• Home
  • Quem somos
  • A razão entorpecida
  • Chame o DAR pra sua quebrada ou escola
  • Fale com a gente
  • Podcast
  • Quem somos
  • A razão entorpecida
  • Podcast
  • Chame o DAR pra sua quebrada ou escola
  • Fale com a gente
Abril 18, 2017

Entre esclarecimentos e a política do medo

Coluna da Isa Bentes*

Há dez dias saiu na mídia uma pesquisa realizada pela ONG mexicana Conselho Cidadão para Segurança Pública e Justiça Penal apontando o município de Natal (RN) como a 10ª cidade mais violenta do mundo. A mesma pesquisa foi divulgada há um ano, apontando Natal como a cidade mais violenta do mundo, mais do que Cali (Colômbia) e Tijuana (México), por exemplo. Partindo de uma estranheza que não condiz com a realidade da cidade, pergunta-se: Natal ficou mais ou menos violenta de acordo com a pesquisa? O ranking apontado quer mobilizar uma população para manutenção de um estado de medo permanente ou está afim de contribuir para uma melhor reformulação de políticas de segurança pública?

Neste sentido, parte-se para avaliar a metodologia utilizada para que o resultado apontasse para tal dado, que de fato é alarmante. Inicialmente, os critérios de avaliação utilizados pela ONG são: cidades acima de 300 mil habitantes; que constitua uma unidade urbana claramente definida; e que use dados de fontes oficiais ou alternativas apenas para homicídios dolosos e culposos, correspondentes ao ano anterior da publicação da pesquisa.  A pesquisa excluiu da análise países que estão em situação de conflito bélico, uma vez que eles não correspondem à definição universalmente aceita de homicídio (Síria, Iraque, Afeganistão, Sudão e Ucrânia). Exclui-se igualmente cidades que tiveram dados insuficientes sobre taxas de homicídios, ou que essas taxas não eram suficientemente elevadas. A escolha de eleger cidades com mais de 300 mil habitantes deve-se ao fato de que a variação estatística pode apresentar fortes distorções em localidades com menos de cinco mil habitantes, por exemplo, apontando que se a cidade em que um indivíduo mata cinco pessoas de sua família, a taxa seria de 100 homicídios para cada 100 mil habitantes, e isso daria impressão que tal cidade vive situação epidêmica de homicídios.

Além dessa determinação demográfica, a pesquisa entende as unidades geográficas como regiões metropolitanas, e não municípios. Isto quer dizer, no caso da região metropolitana de Natal, que estão incluídos dados de Natal, Parnamirim, Macaíba, São Gonçalo do Amarante, Extremoz, Ceará Mirim, Maxaranguape, Monte Alegre, Nísia Floresta, São José de Mipibu, Arês, Goianinha, Ielmo Marinho e Vera Cruz, região que concentra 1.473.871 habitantes e representa 42,3% de toda a população do estado do Rio Grande do Norte (apenas para a cidade de Natal estima-se a população em 877.662 habitantes). Alguns desses municípios, em sua maioria rurais e não conurbados entre si, entram na estatística sem que respeitem os pré-requisitos necessários para a avaliação de taxa de homicídio como fator determinante de aumento da violência nessa região metropolitana.

 

De acordo com a pesquisa, Natal ficou mais ou menos violenta? Crédito: Fernando Pangaré

Além das dificuldades de se obter dados reais do índice de mortes de determinadas cidades, vale apontar que a pesquisa utiliza como indicador de violência apenas as taxas de homicídios, excluindo dessa observação os índices de crimes contra propriedade, roubos e furtos, tráfico de drogas, crimes contra o patrimônio e as tentativas de homicídio. Ressalte-se ainda que essas outras variáveis não consideradas representam as maiores estatísticas na avaliação de violência do país, refletindo inclusive na caracterização criminal da população carcerária brasileira.

Desconexão com a realidade

A questão é que, por mais que a taxa de violência no Brasil aumente em ritmo progressivo, o mapa da violência no Brasil de 2016 mostrou que a cidade de Natal, no que diz respeito à mortes causadas por armas de fogos – ou seja, homicídio -, está posicionada no 119ª lugar no ranking nacional (apesar de este índice ter aumentado). Vale lembrar que cada país, região, cidades e municípios possuem dinâmicas de cenas de violência diferenciadas e que, numa proporção mundial, não cabe apontar um denominador comum sem levar em conta as especificidades locais e as dinâmicas sociais. Apontar a cidade de Natal como a 10ª cidade mais violenta do mundo em uma lista de apenas 50 cidades transmite uma desconexão com a realidade local que faz com que existam profundas divergências em seus resultados. Não estou querendo afirmar que os índices de violência em Natal, assim como a sua região metropolitana, não tenham crescido. Sim, eles sofreram aumento, mas este aumento não é refletido no que expõe esse ranking.

É necessário compreender a metodologia dessa pesquisa e avaliar o ponto de partida de qual está saindo, uma vez que nessa sociedade de fast food de dados jogado diariamente nas redes sociais, eles acabam norteando políticas públicas ineficazes e ineficientes justamente por não encontrar respaldo na realidade social. E falo de Natal por que é uma realidade que conheço profundamente por ser o lugar em que vivi por 21 anos, e que não só vivi, como também estudei seus conflitos, a fim de compreender suas dinâmicas, suas particularidades e sua subjetividade coletiva expressa no que é este cenário de violência potiguar.

Pesquisas precisam ser feitas com seriedade para que seja possível a formulação de políticas públicas capazes de levar em conta o contexto local, e que não sejam elaboradas a fim de dar uma resposta imediata para um determinado instante. É necessário formular projeto de cidade que leve em conta as desigualdades sociais, os problemas de habitação, as taxas de desemprego, as populações em situação de rua, a ausência de seguridade social, as taxas de educação e saúde, dentre outros determinantes sociais relevantes em contextos específicos.

Não precisamos de pesquisas que fomentem ainda mais a existência de uma sociedade baseada no medo e no pânico, que fazem com que os indivíduos se fechem cada vez mais nas suas casas, que não vivam a cidade, que não ocupem os espaços públicos. É um ciclo vicioso que não tem diminuído as taxas de violência e tem nos condenado a vivermos em uma cidade de muros, deixando a cargo da democracia do capital gerir as áreas urbanas para garantir seus lucros baseado no terror promovido pelas políticas de segurança pública.

*Isabela Bentes é socióloga pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, Mestra em Sociologia pela Universidade de Brasília e integrante do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre psicoativos. E-mail: isa.bentes@gmail.com

Comments

comments

Nos ajude a melhorar o sítio! Caso repare um erro, notifique para nós!

Recent Posts

  • NOV 26 NÓS SOMOS OS 43 – Ação de solidariedade a Ayotzinapa
  • Quem foi a primeira mulher a usar LSD
  • Cloroquina, crack e tratamentos de morte
  • Polícia abre inquérito em perseguição política contra A Craco Resiste
  • Um jeito de plantar maconha (dentro de casa)

Recent Comments

  1. DAR – Desentorpecendo A Razão em Guerras às drogas: a consolidação de um Estado racista
  2. No Grajaú, polícia ainda não entendeu que falar de maconha não é crime em No Grajaú, polícia ainda não entendeu que falar de maconha não é crime
  3. DAR – Desentorpecendo A Razão – Um canceriano sem lar. em “Espetáculo de liberdade”: Marcha da Maconha SP deixou saudade!
  4. 10 motivos para legalizar a maconha – Verão da Lata em Visitei um clube canábico no Uruguai e devia ter ficado por lá
  5. Argyreia Nervosa e Redução de Danos – RD com Logan em Anvisa anuncia proibição da Sálvia Divinorum e do LSA

Archives

  • Março 2022
  • Dezembro 2021
  • Setembro 2021
  • Agosto 2021
  • Julho 2021
  • Maio 2021
  • Abril 2021
  • Março 2021
  • Fevereiro 2021
  • Janeiro 2021
  • Dezembro 2020
  • Novembro 2020
  • Outubro 2020
  • Setembro 2020
  • Agosto 2020
  • Julho 2020
  • Junho 2020
  • Março 2019
  • Setembro 2018
  • Junho 2018
  • Maio 2018
  • Abril 2018
  • Março 2018
  • Fevereiro 2018
  • Dezembro 2017
  • Novembro 2017
  • Outubro 2017
  • Agosto 2017
  • Julho 2017
  • Junho 2017
  • Maio 2017
  • Abril 2017
  • Março 2017
  • Janeiro 2017
  • Dezembro 2016
  • Novembro 2016
  • Setembro 2016
  • Agosto 2016
  • Julho 2016
  • Junho 2016
  • Maio 2016
  • Abril 2016
  • Março 2016
  • Fevereiro 2016
  • Janeiro 2016
  • Dezembro 2015
  • Novembro 2015
  • Outubro 2015
  • Setembro 2015
  • Agosto 2015
  • Julho 2015
  • Junho 2015
  • Maio 2015
  • Abril 2015
  • Março 2015
  • Fevereiro 2015
  • Janeiro 2015
  • Dezembro 2014
  • Novembro 2014
  • Outubro 2014
  • Setembro 2014
  • Agosto 2014
  • Julho 2014
  • Junho 2014
  • Maio 2014
  • Abril 2014
  • Março 2014
  • Fevereiro 2014
  • Janeiro 2014
  • Dezembro 2013
  • Novembro 2013
  • Outubro 2013
  • Setembro 2013
  • Agosto 2013
  • Julho 2013
  • Junho 2013
  • Maio 2013
  • Abril 2013
  • Março 2013
  • Fevereiro 2013
  • Janeiro 2013
  • Dezembro 2012
  • Novembro 2012
  • Outubro 2012
  • Setembro 2012
  • Agosto 2012
  • Julho 2012
  • Junho 2012
  • Maio 2012
  • Abril 2012
  • Março 2012
  • Fevereiro 2012
  • Janeiro 2012
  • Dezembro 2011
  • Novembro 2011
  • Outubro 2011
  • Setembro 2011
  • Agosto 2011
  • Julho 2011
  • Junho 2011
  • Maio 2011
  • Abril 2011
  • Março 2011
  • Fevereiro 2011
  • Janeiro 2011
  • Dezembro 2010
  • Novembro 2010
  • Outubro 2010
  • Setembro 2010
  • Agosto 2010
  • Julho 2010
  • Junho 2010
  • Maio 2010
  • Abril 2010
  • Março 2010
  • Fevereiro 2010
  • Janeiro 2010
  • Dezembro 2009
  • Novembro 2009
  • Outubro 2009
  • Setembro 2009
  • Agosto 2009
  • Julho 2009

Categories

  • Abre a roda
  • Abusos da polí­cia
  • Antiproibicionismo
  • Cartas na mesa
  • Criminalização da pobreza
  • Cultura
  • Cultura pra DAR
  • DAR – Conteúdo próprio
  • Destaque 01
  • Destaque 02
  • Dica Do DAR
  • Direitos Humanos
  • Entrevistas
  • Eventos
  • Galerias de fotos
  • História
  • Internacional
  • Justiça
  • Marcha da Maconha
  • Medicina
  • Mídia/Notí­cias
  • Mí­dia
  • Podcast
  • Polí­tica
  • Redução de Danos
  • Saúde
  • Saúde Mental
  • Segurança
  • Sem tema
  • Sistema Carcerário
  • Traduções
  • Uncategorized
  • Vídeos