Vanderlei defende a legalização das drogas / Foto: Fernando Maia
Vanderlei Luxemburgo está de bem com a vida. Depois de 15 anos rodando pelo Brasil e pelo mundo, está de volta ao seu Rio, ao seu Flamengo, onde após duas passagens (91 e 95) sem boas lembranças, conseguiu livrar o time do rebaixamento, no ano passado, e agora curte uma confortável invencibilidade nas últimas 21 partidas.
Nesta entrevista exclusiva ao JOGO EXTRA, crua, absolutamente na Ãntegra, sem cortes, o técnico do Flamengo solta o verbo sobre a chacina de Realengo, o excesso de palavrões, homossexualismo, bebidas alcoólicas, defende a legalização das drogas e fala até sobre futebol. Divirta-se.
JOGO EXTRA: Vandeco, Vanderlei, Luxa ou Luxemburgo?
VANDERLEI LUXEMBURGO: No Rio é Vanderlei. Vandeco é para o Ãntimos, e Luxemburgo ou Luxa é em São Paulo. Lá, sempre foi Luxemburgo, mas como o nome é grande para caber na manchete do jornal, virou Luxa. Tá vendo como eu sei? AÃ, todo mundo me chama de Luxa. Mas você escolhe.
JE: Então vamos de Vanderlei porque estamos no Rio e eu não sou Ãntimo de você para te chamar de Vandeco (risos). E já que estamos no Rio e você gosta de carnaval, uma das sensações deste ano foi a Unidos da Tijuca, que teve enredo sobre medo. Você tem medo de quê?
VL: Medo? Não tenho medo de porra nenhuma, rapaz. E eu lá sou homem de ter medo?
JE: De nada? Não é possÃvel! Eu tenho medo de cachorro.
VL: Medo? Se eu disser que tenho medo de barata você, vai rir para caralho. Mas nem sei se é medo. É nojo. Medo eu não tenho de porra nenhuma.
JE: Esqueci de dizer uma coisa antes de a gente começar: não tem como eu fazer uma entrevista com você e cortar os palavrões. Tudo bem, né?
VL: (risos) Claro. O caralho é o que mais me acompanha. Eu falo palavrão mesmo, mas não sou mal educado. Eu falo palavrão porque não existe futebol sem palavrão, mas isso não quer dizer que eu esteja ofendendo alguém. Quem reclama disso é quem tem implicância comigo. Não tem como eu pedir “por favor” à beira do campo. Vocês colocam aqueles microfones na beira do campo e isso só polui a transmissão, não informa nada. Se o bandeira erra um impedimento, eu posso gritar “porra, caralho, filha da puta, estava impedido”, mas não quero ofender o cara, nem a mãe do cara. É a linguagem do futebol. Aquilo só serve para a gente pegar um gancho no Tribunal.
JE: Apesar de ter ficado muito tempo em São Paulo, seu jeitão carioca permaneceu intacto. Conservou gÃrias, palavrões, hábitos, samba no pé e uma religiosidade curiosa. Você é católico, mas tem irmã que é mãe-de-santo e se consulta com o babalorixá Robério de Ogum. Que mistureba é essa?
VL: E minha mãe era mãe-de-santo e minhas filhas são evangélicas (risos)! Mas eu não faço nada disso, não mexo com essas coisas. Gosto da Igreja Católica, da macumba, como quase todo brasileiro. Mas não frequento muito. Sou amigo do Robério e tenho uma irmã que mexe com isso. E eles, como amigos, fazem trabalhos para me ajudar, mas fazem porque querem, porque são amigos. Eu não peço nada.
JE: Mas o Robério ficou dois meses no Rio, no ano passado, fazendo “trabalho†para o Flamengo escapar do rebaixamento porque você pediu.
VL: Eu não pedi. Ele está sempre no Rio e fez porque é meu amigo.
JE: Quero ver se você vai pipocar agora. Todo mundo pipoca nesse tema: homossexualismo. Tem muito gay no futebol?
VL: (risos) Muitos, né? Claro que tem. E não só no futebol, mas em tudo que é lugar. No futebol, na imprensa, o que não falta é homossexual (risos).
JE: Você já jogou com algum?
VL: Eu?? hahahaha. Claro que já. Mas nunca vou dizer o nome. Jamais. Xiii, essa resposta vai fazer nego aqui dentro pegar no meu pé até eu contar quem era, como era… (risos).
JE: E já treinou algum?
VL: Humm, acho que não. Não me lembro (pausa). Ah, teve o Emerson, que foi meu goleiro aqui no Flamengo (1995). Mas eu não sabia que ele era gay, só fui saber anos depois quando ele confessou que era.
JE: E você admitiria se o clube contratasse um homossexual talentoso?
VL: Claro. Não vejo problema algum.
JE: Se o Flamengo contratasse o… ah, vou pular essa.
VL: É, pula (risos).
JE: E o que você achou do Michael, do Vôlei Futuro, que “saiu do armário” na semana passada?
VL: Acho que ele fez certo. Ninguém tem nada a ver com a opção sexual do cara.
O viciado precisa de tratamento, não de punição. E quanto ao cidadão comum, acho um absurdo proibição
Vanderlei Luxemburgo
JE: Então vamos animar a conversa. Você está de volta ao Rio, onde muito se fala em tráfico de drogas. Qual sua posição? É a favor da legalização?
VL: Eu sou! (enfático). Droga tem em tudo o que é lugar, e sempre vai ter. Eu nunca usei, nunca nem vi cocaÃna, por exemplo. E ainda acho uma covardia o que fizeram com o Maradona. CocaÃna não melhora o desempenho atlético de ninguém, muito pelo contrário. O viciado precisa de tratamento, não de punição. E quanto ao cidadão comum, acho um absurdo a proibição. Quanto mais proibir, pior. Tem que fazer como em vários paÃses europeus, criar locais especÃficos para o cara usar a droga dele. Fora dali, não. Mas ali? Se o cara quer fumar, cheirar, o que eu tenho a ver com isso? O que tem de gente por aà que usa droga…
JE: E em relação às armas? O caso de Realengo trouxe a discussão de volta à pauta? Você tem ou já teve armas?
VL: Não. E acho que o que houve em Realengo foi um fato isolado. A discussão em torno desta questão tem de ser mais abrangente, não apenas fazer outro referendo.
JE: Vamos brincar, rapidamente, de mostrar quem é o Vanderlei, seus gostos, preferências… ok?
VL: Vamos lá.
JE: Um perfume:
VL: Blue de Chanel
JE: Carro:
VL: Qualquer um. Já fui apaixonado por carros, tive coleção, mas hoje ando em qualquer um. O que mais ando é um Fusion.
JE: Ator:
VL: O TarcÃsio Meira continua sendo o cara. Está velho, mas continua um grande sedutor. Está dando um show na novela.
JE: Atriz:
VL: Não é Fernanda Montenegro, não (risos). Eu prefiro a Laura Cardoso.
JE: Cantor:
VL: Cauby Peixoto, o melhor de todos. E gosto do EmÃlio Santiago também.
JE: Cantora:
VL: Ângela Maria e Elis Regina.
JE: Música:
VL: Minha Preta. (“Eu não troco a minha preta pela preta de ninguém”, cantarola). É a música da minha vida. No aniversário da minha mulher, convidei The Fevers para cantar, e o Neguinho da Beija-Flor, que cantou essa música. Foi uma choradeira… (nota da Redação: Minha Preta é uma samba de Candeia).
JE: Comida preferida:
VL: Bife à milanesa com maionese.
JE: O que não come de jeito nenhum:
VL: Nada. Como qualquer coisa, rapá. Como pão com raiva.
JE: Lugar inesquecÃvel:
VL: Uma ilha que eu fui em Senegal, em 1972, com a seleção: Ilha de Goreia.
JE: Lugar que gostaria de conhecer:
VL: Alasca. Adoro pescar e o Jotinha (J. Hawilla), da Traffic, disse que pescou salmão lá e foi um dos melhores passeios que já fez. Tenho curiosidade de ir lá.
JE: Jogo inesquecÃvel como lateral:
VL: Um Fla-Flu de 1972. Ganhamos de 2 a 1 e fomos campeões. Acho que tinha umas 170 mil pessoas no Maracanã. (Oficialmente, o público pagante foi de 136.829)
JE: Jogo inesquecÃvel como técnico:
VL: Palmeiras x Boca Juniors. Ganhamos de 6 a 1. Foi uma atuação perfeita. O próprio Menotti, técnico do Boca, depois do jogo falou isso.
JE: Melhor amigo:
VL: Não posso citar um só. Tenho poucos, mas grande amigos.
JE: Melhor jogador:
VL: Maradona, Romário e Zico. O Zico está abaixo porque não ganhou uma Copa do Mundo, mas jogava tanto quanto. Ah, e o Ronaldo Fenômeno na lista de cima. Bota aÃ.
JE: E o Garrincha?
VL: Ah, tem o Garrincha. Está naquela primeira lista, mas não chega ao Pelé. Este não conta, era de outro mundo. Posso ficar falando horas sobre o Pelé, mas você, que não viu ele jogar, nunca vai entender na plenitude. Pelé era foda. Mas se comparar Garrincha e Romário, Garrincha e Maradona, fico com o Garrincha.
JE: Desafeto:
VL: Não tenho. Discuto no momento e vida que segue. Não guardo mágoa de ninguém.
JE: Jornalista:
VL: Oldemário Touguinhó. Aquele era jornalista, repórter de verdade. Estava sempre em cima do lance.
JE: Programa de TV:
VL: Os telejornais e o Sarau, da Globonews, com o Chico Pinheiro. É um banho de cultura.
JE: Mulher bonita, mas não vale a sua:
VL: Uma menina da novela de época que começou (Cordel Encantado), de olhos azuis (Bianca Byn).
JE: Homem bonito, mas não vai dizer que é você, né?
VL: Meu neto. Pode? (risos).
JE: Um sonho de consumo:
VL: Humm, não tenho.
JE: Você tem dinheiro para comprar o que quiser?
VL: Não. Tenho dinheiro para viver sossegado, mas não para comprar o que eu quiser. E nem tenho nada em mente para comprar.
JE: Escola de samba:
VL: Salgueiro. Desfilo todo ano.
JE: Praia carioca:
VL: Era a de Ramos, pedindo licença para os soldadinhos. Sabe o que é soldadinho? Cocô! (risos). Hoje é a Barra, onde eu moro.
JE: Mas dava para pegar umas cocorocas lá em Ramos?
VL: Pô, aà tu me quebra (risos).
JE: Restaurante:
VL: Em São Paulo, eu sei vários. Aqui, tenho gostado do Expand, na Barra.
JE: E pé-sujo? Largou as origens ou ainda frequenta?
VL: Adoro. Tenho ido pouco, mas gosto do La Plancha, no mercado produtor da Barra. Mas gosto muito. Antigamente, eu, Renê, Galdino, Alcir, Gaúcho, Ãamos até Deodoro para tomar cerveja.
JE: E hoje vai de cerveja, vinho, uÃsque, champanhe? O que você bebe?
VL: Bebo tudo, mas prefiro vinho. E não bebo muito, não. Nunca fui de beber muito. UÃsque, por exemplo, são duas, três doses no máximo.
JE: E para jogador de futebol? Não estou falando especificamente do Ronaldinho, não. Nem do Adriano. Tem Fred, Emerson, Ronaldo… o que não falta é gente que gosta de uma farra. Qual o limite? A bebida alcoólica atrapalha?
VL: Limite? Acho que o Brasil perdeu o limite. Não acho que o jogador de futebol seja o vilão. Em todos os setores, em todas as épocas houve problemas deste tipo. Desde Heleno de Freitas, Garrincha, Leandro. Acho que a gente não sabe muito os limites que precisamos ter. Somos uma jovem democracia. Não conhecemos a democracia plena, principalmente nossos governantes, que sempre sofreram com a ditadura. Há uma falta de discernimento por parte de todos em relação a quando termina o direito de um e começa o direito do outro. Ninguém sabe direito o seu limite.
JE: Mas você é um treinador. Muitos te chamam de professor. Você ensina aos jogadores este limite? Como chegar para uma estrela como o Ronaldinho e falar para ele beber um pouquinho menos?
VL: Eu falo para todo mundo, não faço distinção. Tudo tem que ser conversado, não imposto. Ou você acha que é possÃvel dizer para um jovem, com dinheiro, que ele está proibido de beber? Não dá, né? A gente faz coisas que você nem imagina. E que são coisas que dizem respeito a nós, não há por que tornar público. O cara tem que saber que não pode beber na sexta se tem jogo no domingo. Mas se teve jogo no domingo, ficou a semana toda treinando e vai ter a segunda e a terça de folga, não tem por que não ir na micareta, como aconteceu agora.
JE: Pôquer, sueca, buraco ou vinte-e-um?
VL: Pôquer. Só jogo pôquer. Antigamente jogava caxeta, mas hoje é só pôquer. Mas faz tempo que não jogo, e por falta de tempo. Mas é até bom você perguntar isso porque parece que é um crime. Todo mundo joga pôquer, tem até na televisão. Jogo há anos, com Zico, Carpegiani, Cantarele, Raul, Leandro, mas parece que o criminoso sou eu. Não, né?
JE: Finalizando, para você poder dar o treino: seleção de 70 ou de 82?
VL: A de 1970.
JE: Messi ou Ronaldinho Gaúcho?
VL:: Ronaldinho Gaúcho. Quando o Messi ganhar uma Copa do Mundo, a gente conversa. É o mesmo critério que uso para Romário e Zico. Tenho que ser coerente.
JE: Messi ou Maradona?
VL: Maradona.
JE: Mas se o Messi for campeão do mundo?
VL: Depende do que ele fizer na Copa do Mundo. Você viu o que o Maradona fez? Só poderemos comparar o Messi com esses caras depois que ele encerrar a carreira e a gente saber o que ele fez.
JE: Agora é para terminar mesmo, voltando à religião. Qual seu santo protetor? E orixá? Ogum, Oxóssi, Iansã?
VL: Não sei. Minha irmã diz que eu tenho um, mas não lembro. O que me ajudar a botar a bola para dentro é o meu. Mas sei que se você escrever alguma coisa ruim para mim, amanhã você quebra as pernas (gargalhadas).
JE: O papo foi bom, não?
VL: O papo? Foi ótimo. Mas quero ver se o que vai sair no jornal vai ser ótimo também (risos)
JE: Tá com medo? (risos)
VL: Olha lá, hein?
JE: Pode confiar, ué!
VL: Quero só ver no domingo (risos).