POR André Balocco
Rio - ‘Quem morre na guerra contra as drogas não é o usuário: é o policial e o traficante’. A frase, dita pelo ex-chefe do Estado-Maior da PM, coronel Jorge da Silva, resume bem a ideia de um movimento que vem ganhando corpo entre os profissionais responsáveis por aplicar a lei no Brasil: a guerra contra as drogas está perdida. Formada por policiais, delegados e magistrados, a Leap Brasil (Agentes da Lei contra a Proibição) acredita que somente a legalização do consumo e a regulação da produção serão capazes de conter a espiral de violência causada pela luta entre Estado e narcotráfico.
“Você já viu alguém tomando conta de uma vinÃcola com fuzis?â€, emenda a juÃza aposentada Maria Lúcia Karam, presidenta da organização. “Não viu, mas nos EUA, na época da proibição, era assim. A violência só acabou com a descriminalizaçãoâ€, conclui.
Criada em 2010, a Leap Brasil vai ampliar sua atuação em 2012. Ela é baseada na sua coirmã norte-americana — de onde vem o maior interesse pela continuidade da polÃtica, por conta do bilionário lucro do mercado das armas. “Foi uma polÃtica criada pelo Nixon (presidente nos anos 60/70) para combater o movimento dos direitos civis nos EUA, que questionava a Guerra do Vietnã. Como não podiam prender pelo ativismo, prendiam pelo uso de drogasâ€, acrescenta o coronel Jorge da Silva. “Fui criado no Morro do Adeus, no Alemão, e até os anos 70 as armas eram as pedras atiradas pela garotadaâ€.
O coronel acredita que o fim da guerra à s drogas levará as comunidades do Rio a uma nova onda de solidariedade. E de paz. “Já enterrei muitos policiais. Quem morre é o preto, o pobre e o favelado. Vi muito mais gente morrendo na guerra contra as drogas do que por usar drogasâ€, conclui. “Ser a favor da legalização não é ser a favor da glamourização da drogaâ€.
Procurada, a Secretaria de Segurança informou que não comentaria o assunto.
Delegado fala em ‘hipocrisia’
Delegado titular da 18ª DP, Orlando Zaccone tem pronto o discurso de defesa da Leap Brasil, organização da qual é o primeiro-secretário. “A diferença entre o traficante e o empresário é a legalizaçãoâ€, diz o policial. “Há hipocrisia neste tema. Enquanto o banco HSBC aparece no noticiário de economia pagando multa por lavagem de dinheiro do tráfico, só policiais e favelados morrem nesta guerraâ€, diz. “A guerra contra as drogas afeta a vida e a saúde de muito mais pessoas do que as próprias drogasâ€.
Pai, inspetor diz não temer ‘apologia’
Com 17 anos de polÃcia e membro-fundador da Leap Brasil, o inspetor Francisco Chao garante: não quer que sua filha, ainda criança, use drogas. “Mas se ela quiser, não vou conseguir impedir, mesmo sendo policial. Por isso, prefiro a droga legalizada, porque o Estado terá controleâ€, diz ele, que tem no currÃculo a prisão do traficante Elias Maluco, assassino do jornalista Tim Lopes, após intensa caçada no Alemão. “Na Europa, não se bebe na rua. Com as drogas legalizadas, devem fazer a mesma coisa â€.