Helena Harano, mãe do estudante Fábio Hideki Harano, preso após um ato anti-Copa em São Paulo no dia 23 de junho, disse o filho não é “black bloc” – tática que prega a destruição do patrimônio.
“Ele vai a manifestações de forma pacífica há anos, inclusive [pela liberação do uso] da maconha. Ele não é usuário, mas apoia a causa. Como mãe, eu estou me sentindo agredida vendo meu filho no presídio de Tremembé (interior de SP)”, afirmou.
A mãe de Harano diz que nunca impediu que o filho fosse a protestos. “Nunca interferimos, pois é um direito dele. Nenhuma mãe gostaria de ver seu filho preso injustamente. Ele não causa tumulto, é pacífico”, afirmou.
A polícia afirma que ele é adepto da tática “black bloc” e carregava um explosivo na mochila quando foi preso.
Harano é investigado por cometer cinco crimes, entre eles o de associação criminosa. Se ele for condenado, pode ficar preso por até 13 anos.
O advogado do Sintusp (Sindicato dos Trabalhadores da USP), Luiz Eduardo Greenhalgh, disse que Harano afirmou ter sido agredido por policiais após ser preso. “Ele [Harano] apanhou na delegacia. Ele diz ser capaz de reconhecer quem bateu nele e ele vai reconhecer”, disse.
A mãe de Harano mora em Vitória, no Espírito Santo, mas costuma visitar o filho no presídio. “Ele [Fábio] pede para que tenhamos paciência porque [a prisão dele] depende da Justiça”, disse.
De acordo com ela, Fábio é calmo e não tem histórico de violência. “Ele é muito alegre e gosta de crianças. Ele é muito querido, tanto no centro de saúde onde trabalha quanto na USP, onde estuda.”
A Secretaria da Segurança não apresentou o artefato que teria sido apreendido com o estudante, nem informou o motivo de ele ser considerado um “black bloc”.
Em nota, a pasta negou “ter havido prática de abusos e agressões na prisão. Os fatos estão sub judice e foram objeto de denúncia oferecida pelo Ministério Público”.
“Não vejo sentido em alguém ser preso simplesmente porque participou de manifestação. Espero que as pessoas que mantêm meu filho preso coloquem, em algum momento, a mão na consciência. Ele não é, nem nunca, foi black bloc.”
O desabafo é da dona de casa Helena Harano, 54 anos, mãe do estudante e funcionário da Universidade de São Paulo (USP) Fábio Hideki Harano, 27 anos, preso na manifestação contra a Copa ocorrida no último dia 23, na avenida Paulista.
Helena participou nesta terça-feira de um ato em desagravo do filho e de um segundo manifestante preso no mesmo dia, o administrador de empresas Rafael Lusvarghi, 29 anos. O encontro que reuniu funcionários da universidade, metroviários demitidos durante a greve do mês passado e integrantes do Movimento Passe Livre (MPL) foi promovido pelo Sindicato dos Trabalhadores da USP (Sintusp) — do qual Hideki é um dos diretores — na Faculdade de Direito do Largo São Francisco, na região central de São Paulo.
Natural de Vitória, onde vive com o marido, Helena visitou o filho na Penitenciária de Tremembé, no Vale do Paraíba, nos dois últimos sábados. Vegetariano e de cabelos compridos, o jovem teve a cabeça raspada quando chegou à unidade prisional e precisou abandonar a restrição alimentar que seguia há cinco anos, segundo a mãe, devido à comida servida aos presos. A Defensoria Pública do Estado chegou a pedir à Justiça a liberdade dos dois manifestantes, mas não foi atendida.
“Meu filho tem todo o direito de se manifestar, como qualquer cidadão, pelos ideais em que acredita. Mas é um sujeito calmo, alegre, as pessoas gostam dele – eu mesma não imaginava que gostassem tanto”, afirmou, entre um abraço e outro de funcionários, professores e alunos da USP que a abordaram durante a entrevista, e depois. “Ele está na ‘ala dos midiáticos’ na penitenciária, com outros dois presos (na cela) que não sei quem são, pois meu foco era apenas meu filho. Só quero que o libertem o mais rápido que for possível – isso perturba o equilíbrio da gente, né?”
A mãe contou que o filho passou o aniversário de 27 anos, no último dia 30, na prisão. “Estou muito triste, mas principalmente muito indignada com isso”, definiu.
Defesa aguarda julgamento de recurso terça-feira
O advogado do estudante, Luiz Eduardo Greenhalgh, afirmou que aguarda para a próxima terça-feira o julgamento do pedido de habeas corpus que, liminarmente, já foi negado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo. Se for negado mais uma vez, disse, ele ingressará um agravo regimental.
“O Fábio é uma espécie de bode expiatório, foi preso como resposta da polícia às manifestações do ano passado. É uma prisão política, porque, diferentemente do que afirma a Secretaria de Segurança Pública do Estado, não é, nem nunca foi black bloc – foi preso fora do ato”, declarou o advogado, para quem o viés político se deve também pelo fato de Hideki ter ligação com o Sintusp, entidade que lidera a greve de funcionários na USP desde 27 de maio passado.
Ainda conforme o advogado, o jovem afirma ter sido agredido por policiais logo após ser preso. “Ele é capaz de descrever as pessoas que o agrediram e fará isso”, declarou.
Na mesma manifestação em que os dois rapazes foram presos, um policial civil atirou para o alto com uma arma de fogo próximo de um grupo de manifestantes. Segundo o secretário de Segurança Pública, Fernando Grella, a ação do policial foi de “advertência, em uma ação legítima, como é a legítima defesa”.
“Foi uma covardia”, diz padre Júlio Lancelotti
Presente na estação de metrô Consolação, onde Hideki foi preso por policiais infiltrados no processo, o padre e ativista de direitos humanos Júlio Lancelotti foi ao ato de hoje na Faculdade de Direito e também criticou a prisão dos jovens.
“Foi uma covardia o que fizeram. Não querem e não são capazes de ouvir o clamor público. E como querem enquadrar esses jovens como black blocs –nesse que é um tipo de estratégia que sequer admite liderança?”, indagou.
Segundo a SSP, os dois rapazes presos responderão por associação para o crime porque teriam portado material explosivo. Entidades ligadas à defesa dos direitos humanos cobraram que as prisões sejam investigadas.
Em nota, a Polícia Civil nega que tenha havido prática de abusos e agressões na prisão. “Os fatos estão sub judice e foram objeto de denúncia oferecida pelo Ministério Público ao Poder Judiciário, que manteve a prisão preventiva de Fábio Hideki Harano”, diz a corporação.