Por Coletivo DAR
– onde que é o campo de society, chapa?
– opa, é só virar ali e seguir direto.
– valeu!
– é marcha da maconha é?
– é!
– ih fica tranquilo que manguinhos já é legalizado!
Já pensou que loko que seria uma Marcha da Maconha numa favela do Rio, no centro da guerra às drogas? Que colasse os maiores afetados, os que vivem no fogo cruzado enquanto o Brasil inteiro fuma e cheira, enquanto a polícia enche o bolso de grana e os pobres de bala?
Seria muito foda, uma Marcha feita pela e na quebrada, que enfrentasse um contexto de intervenção militar, que esfumaçasse e sambasse na frente da Cidade da Polícia, dos coxa que tão todo dia de fuzil babando na entrada do Manguinhos, que andasse entre as paredes cheia de bala, o comércio popular e as igrejas, que brotasse os menor, os vida loka, as mina zika, os cultivadores, Planta na Mente, RENFA, a galera do uso terapêutico, os MC’s. Os usuários – todos nós. Os traficantes, que também somos todos nós.
Imagina o impacto, não precisava ser tão grande, podia ter umas 200 pessoas pra começar, pra sair do armário – a informação depois voa que nem baseado, de boca a boca, mesmo quem não curte não fica imune. A Marcha podia fazer reunião e divulgação em outras várias favelas, colar desde cedo em Manguinhos e fazer um café da manhã 0800 pra geral, passar pela entrada do Jacarezinho pra dar um salve, ter faixa contra caveirão, espalhar panfleto e adesivo, fechar ruas e avenidas, passar por polícia, exército, força nacional, UPP, quem vier, foda-se, é pelo justo. Podia depois voltar pra uma batalha de MC’s, podia até tá cheio de feminista que iam fazer uma das rodadas da batalha ser sobre buceta, pra choque dos próprios MC’s.
Maconha, futebol, música e favela! Doideira pensar como a realidade vivida ali em muitos momentos pode mostrar muito mais o que queremos e precisamos do que o $istema apresenta como modelo.
E tudo isso sem nenhuma treta, nenhum conflito, articulado com quem tem que autorizar, legalizado por quem tem que legalizar, imagina que brisa! Todo mundo ouvindo um som, fumando um (vários!) e projetando junto como parar essa guerra que entristece e empobrece lugares cheios de vida, cooperação e autonomia, como fortalecer os debaixo no começo, no meio e no fim desse caminho. A favela tem horta, tem festa, tem suas leis, suas redes e teias, é só deixar ela viver, só tirar os caveirões, os milicianos, as armas que a solução começa a aparecer. Como vai ser depois da guerra? Vai depender dos caminhos dessa guerra resposta pacífica que travamos no cotidiano, de quem mais se envolver, da energia que tivermos pra parar a força das armas, sim, mas também a do dinheiro.
No sábado, dia 9 de junho, esse sonho começou a virar realidade – como também tem sido há uns anos em algumas quebradas de São Paulo, como foi nas Marchas de Recife, Salvador e várias outras. No final, o sentimento geral foi bem resumido pelo Felipe, um dos organizadores da Marcha das Favelas: “quem não foi perdeu!”
Imagina isso acontecendo mais e mais, as Marchas da Maconha cada vez mais no centro da guerra às drogas, escancarando a urgência do debate até derrubar ela desde baixo? Esse sonho já tá dando pra sonhar acordado – que ele se espalhe como os bons ventos de Manguinhos.
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vídeo gravado na concentração: