A situação no conjunto de favelas da Maré, na zona norte do Rio, nesta terça-feira “é de estado de guerra”, diz Jailson de Souza e Silva, diretor do Observatório de Favelas, localizado na comunidade. Ele conversou com a Folha por telefone e relata que a “presença policial é intimidadora”.
Neste momento, a ONG está sem luz e telefone e cercada de policias. Mais cedo, foi jogada uma bomba de efeito moral em frente ao local, no momento em que fotógrafos do Observatório de Favelas saiam para cobrir o confronto. Eles desistiram. O Caveirão, veÃculo blindado do Bope (Batalhão de Operações Especiais), também está posicionado no complexo, assim como helicópteros e diversas viaturas da PolÃcia Militar.
Uma série de confrontos entre policiais militares e criminosos do conjunto de favelas da Maré deixou mortos e feridos. A confusão começou na noite de segunda-feira (24). De acordo com a polÃcia, assaltantes fizeram um arrastão na avenida Brasil, em Bonsucesso, zona norte, após o fim de um protesto, e de lá fugiram para a Maré. Policiais do Bope foram acionados. Houve perseguição e tiroteio.
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Folha – Como está a situação neste momento?
Silva – A favela está toda ocupada pela polÃcia, de forma bem violenta. Eles estão entrando nas casas, não há energia em alguns locais (o transformador foi atingido por uma bala). É uma ação sem nenhum sentido. Os mototáxis estão proibidos de rodar, estão parados.
A presença de policiais no local é grande?
A presença policial agora é muito intimidadora, é estado de guerra. Há helicópteros, policiais com fuzis, o Caveirão. Imagina uma comunidade com 140 mil pessoas ter que passar por isso.
Como você avalia o que ocorreu?
Mataram o policial, é lamentável. Mas agora vão morrer outras pessoas. Até quando vai ter esse tipo de ação? Não faz nenhum sentido.
Há previsão para saÃda dos policiais e normalização da situação?
Os policias só vão sair quando acharem quem matou. O problema é que toda a comunidade fica em suspenso por causa de uma ação desequilibrada do Estado. Jogaram bomba de efeito moral aqui no Observatório, por exemplo. Não dava para entrar ou sair. É um processo de intimidação, de muito medo. Pode ocorrer um tiroteio a qualquer momento.
Como foi a situação ontem?
O tiroteio foi terrÃvel a noite inteira, as pessoas ficaram ilhadas. Um menino, envolvido com o tráfico, foi morto dentro de casa. Já levaram o corpo. Agora centenas de pessoas estão sem luz porque não há como a Light (concessionária de energia) entrar aqui.
Alguém da ONG foi atingido?
Não, mas um rapaz de 35 anos, que é pintor e já trabalhou aqui, foi baleado. Tomou um tiro na barriga, perdeu o fÃgado e está internado. O risco aqui é a todo tempo. Ele estava na rua.
E qual a situação dentro da ONG?
Estamos fechados, mas não estamos proibidos de sair. Mal conseguimos trabalhar porque não tem energia e telefone. Estamos aqui porque tem muita gente querendo saber notÃcias. Queremos ver o que acontece e pressionar relatando nas redes sociais o que está acontecendo para que isso acabe. Mais cedo jogaram uma bomba de efeito moral na hora em que alguns fotógrafos iam sair com equipamento para cobrir a manifestação. Não tem como ter caÃdo aqui por acaso.Agora ninguém tem como sair com câmeras daqui. A coisa degringolou.
Como os moradores estão reagindo?
Tem muita gente nas ruas. Está começando um tumulto com um grande número de pessoas reclamando. Muita gente está começando a se mobilizar. É muito tenso porque a polÃcia, ao invés de tentar manter o equilÃbrio, é uma força de ocupação. É o exército inimigo e as pessoas ficam revoltadas.