou muito de lá pra cá. Hoje, os EUA tem mais negros na prisão do que tinha escravos no século XIX. No Brasil, os negros representavam 61,7% dos quase 538 mil presos (dado de 2003) – hoje a população carcerária do país passa dos 715 mil. E qualquer grupo social pode ter o mesmo destino.

Onde os cultivadores presos recentemente entram nesse papo? Ao produzirem a sua droga para consumo próprio ou venda em pequenos círculos (não que esse seja o caso, visto que não há provas), os jardineiros canábicos pisaram no calo de alguém que lucra com a proibição vigente: um grupo de policiais corruptos, talvez. Dessa forma, ao tentar se desvincular do ciclo de violência e corrupção causado pelo proibicionismo, os cultivadores esbarram nos interesses de quem quer manter tudo como está ou busca uma fatia do mercado de buds plantados em casa. É a história que se repete como farsa em diferentes calendários e geografias. Amanhã pode ser com você, seu amigo, tia ou primo. Cabe a nós o grito de “basta”. Somos tod@s traficantes.

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