O DDD desta semana traz dois estudo etnográficos. O primeiro, “Da cracolândia aos nóias: percursos etnográficos no bairro da Luz“, de Heitor Frúgoli Jr, professor do departamento de antropologia – USP, e Enrico Spaggiari, doutorando em antropologia social – USP, foi publicado na  Ponto Urbe (revista do núcleo de antropologia urbana da USP). O artigo, resultado do acompanhamento do trabalho do Centro de convivência É de Lei, é indicado a todos os interessados em crack, cracolândia e RD.
Já o segundo se trata de uma análise netnográfica. Isso mesmo, o estudo é uma etnografia psiconáutica da internet, especialmente de uma comunidade virtual, a Enteógenos sem dogmas (orkut.com). Assim, “Alquimistas do êxtase”, apresentado por Iago Pereira como monografia de conclusão do curso de Ciências Sociais da UFMG, debruça-se sobre o movimento psicodélico na contracultura e na psiconáutica tomando como objeto de estudo o espaço de convivência social supracitado.Â
Da cracolândia aos nóias: percursos etnográficos no bairro da Luz
Resumo
Esse artigo tem como objetivo apresentar uma investigação mais sistemática do que se convencionou chamar de cracolândia, para além de uma série de representações estigmatizantes atreladas ao bairro da Luz e ao centro de São Paulo, principalmente pela mÃdia impressa e televisiva. A partir da observação etnográfica das redes de relações e conexões, procuraremos trabalhar a ideia da cracolândia como uma modalidade de territorialidade itinerante dentro de um contexto multifacetado e marcado por inúmeras variações situacionais. Nesse texto, especificamente, abordaremos nossas interações com o Centro de Convivência É de Lei nas suas relações com o contexto em questão, que se dão através de ações voltadas à redução de danos junto aos usuários de crack – um dentre outros segmentos da população local da Luz que estão sendo abordados numa pesquisa mais ampla (em andamento) -, para assim entender certas mediações estabelecidas com o bairro em questão. Portanto, o artigo traz uma reconstituição etnográfica desse campo de relações sob o prisma do É de Lei, bem como de outros agentes mediadores envolvidos no mesmo, com o desafio de compreender e explicar tal territorialidade frente à s recentes dinâmicas polÃticas e cotidianas que reconfiguram o contexto pesquisado, marcado pela presença do(s) nóia(s), categoria relacional acionada de forma múltipla e recorrente aos usuários de crack.
Alquimistas do êxtase: uma análise do movimento psicodélico na contracultura e na psiconáutica
Resumo
Este trabalho propõe uma análise do fenômeno conhecido como “psiconáutica”, que constituiria um renascimento do movimento psicodélico iniciado na década de 1990 principalmente através da internet (CARNEIRO, 2005). A análise é desenvolvida através dois eixos exploratórios. No primeiro eixo, o autor esboça uma genealogia da contracultura das décadas de 1960 e 1970, em vias de compreender em que sentido a psiconáutica é um “renascimento” do movimento psicodélico. No segundo eixo o autor empreende uma “netnografia†em uma comunidade parte da cena psiconáutica, chamada “Enteógenos Sem Dogmas”. Por “netnografia†o autor entende uma adaptação da etnografia tradicional para os meios de socialização online (KOZINETS, 2002). A abordagem dos dois eixos é efetivada segundo uma perspectiva analÃtica e polÃtica designada provisoriamente como “pós-estruturalistaâ€, perspectiva esta que abarca as obras de Gilles Deleuze, Félix Guattari, Michel Foucault e Bruno Latour, entre outras. O autor observa que tanto a contracultura quanto a psiconáutica põem em operação processos relacionados ao desmonte de estruturas transcendentes de autoridade. Estes processos de desmonte engendram uma série de riscos – podendo resultar em corpos vazios, fragmentados ou cancerosos. O autor conclui com a observação de que, se estes riscos são devidamente contornados, os processos em questão conduzem à constituição de o que Deleuze e Guattari (1996) designam plano de imanência.