A Guarda Civil Metropolitana (GCM), subordinada à Prefeitura de São Paulo, vai abrir uma unidade nacracolândia até o final de maio. Será a primeira na região da Luz, no centro, e terá 300 homens e mulheres com treinamento na abordagem de usuários de drogas. Eles se distinguirão do resto da corporação pela farda, com braçadeira e quepe azul-claros.
Batizada de Inspetoria de Redução de Danos, a medida se insere na lógica do programa que a prefeitura mantém no local: o De Braços Abertos, em que o dependente é incentivado a diminuir gradativamente o consumo de drogas, sem internação e com oferta de emprego e renda.
Como a Folha mostrou na sexta (18), após dois anos de programa, aprefeitura tenta afastar os participantes da região da cracolândia. O objetivo da administração municipal é manter mais GCMs 24 horas por dia no local –atualmente são 250 durante o dia–, permitir que a abordagem siga a redução de danos e melhorar o policiamento de uma das regiões mais degradadas da cidade.
Durante a noite, o efetivo deve passar dos atuais 50 para 100 guardas municipais. Entre as funções da guarda no local estão ajudar a PolÃcia Militar no combate ao tráfico, impedir que os usuários montem barracos e oferecer segurança aos agentes de saúde e funcionários que fazem as três limpezas diárias nas ruas da cracolândia. Durante essas ocasiões não é raro estourarem confrontos entre usuários e esses guardas.
BASE FIXA
Os 250 guarda-civis que trabalham na área se revezam no local vindos de todas as 40 unidades da cidade, o que causa reclamações e desgaste, diz o presidente do sindicato, Clóvis Roberto Pereira.
A nova inspetoria terá base fixa na alameda Dino Bueno, a quatro quarteirões do fluxo de viciados. Um prédio de cerca de 1.000 m², alugado por R$ 25 mil, está em reforma.
A abertura dessa unidade faz parte do processo de reestruturação da guarda, com a a contratação de 500 novos GCMs e a criação de outras inspetorias –uma delas deve ser a de Trânsito, diz o secretário da Segurança Urbana, Benedito Domingos Mariano.
Segundo ele, os guardas serão autorizados a fazer “bico oficial” aumentando os dias trabalhados e a remuneração. Um GCM em inÃcio de carreira recebe hoje, em média, R$ 2.200 por mês para jornadas de 12 horas de trabalho por 36 horas de descanso. Com o bico oficial, podem fazer mais dez jornadas de oito horas mensalmente, o que rende R$ 1.600 a mais.
A base na cracolândia será considerada área estratégica, como outras localizadas no centro, e por isso os GCMs devem também ter um acréscimo de R$ 140 no salário.
‘ENXUGAR GELO’
Para muitos dos guarda-civis que atuam na cracolândia, as jornadas por ali parecem não surtir efeito. “Você fica sob sol e chuva e enxugando gelo, fazendo um trabalho que não vai necessariamente ver o resultado”, diz Valéria Athayde, 39, GCM e diretora do sindicato da categoria.
Outro problema é a falta de estrutura. Hoje, os guardas contam com uma base móvel montada em terreno próximo ao fluxo –quarteirão da alameda Dino Bueno que reúne diariamente cerca de 350 usuários e onde o consumo de crack é mais intenso.
“Não temos estrutura adequada alguma. Se quiser ir ao banheiro tenho que me socorrer na Sala São Paulo, estação Júlio Prestes ou no comércio local”, reclama Valéria, que todas as semanas trabalha nessa região do centro.
Ela também reclama da falta de apoio da PolÃcia Militar e do “desvio de função”. “Entendemos que nossa função é ajudar a reprimir o tráfico e dar apoio aos agentes de saúde. Não é correto que a gente tenha que abordar usuário que está dormindo na calçada para poder limpar a rua.”
De acordo com o presidente do sindicato, Clóvis Roberto Pereira, há ainda outras fragilidades. Ele afirma que os guardas reclamam da falta de equipamentos como escudos, para situações de conflito, e luvas para o contato com os usuários de droga.
Para o secretário da Segurança Urbana da gestão Haddad (PT), Benedito Domingos Mariano, “as demandas são pertinentes” e devem ser sanadas com a nova Inspetoria de Redução de Danos, na al. Dino Bueno. “Essas foram algumas das razões que nos levaram a criar essa unidade.”
Até junho, 500 novos GCMs devem ir para as ruas. Eles estão em treinamento que deve abranger as medidas de redução de danos. Segundo Mariano, isso deve diminuir a possÃvel falta de compreensão sobre o trabalho no local.
“Se você perguntar hoje, mais de 70% dos GCMs vão dizer que preferiam não estar lá [na cracolândia]”, diz. “Mas, paradoxalmente, já temos 300 inscritos para atuar nessa nova inspetoria.”
A Secretaria de Estado da Segurança Pública afirmou, por meio de uma nota, que “só nos dois primeiros meses deste ano, 18.013 pessoas foram abordadas pela PolÃcia Militar na região”. Dessas, 109 foram encaminhadas a delegacias para averiguação, 9 foram presas em flagrante, 6 menores foram apreendidos, 21 fugitivos recapturados e 26 ocorrências de tráfico e porte foram registradas.
Editoria de Arte/Folhapress | ||
GCM na cracolândia |
PROGRAMAS SOCIAIS NA REGIÃO
De Braços Abertos
Implantado pela prefeitura em jan.2014, atendeu até agora 928 pessoas; 46% não estão mais no projeto
O que oferece
Moradia em hotéis
3 refeições por dia
Apoio no tratamento contra dependência
Capacitação profissional
Oportunidade de emprego
Recomeço Desde jan.2013, quando o governo do Estado introduziu o programa, atendeu 31.966 dependentes
O que oferece
Acesso a tratamento
Internação, se preciso
Encaminhamento a capacitação e recolocação profissional
300 será o efetivo da GCM na cracolândia, durante 24h por dia
550 é a quanto pode chegar o número de usuários de droga durante a noite na região
R$ 2.180¹ é o salário base de um GCM em inÃcio de carreira
R$ 140 será o aumento para quem trabalhar no local, por ser uma área estratégica
R$ 1.600 é o quanto os guardas poderão ganhar a mais caso façam até 10 plantões por mês, no chamado “bico oficial”
¹Inclui benefÃcios
Fonte: Secretaria Municipal de Segurança Urbana