BRASÃLIA – O projeto de lei que cria um cadastro de usuários de drogas no paÃs, prestes a ser votado pelo plenário da Câmara, prevê que as escolas fichem alunos usuários ou sob suspeita de uso de alguma substância ilÃcita. A polêmica proposta despertou reações contrárias do governo, manifestadas em duas notas técnicas do Ministério da Saúde e da Secretaria Geral da Presidência da República, obtidas pelo GLOBO.
Nos documentos, elaborados em outubro do ano passado, técnicos e diretores das duas pastas apontam a “criminalização†e a “marginalização†dos estudantes, caso o projeto se torne lei. O governo está preocupado com a grande possibilidade de aprovação da proposta em plenário, principalmente em razão da força da bancada religiosa na Câmara, interessada no fortalecimento das comunidades terapêuticas dirigidas por padres e pastores.
Conforme o artigo 16 do projeto de lei nº 7.663/2010, caberá a instituições de ensino preencher uma “ficha de notificação, suspeita ou confirmação de uso e dependência de drogasâ€. O objetivo desse fichamento, segundo o texto final do projeto que será levado a plenário, é o “registro, estudo de caso e adoção de medidas legaisâ€. A proposta prevê ainda que caberá aos professores identificar nos alunos sinais de uso de drogas ilÃcitas e de álcool, para um posterior encaminhamento à rede de saúde.
+ ESTÃ ACHANDO ABSURDO? PARTICIPE DO ATO CONTRA O PROJETO DE LEI; CLIQUE!
O relator do projeto de lei, deputado federal Givaldo Carimbão (PSB-AL), defende outro ponto considerado polêmico e reprovado nas notas técnicas do Ministério da Saúde e da Secretaria Geral da Presidência. A proposta é ampliar em 10% a quantidade de vagas em instituições federais de ensino, a serem destinadas a dependentes quÃmicos em tratamento médico e em abstinência. Se voltarem a usar drogas, esses pacientes perderiam a vaga conquistada nas instituições de ensino.
Carimbão tem como base eleitoral comunidades católicas em Alagoas. Ele é responsável por comunidades terapêuticas que cuidam de dependentes de drogas. O autor do projeto é o deputado Osmar Terra (PMDB-RS), médico e ex-secretário de Saúde no Rio Grande do Sul.
– Se de repente tem algum aluno, o professor tem de trabalhar para encaminhar o pessoal ao serviço de saúde. Na sala de aula pode ter alguma pessoa que está usando drogas. O professor é um orientador da famÃlia, que é chamada se tem alguma coisa estranha. A ideia é abrir espaço para que a famÃlia não seja a última a saber – defende Carimbão.
Osmar Terra, por sua vez, passou a afirmar que o projeto de sua autoria não prevê a criação de um cadastro de usuários de drogas. O texto do projeto é claro: em até 72 horas, todas as internações e altas hospitalares deverão ser registradas – em caráter sigiloso – no Sistema Nacional de Informações Sobre Drogas.
O projeto também prevê a internação compulsória de dependentes quÃmicos, a ser solicitada por familiar ou servidor público que tenha tido contato com o usuário de drogas. A proposta não deixa claro se uma internação involuntária poderá ser solicitada por um professor ou diretor de escola.
“A instituição escola, na previsão do projeto de lei, se fragiliza na medida em que se torna um ‘espaço inquisidor’, podendo inclusive adotar posições criminalizadorasâ€, diz a nota técnica do Departamento de Ações Programáticas Estratégicas (Dapes) do Ministério da Saúde. Posição semelhante foi adotada pelo Departamento de Assuntos Legislativos da Secretaria Geral da Presidência: “Ainda que se compreenda o ambiente escolar como o ‘locus’ privilegiado para polÃticas públicas voltadas à prevenção das drogas, é necessário termos cautela para não reproduzirmos estereótipos, fomentar a marginalização do jovem ou assumir responsabilidades que escapam à s competências da escola.â€
As notas criticam ainda a possibilidade de um financiamento paralelo de comunidades terapêuticas, de novas combinações de drogas (a partir da classificação das substâncias ilÃcitas) e de uma maior quantidade de internações compulsórias. O projeto aumenta a pena mÃnima para um traficante de drogas de cinco para oito anos de prisão.
No último dia 12, o plenário da Câmara aprovou regime de urgência para a votação do projeto. A análise pelos deputados está prevista para a sessão seguinte ao feriado da Semana Santa, em abril