Se você pensa que essa época do ano é só sobre Jesus, Coca-Cola e hiperconsumismo, está muito enganado. Para mostrar que o Natal pode ser um tanto mais interessante, replicamos abaixo o texto da galera do Hempadão sobre a origem da festividade, que apresenta costumes ligados ao uso do cogumelo Amanita Muscaria em rituais de povos da região da Sibéria. Pra delírio da família tradicional brasileira, nem o Natal está livre das “temidas drogas”.
por Catiusia Gabriel
A ideia de que o Natal teve origem em velhos costumes e crenças pagãs não é nova. Diversos estudos apontam para o fato de que o Natal, como comemorado hoje, apresenta todos os símbolos das celebrações pagãs do solstício de inverno no hemisfério Norte, principalmente dentre os antigos povos da Sibéria. Papai Noel com sua felpuda roupa branca e vermelha, renas voadoras, enfeites pendurados em pinheiros cobertos de neve e os presentes distribuídos pelo bom velhinho. As semelhanças com práticas xamãs e uso de cogumelos de Amanita muscaria entre os antigos habitantes da Sibéria são inúmeras, a começar pelas cores do Natal. E o que dizer das renas voadoras?
Um dos epicentros do uso de Amanita muscaria como enteógeno ocorreu na Sibéria, uma parte da Rússia há milhares de quilômetros ao leste de Moscou. A Sibéria já foi um lugar tão diferente do restante da Rússia da mesma forma como a Índia, enquanto colônia britânica, o foi em relação à Inglaterra. A Sibéria foi o berço de dezenas de grupos étnicos distintos, muitos dos quais mantiveram suas identidades e práticas xamânicas até os dias atuais. Os xamãs siberianos eram as pessoas que serviam a comunidade tanto em aspectos médicos e de cura, quanto proporcionavam o contato com o mundo espiritual. O uso tradicional de Amanita muscaria entre esses povos foi muito difundido. Em doses baixas, os cogumelos amanita podem produzir uma sensação de calor e aumento da energia, semelhante a uma dose moderada de álcool, mas mais estimulante.
Estudos apontam evidências de que os cogumelos eram consumidos durante a passagem do solstício de inverno, com a intenção de iluminar os espíritos durante o inverno escuro que se iniciava. Além do uso enteógeno, os cogumelos teriam sido usados também por trabalhadores siberianos, que os consumiam em uma pequena quantidade antes de iniciar o trabalho pesado, para aproveitar a explosão de energia aumentar a resistência. Esta prática é semelhante à maneira como folhas de kratom (Mitragyna speciosa) são tradicionalmente usadas por trabalhadores tailandeses, e ressalta o fato de que Amanita muscaria era muito consumido entre siberianos comuns.
Papai Noel e o presente original de Natal – Como o inverno escuro e rigoroso no hemisfério Norte geralmente era um período de dificuldade para as pessoas, os xamãs siberianos tinham como atribuição fazer rondas de casa em casa para orientar e distribuir cogumelos secos como “presentes” para enfrentar o longo inverno. Uma dose de aquecimento e energia, que seriam consumidas nas festas do solstício de inverno (em 21 de dezembro). Como as entradas de muitas casas estavam obstruídas pela neve, os presentes seriam então entregues através das chaminés. Amanita muscaria é uma espécie de fungo micorrízico, que cresce associada às raízes de pinheiros, carvalhos e abetos. Essa estreita ligação entre o fungo e a árvore seria a explicação para a árvore de natal e seus enfeites. Os xamãs siberianos coletavam cogumelos e os colocavam para secar nos ramos dos pinheiros, ou os colocavam dentro das meias que secavam penduradas na lareira. Os paralelos dessas antigas práticas xamãs e os atuais costumes de Natal são inconfundíveis.
Então, Papai Noel era um xamã? Todas as crianças sabem quem é Papai Noel, aquela figura mágica que visita todas as casas do mundo numa só noite, viajando em um trenó puxado por renas voadoras e distribuindo presentes. A versão atual sobre Papai Noel contada às crianças tem origem na lenda sobre São Nicolau, um bispo ortodoxo russo que mostrou extraordinária caridade para com as crianças e jovens carentes. Segundo o cristianismo, o bom velhinho seria São Nicolau, que visitava as crianças na noite do nascimento de Jesus. Esta tradição tem origem no famoso poema “The Night Before Christmas” (A Noite Antes do Natal), também conhecido como “A Saint Nicholas visit” (Uma Visita de São Nicolas), escrito por Clement Clarke Moore, em 1822. Moore tomou como pano de fundo para seu poema as antigas lendas dos povos europeus, notadamente a mitologia nórdica e a história de Thor, que percorria o mundo em uma carruagem puxada por duas cabras voadoras. Aparentemente, o poema The Night Before Christmas não apresenta elementos ligados às antigas tradições siberianas, mas é muito curioso notar que a rena líder do grupo que puxa o trenó de Papai Noel tem o nariz vermelho em formato de cogumelo.
Um enteógeno e feliz Natal a todos!
Mais sobre o assunto:
http://www.livescience.com/25731-magic-mushrooms-santa-claus.html
http://www.npr.org/2010/12/24/132260025/did-shrooms-send-santa-and-his-reindeer-flying