Cheguei ontem bem cedinho aos Estados Unidos, a tempo de ver pela janela do aeroporto de Newark o sol nascendo enorme no horizonte, quase tão grande quanto o Empire State Building, ao lado dele. Ainda no aeroporto, comprei a revista The Economist, que avisava na capa que a guerra contra as drogas chegou à América Central.
Hoje os minúsculos paÃses do istmo da América Central são o pedaço mais violento do mundo, se não contarmos os paÃses em guerra. Na realidade, tanto a Nicarágua quanto El Salvador são mais violentos hoje do que quando estavam em guerra civil. A revista estima que o combate ao crime custa à América Central, que já é pobre, 8% do seu PIB. É uma desgraça. Até a Costa Rica, antes “a SuÃça da América Centralâ€, está sofrendo.
A onda de violência começou depois que o México endureceu a repressão à s drogas vindas da América do Sul, especialmente cocaÃna. Agora, toda a cocaÃna que entra nos Estados Unidos precisa necessariamente passar pela América Central. Conversei ontem em Washington com Steven Dudley, diretor da InSight, uma organização que investiga crime na América Latina. “É fácil de entenderâ€, ele disse. “Quando entra na Guatemala, pelo sul, um quilo de cocaÃna custa 7 mil dólares. Quando sai de lá, pelo norte, custa 15 mil. O preço mais que dobra. É por esse dinheiro que as gangues estão brigando.â€
A Economist discute possÃveis soluções para a violência, mas conclui batendo mais uma vez numa velha tecla. “Essas ideias não vão resolver o problema fundamental: enquanto drogas que as pessoas querem consumir forem proibidas, e portanto fornecidas por criminosos, livrar uma área ensanguentada dos traficantes só vai servir para empurrá-los para outro lugar.â€
É um velho problema que nós aà na terrinha conhecemos bem: endurecer a repressão contra as drogas há décadas tem servido apenas para tornar o crime mais e mais violento – é um pouco como enxugar gelo, um esforço constante que não leva a lugar nenhum. O consumo não cai um milÃmetro e o número de pessoas sofrendo com overdoses, dependência e violência só aumenta.
Estou aqui para fazer uma pesquisa sobre esquemas alternativos de lidar com as drogas. A ideia é escrever um livro para ser lançado ainda este ano. Pretendo ir conhecer os estados americanos que estão bolando esquemas para fornecer maconha para uso médico e entender a quantas anda o movimento pela legalização – parece possÃvel que, pela primeira vez em décadas, pelo menos um estado americano legalize a maconha no ano que vem. Quero visitar a indústria da maconha legal nos EUA, que alguns especialistas dizem que já se tornou o maior produto agrÃcola do paÃs. Depois vou conhecer iniciativas de flexibilização na Europa. Este blog vai tratar muito deste tema nos próximos dois meses (mas não exclusivamente dele).
Legalizar as drogas não é a solução mágica para todos os problemas do mundo, claro. Na verdade, é a proibição que foi concebida como uma solução mágica que livraria o planeta do sofrimento causado por substâncias malignas. Com o tempo, o mundo foi percebendo que essa solução radical – a proibição – era enormemente ingênua. Ela não apenas não resolveu o problema que se propunha a atacar – o sofrimento na verdade aumentou –, como causou vários novos. A onda de violência na América Central é só o último de uma longa lista.
A proibição à s drogas foi como um elefante que deixamos entrar na sala. Tirar o elefante não vai acabar com o cheiro ruim de uma hora para outra. Mas pelo menos vamos conseguir começar a limpar a sujeira acumulada nesses anos todos de polÃtica equivocada.
Por Denis Russo Burgierman