A Corte Suprema colombiana acaba de reiterar sua posição contrária à criminalização da posse de droga para uso próprio (Processo n. 31.531, Caso AncÃzar Jaramillo Quintero). Antes, em 1994, isso já tinha ocorrido. Cuida-se de decisão que coincide com a recente Sentença (no mesmo sentido) da Corte Suprema argentina.
A legislação criminal colombiana adota o sistema da quantificação como determinante para se saber se se trata de usuário ou traficante. Até 5 gramas de maconha e um grama de cocaÃna, em princÃpio, se trata de usuário. O acusado portava 1.3 gramas de cocaÃna. Um pouco acima da presunção legal. A jurisprudência da Corte colombiana aceita um pequeno excesso em relação à dose pessoal. Direito penal não é matemática. Se não existem provas em sentido contrário, continua a presunção de posse de droga para uso pessoal.
O acusado foi condenado ao cumprimento de mais de cinco anos de prisão. Foi tido como traficante. A Corte Suprema colombiana cassou a decisão e o absolveu, invocando o princÃpio da ofensividade (que também é chamado de lesividade). Uma pessoa só pode ser condenada penalmente quando afeta bens jurÃdicos de terceiros (nisso reside o princÃpio da alteralidade). Quem ofende bens jurÃdicos próprios não pode ser condenado penalmente.
O diferente na legislação colombiana é que lá o princÃpio da ofensividade está expressamente previsto no Código Penal, da seguinte maneira: “Ley 599 de 2000.- art. 11.- Antijuridicidad.- Para que una conducta tÃpica sea punible se requiere que lesione o ponga efectivamente en peligro sin justa causa, el bien jurÃdicamente tutelado por la ley penalâ€.
Sem ofensa ao bem jurÃdico não existe antijuridicidade (material). Aqui no Brasil nós desenvolvemos esse mesmo princÃpio sob a perspectiva da tipicidade (material) (cf. nosso livro Teoria constitucionalista do delito, São Paulo: RT, no prelo).
A decisão da Corte colombiana coincide em praticamente tudo com a Sentença da Corte argentina. Esta, no entanto, foi mais categórica: somente a posse privada de droga para uso pessoal é que deve ser descriminalizada. Posse “privadaâ€. Isso não está muito claro na decisão colombiana. De qualquer modo, o fundamento comum a ambas as decisões reside no princÃpio da ofensividade (que diz: não existe crime sem lesão ou perigo concreto de lesão ao bem jurÃdico tutelado).
Com base nessas duas decisões assim como na doutrina que desenvolvemos sobre o princÃpio da ofensividade, torna-se possÃvel sustentar no Direito penal brasileiro a atipicidade material da posse privada de droga para uso pessoal. Dessa tarefa devem se encarregar os advogados e defensores públicos. Avante!