Depois de uma reviravolta, o STF (Supremo Tribunal Federal) tomou uma decisão que pode beneficiar dezenas de milhares de pessoas presas por pequeno tráfico de drogas, sobretudo as mulheres. Por oito votos a três, os ministros votaram pela não equiparação do tráfico privilegiado aos crimes hediondos. O tráfico privilegiado acontece quando o réu é primário, tem bons antecedentes e não integra organização criminosa.
Até agora, presos nessa condição estavam sujeitos a cumprir pena sob um sistema de progressão de regime mais duro, aplicável a crimes como estupro e sequestro. Agora, eles terão os mesmos direitos que os presos comuns. Se a equiparação fosse aprovada, teriam de ficar presos por mais tempo nos regimes fechado e semiaberto – o que, para organizações de direitos humanos, seria inconstitucional e teria um efeito explosivo na superlotação do sistema prisional.
Durante a sessão de hoje (a terceira sobre este mesmo caso), três ministros mudaram seus votos em face de argumentos apresentados por organizações de direitos humanos que trabalham com o tema.
Conectas, IBCCrim (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais), ITTC (Instituto Terra, Trabalho e Cidadania), Instituto Igarapé e Plataforma Brasileira de Drogas enviaram memoriais e um amicus curiae aos ministros reforçando os efeitos nefastos da equiparação sobre a população prisional, sobretudo entre as mulheres.
Edson Fachin, Teori Zavascki e Rosa Weber, que já haviam se posicionado a favor da equiparação, voltaram atrás e seguiram o voto da relatora Cármen Lúcia e dos ministros Roberto Barroso, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes e Celso de Mello. Luiz Fux, Dias Toffoli e Marco Aurélio foram os únicos a apoiar a equiparação.
“É uma grande vitória e a participação da sociedade civil nesse caso foi decisiva para virar o jogoâ€, afirma Rafael Custódio, coordenador do programa de Justiça da Conectas. “Conseguimos mostrar com dados e argumentos técnicos e jurÃdicos que a equiparação apenas agravaria a situação da população empobrecida e negra das periferias, especialmente as mulheres, que por uma situação de vulnerabilidade social acabam exercendo pequenas funções dentro das redes de tráficoâ€, completa.
Segundo dados de dezembro de 2014 do Ministério da Justiça, 28% da população carcerária responde por crimes relacionados ao tráfico de drogas. Se consideradas apenas as mulheres, a taxa sobe para 64%.
“O julgamento de hoje é uma sinalização importante de que o Brasil pode e deve acompanhar a tendência global de revisão da polÃtica de guerra à s drogas. O encarceramento claramente fracassou como estratégia para lidar com o problema e hoje começamos a corrigir as distorções derivadas dessa visãoâ€, afirma Custódio.