por Coletivo DAR
Quem estava nos arredores da praça localizada atrás da Escola Estadual Prof. Carlos Ayres, no Grajaú, zona sul de SP, estranhou o enorme contingente policial ali estacionado. Afinal, era uma tarde tranquila de sábado, o futebol comia solto e o samba começava a reunir um pessoal em um dos cantos da praça.
No outro lado, um número nada assustador de jovens se reunia em torno de uma faixa da Marcha da Maconha pintada à mão. Quando formaram uma roda de conversa para decidir o caminho que iriam tomar dali em diante, foram surpreendidos: “todos de pé, mãos para trás”. A frase foi proferida, claro, por um dos quase 20 policiais presentes no local. Naquele momento, havia mais homem fardado do que gente comum na praça.
A partir de então, uma sucessão de violência verbal e psicológica tomou conta do que era pra ter sido a primeira Marcha da Maconha da zona sul da cidade. Revistas forçadas, altamente seletivas (apenas os negros com cara de quebrada tiveram seus pertences checados) e, no fim, DUAS PONTAS serviram pra levar dois adolescentes pra delegacia. Um brother rastafári que tava tirando fotos teve sua câmera confiscada e acabou detido também.
Começava ali o show de horrores e despreparo do braço armado do Estado brasileiro, uma das polícias que mais mata no mundo. Provocações baratas, argumento baseado em uma lei falha e injusta, TOTAL DESPROPORÇÃO de uso da força (para cada manifestante deveria ter pelo nos três polícias, duas motos e uma viatura).
O pastelão proporcionou ainda uma cena lamentável: um dos detidos teve tempo de chamar sua avó para acompanha-lo. Quando ela chegou na praça e viu o neto detido, começou a chorar. A polícia fez sua parte e PUXOU A SENHORA para longe do jovem, como se ele fosse uma pessoa de altíssima periculosidade. Com tantos anos de vida nas costas, ela soube se desvencilhar dos porcos fardados e continuou ao lado de neto.
Foi mais uma demonstração de como a violência policial, quando não é estritamente física (tiro, porrada e bomba), é totalmente psicológica. Desde o momento da detenção até os finalmentes na delegacia se passaram umas sete horas. Ao invés de protestarem livremente com seus corpos e suas próprias decisões, os jovens foram obrigados a passar a noite de sábado dentro de um departamento policial, tendo que assinar uma pá de burocracia e ouvir uma pá de merda para serem liberados.
Quando perguntamos aos jovens detidos o porquê estavam na Marcha, a resposta não poderia ser mais alentadora: “Temos o direito de protestar e quero um mundo diferente de como está hoje”, disse um deles. O outro estava li “pela causa, pela descriminalização, pelos direitos de quem mora na quebrada”. O mais jovem detido, apenas 16 anos, prosseguiu: “Vou sair daqui com a cabeça erguida e pronto para mais uma batalha. Levo de hoje sabedoria e aprendizado para a luta”.
Não tem jeito, senhor policial. Você pode até tentar nos enterrar, mas pelo visto ainda não entendeu – e nunca entenderá – que somos todos sementes. Você pode me olhar com aquela cara feia que só os homens de farda são capazes, acelerar a moto à toa pra me pegar desprevenido, cuspir na minha frente. Mas não tem jeito, seu puliça: amanhã vai ser maior.